Capítulo 13

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Havia anoitecido quando Lyra, Vivian e Elder Phranor chegaram à Myran, e mesmo em meio a densa cerração, conseguia ver a forma do mosteiro cravado nas rochas onde o Azure brandia em fúria. Encolhia-se dentro da capa mais grossa, parecendo frio demais mesmo para Myran. Seguiram o caminho guiadas pelo Elder, passando por uma ruazinha estreita e mal iluminada à esquerda, antes da vila portuária. Quase não havia moradores por ali, mas Lyra estava tranquila, não havia risco, pois estavam em território encantado. Haviam relatos sobre saqueadores que haviam desaparecido naquela região, histórias um tanto assustadoras, que mantinham a bandidagem longe dali.

Haviam histórias sobre Leões Reis gigantescos que teriam devorado a tripulação de um navio pirata. De mulheres graimes belíssimas que sugavam suas almas para se manter jovens, magos sanguinários oferecendo os corpos dos visitantes indesejados em sacrifício à divindades poderosas jamais vistas. Mas tudo não passava de encantamentos simples, até, mas que causavam verdadeiro pavor nos supersticiosos piratas. Pararam em frente ao portão de ferro, sabendo onde estava, apesar de nunca ter passado daqueles portões. Era a casa de Elder Hainor. Lyra tocou o portão com o cajado, que abriu imediatamente. Logo que se aproximavam da porta, um homem ainda jovem veio recebê-los, dizendo que cuidaria dos cavalos e que o Elder os receberia. Hainor estava servindo taças de vinho quando entraram numa sala confortável, aquecida com uma lareira. Ele os cumprimentou com entusiasmo, dizendo que finalmente poderia conhecer a Arquimaga da qual todos estavam falando em Ihgraime.

Sentaram-se próximo à lareira e logo estavam aquecidos. Lyra observava os dois Elders comentando sobre o tempo e que durante o festival deveria haver uma trégua nas chuvas de Myran. Depois o mago voltou-se para Lyra, como que analisando o quão poderosa ela realmente seria. E deu uma boa olhada em Vivian também, que fazia o mesmo gesto com as contas da pulseira que estava usando desde que havia se sentado. Ela conversava com a Arquimaga e talvez nem percebesse que o estivesse fazendo, talvez devesse descobrir que habilidade ela estava escondendo.

Lyra escutava a conversa entre os dos velhos amigos sobre a possibilidade do cetro de Arnon estar no mosteiro, e eles concordavam que a chance era pequena. Ela mesma não acreditava que ela e todos os magos que já haviam passado por lá não tivessem percebido um grande poder armazenado num único objeto, mas era seu dever investigar. Não achava que voltaria ao mosteiro tão cedo. Na verdade, até sentia falta de olhar o mar de lá de cima, o som do vai e vem das ondas do Azure a acompanhando durante grande parte da sua vida e trazendo boas lembranças de lá. Àquela altura estava praticamente vazio, pois os aprendizes haviam sido dispensados para o festival. Durante o jantar, a conversa girou em torno dos heróis e sobre a vida de Kael. Lyra nunca havia se aprofundado no assunto, talvez porque as histórias de Arnon lhe parecessem muito mais interessante. Os Elders contaram que Kael era filho de um herac com uma graime. Ele teve um irmão, que nasceu graime, e sempre o invejou por isso. Kael não compreendia como ele pôde ser tão amaldiçoado em não possuir nenhum poder mágico enquanto o irmão desde cedo brincava com esferas elementais. O tempo passou e cada um dos irmãos cresceu seguindo seu caminho. Kael tornou-se um dos guerreiros mais fortes e habilidosos do seu tempo, enquanto seu irmão refugiou-se em Myran para ensinar no mosteiro. Kael se apaixonou por uma linda graime que vivia em Maherac, e foi correspondido, mas com o passar do tempo foi se tornando mais ambicioso, poderoso e cruel. O amor de sua esposa e todas as conquistas que um guerreiro como ele poderia ter, já não eram suficientes. Ele queria muito mais. A magia dos graimes, o exército holt, e tornar-se o primeiro Rei de Ambarys. Mesmo o nascimento do seu filho não foi capaz de acalmar seu coração. Ele foi o primeiro herói a ser corrompido.

As duas jovens graimes ficaram observando a chuva da janela do quarto onde haviam se instalado. Ambas gostavam do barulhinho da chuva caindo na vidraça, nas folhas das árvores e no telhado. Conversaram um pouco ainda antes de dormir, mas os cobertores pesados e o barulho da chuva logo fizeram efeito de uma poção do sono, que chegou levando-as para onde os sonhos são bem reais. Vivian abriu os olhos e respirou fundo. Estava acontecendo novamente, mas não entendia o porquê. Estava numa vila muito iluminada, mas havia algo errado ali. O chão estava úmido, e havia muita névoa. Via poucas pessoas entrando em suas casas, e em algum lugar adiante erguiam-se torres negras como se estivessem vigiando todos os seus passos. Seguiu por ruelas, algumas escuras, outras mais iluminadas, até conseguir ver o castelo escuro e sombrio que agora estava a poucos metros de distância. Lyra caminhava para dentro do castelo, mas ela não ouvia, era como se estivesse em uma espécie de transe, seguindo atrás de uma figura vestida de negro. Vivian sentia que não podia fazer nada naquele momento, caso contrário a veriam. Eram muitos, flutuando pelo castelo. Passou, esgueirando-se rapidamente pelos corredores, e cruzou alguns salões. Havia perdido Lyra de vista, tinha que encontrá-la e descobrir aonde estavam. Uma porta gigantesca abriu-se diante dela e ela viu um homem, belíssimo de olhos cor de esmeralda que lhe estendeu a mão.

Loyalty - Reclamada Pela Realeza - Duologia AmbarysOnde histórias criam vida. Descubra agora