Capítulo 14 - Uma semana na serra

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Durante aquela semana nossos problemas ficaram esquecidos na última gaveta do armário dos fundos de nossos pensamentos. Ocupamos nosso tempo em observar a natureza, provar as delícias da cozinha local, fazer atividades ao ar livre e curtir as opções oferecidas pelo spa da pousada. Mas, acima de tudo fizemos muito sexo, em todas as acomodações do chalé, em todas as posições e intensidades.

Quando se fala em turismo no meio da serra muita gente deve imaginar um ambiente selvagem, desprovido de conforto, um verdadeiro "programa de índio", como se diz por aí. Nada mais distante do que se é possível encontrar na Serra do Cipó. O chalé que nos serviu de habitação naquela semana nos contemplou com verdadeiros luxos: ar condicionado, varanda privativa, toalhas e roupões de algodão egípcio puro, banheira de hidromassagem, bastante usada por nós, obviamente. Já o wi-fi e a Smart TV, com TV a cabo, inclusive com canais internacionais foram os itens dos quais quase não tomamos conhecimento.

Mas, o grande atributo estava além das janelas: a vista maravilhosa para o infinito, para a grandeza da criação divina. Porque o ser humano pode criar suas maravilhas artísticas e tecnológicas, mas, nenhuma chega aos pés da perfeição da natureza. O relevo acidentado faz com que as janelas amplas do banheiro estejam à altura da copas das árvores. Da banheira é possível ver macaquinhos pulando de galho em galho ao longo de seu trajeto em busca de comida e diversão. Mas, se você estender seus olhos para a outra janela, o que se apresenta diante de si é a parede de pedras da serra, ao longe, mas, não tão longe assim. E, logo acima a imensidão azul do céu.

Ficávamos horas nesta contemplação, mergulhados na banheira, sob o aroma e o efeito dos sais. Ao lado, o vinho e os queijos. No entanto, quando o corpo pedia outros mimos, nos deslocávamos do chalé para o spa, onde recebíamos massagens relaxantes - como se fosse possível relaxar ainda mais, depois da hidro no cenário perfeito -, banhos de ofurô, aromaterapia e até acupuntura.

Nossas refeições eram outros momentos sublimes. Algumas vezes pedíamos pelo serviço de quarto, mas, bom mesmo era explorar os restaurantes da região. Existe uma variedade muito grande de opções, capazes de atender até ao mais exigente paladar. Visitamos bistrôs e cozinhas internacionais, mas, o que mais nos chamou a atenção foram os restaurantes de comida típica mineira, feita no fogão à lenha: Frango ao molho pardo, canjiquinha, frango com quiabo e angu, polenta, tutu de feijão, feijão tropeiro, feijoada... Uma explosão de sabor e aroma.

Visitamos as principais cachoeiras: Serra Morena, da Farofa e a mais conhecida, a Véu da Noiva. Pegamos o carro e seguimos até as cidades vizinhas: Santana do Riacho e Conceição do Mato Dentro, onde subimos a escadaria que dá acesso ao Santuário do Bom Jesus do Mato Dentro.

Fizemos trilhas, conversamos com os nativos, apreciamos o canto dos pássaros. Na imensidão da serra desabitada, acomodada no topo do mundo, fiz uma viagem interior, em busca da minha essência, na tentativa de descobrir onde foi que me perdi, mais uma vez. Porque, ao constituir uma família com o Sr.B., meu amor da adolescência, eu me reencontrara. Tornei-me de novo aquela mulher sonhadora e íntegra que eu fora na minha juventude. Já não tinha tudo o que queria? Então, por que me envolver numa aventura extra-conjugal?

Tratei logo de afastar esses pensamentos. Queria aproveitar cada momento na serra como se fosse o último de minha vida. E aquelas paisagens estavam longe de serem um estímulo para se pensar em problemas. Também o meu marido não demonstrou nem por um momento estar aflito por o que quer que fosse. Ali naquele paraíso, envelopes anônimos recheados de fotografias comprometedoras não tinham como chegar. Ou tinham?

Não, eu não ia me deixar dominar pelas minha neuras. O Sr.B. tinha proposto aquela nova lua de mel para que eu pudesse relaxar e era isso que eu iria continuar fazendo. Aquele era o sexto dia de nossa viagem e no dia seguinte voaríamos de volta para nossa terra e nossos problemas. Então, iria aproveitar até o último instante.

Quando voltávamos de Conceição de Mato Dentro, cidadezinha que achei adorável e a qual fizemos o propósito de visitar novamente por ocasião do Jubileu, festa religiosa tradicionalíssima que acontece por lá anualmente, no mês de junho, decidimos esticar até a Cachoeira do Tabuleiro. Essa cachoeira já foi considerada pelo Guia Quatro Rodas como a mais bonita do Brasil, é a mais alta de Minas Gerais e a terceira mais alta do país. Bela e majestosa, com o peculiar formato de seu paredão, em forma de coração, foi o cenário de muitos beijos naquela tarde. Definitivamente, não havia espaço para preocupações.

Meu amor foi especialmente carinhoso naquele dia. Durante o percurso de volta ao hotel, ele, por diversas vezes, retirou a mão do volante para pousá-la sobre a minha perna. Às vezes, a mão se estendia pelo meu pescoço, minha orelha, meu rosto. Fiquei encabulada com aquela carícia. Ele me tocava e me olhava, daquele jeito que conheço tão bem e que amo. Aí, teve uma hora em que ele parou o carro no acostamento e me beijou na boca, a mão na minha nuca. Arrepiei toda.

Tínhamos que seguir viagem. A noite se aproximava e estávamos numa região desabitada, a qual não conhecíamos. Então, voltamos para a estrada e seguimos em silêncio, encabulados como dois adolescentes. No entanto, não deu para esperar mais e o Sr.B. parou o carro de novo. Subimos os vidros e nos atracamos. Dessa vez não houve ternura, houve amor selvagem à beira da estrada. Foi rápido, mas, foi intenso. E sem dizer uma palavra, viajamos de novo. E só paramos novamente quando estávamos na garagem da pousada.

Continuamos sem necessidade de dizer nada. Nossos corpos já haviam dito tudo ainda há pouco. No entanto, o silêncio foi quebrado de modo violento pelo toque do celular. Não era uma chamada, era apenas o alerta de mensagem do WhatsApp e nem era tão alto assim. Mas, mergulhados que estávamos naquele nosso universo, do qual o celular praticamente não fizera parte naqueles últimos dias, aquele som representou uma ruptura. Levantamos os dois para conferir e, juntos tomamos conhecimento daquela imagem no celular do meu marido.

O remetente era desconhecido, a imagem de perfil, um avatar. A fotografia não era recente, mas, o seu conteúdo, uma bomba: um quarto de hotel e dois corpos nus, o meu e o daquele estudante de agronomia do qual nem me lembrava mais. A magia estava quebrada. Dessa vez, pra valer. Dessa vez, para sempre.

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