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— Você não pode estar falando sério — ele fala um pouco mais alto do que deveria

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— Você não pode estar falando sério — ele fala um pouco mais alto do que deveria.

Em seguida, percebe o que fez, olha para a porta assustado e sussurra com um olhar suplicante.

— Estou fazendo o possível para salvar sua vida, Dassa. Você pode ter tudo aquilo que sonhou. Não é suficiente?

— Você mesmo disse que faria diferente, se pudesse. Agora só precisa ter a coragem para fazer isso!

— Não. Você não entende. Essa é uma nação livre. Eu não faria, mas as pessoas precisam ter o direito de escolher.

— Escolher? Raah, escuta o que você está dizendo. Estamos falando de uma vida.

— E o que você sugere, Hadassa, hein? Se proibirmos, as pessoas vão fazer isso de qualquer forma. Não é melhor no Centro Hospitalar, onde nós sabemos que é um ambiente controlado e seguro, com um procedimento indolor e rápido para todas as partes?

Não consigo acreditar no que estou ouvindo.

— Para quem o ambiente é seguro, Raah? Para os assassinos?

— Assassinos? — Raah se desvencilha do meu toque e dá alguns passos para trás, com uma expressão de nojo. — Com quem você andou falando? — questiona, a chama de traição novamente brilhando em seus olhos.

— Não precisei falar com ninguém. Essa é minha forma de pensar. É a forma de pensar de qualquer pessoa em sã consciência!

Mal termino de pronunciar essas palavras, Doutora Aleksa Salz irrompe na sala, acompanhada de dois outros homens vestidos de azul.

Infelizmente, um deles está algemado. E cheira a fertilizante.

— Ao que parece a nossa querida viciada veio com uma ideologia política radical para Tibbutz — a mãe de Raah pronuncia com um sorriso estampado no rosto. Mas, como é de se esperar, seus olhos não acompanham o sorriso.

— Eu não tenho nada a ver com ele — protesto veementemente. — Fui eu quem o trancou na sala!

Raah nunca me pareceu tão desolado, decepcionado, infeliz como parece agora. Todos me encaram em silêncio e eu me sinto novamente sem voz, como se nada do que eu falasse fosse importar. Sinto que o veredicto já foi tomado. E quanto mais eu tentar protestar, menos acreditarão em mim.

— Vocês, radicais... — A mesma expressão de nojo que Raah tinha a pouco tempo no rosto se repete no de sua mãe. — Sempre poluindo a humanidade. Não há nada mais difícil de combater do que a ignorância.

— É mesmo? E o que vocês vão fazer agora? Me cancelar? — Pulo diretamente para a questão que me interessa mais do que os discursos inflamados desse hospício.

Ou será que a louca sou eu? Porque todos parecem absolutamente sãos. Pessoas respeitáveis e admiradas. Como eu posso ter me metido nessa conspiração?

— Não seja ridícula, nós não cancelamos pessoas — Dra. Salz revira os olhos e suspira.

Não, definitivamente não sou eu a louca.

— Oi? E a Tink é o que? Que eu saiba ela é uma pessoa como qualquer um aqui.

A mulher solta uma baforada incrédula.

— Aí você está usando palavras carregadas para manipular a discussão. Esse é o tipo de discurso intolerante que não toleramos em Tibbutz.

— Espera. O quê?

— Chamar uma criança de pessoa é tentar distorcer a realidade um pouco, não acha? — Um canto de seu lábio se ergue, como se o mero conceito fosse absurdo e risível. — Afinal, elas são tão pequenas e sequer estão totalmente desenvolvidas.

— Pelo amor do Destino, vocês não estão definindo o direito de viver a partir do nível de desenvolvimento, estão? — Sempre entendi que não adianta argumentar quando a opinião de alguém é tão intensa que se torna quase um dogma. Mas, o que posso fazer além de tentar? — Se esse sequer fosse um argumento válido, está claro que um dia uma criança vai se desenvolver e se tornar uma adulta. Ela tem pleno potencial para isso.

— Além de tudo... — Ela prossegue, falando ainda mais alto, ignorando meus argumentos. — Uma criança é totalmente dependente de cuidados, consumindo toda a energia e tempo de outros. Mais poderíamos comparar a um parasita do que a um ser humano.

— Um parasita? — Estou absolutamente atônita. Quando acho que nada mais nessa cultura é capaz de me chocar, eles lançam algo novo. — Você realmente acha que Tink é um parasita?

Ela me encara por um longo tempo e, por um instante, temo de que vá me esbofetear. Mas para a minha surpresa, lágrimas começam repentinamente a rolar pelo rosto da mulher. Raah a envolve em seus braços, deixando que se aninhe em seus ombros e soluce. O rapaz tem um olhar perdido no rosto, incerto, infinitamente infeliz.

Após um tempo, o homem que está segurando Sander solta um pigarro e fala:

— Devemos levá-los agora?

A médica ergue o rosto vermelho e coberto de lágrimas. Fungando de leve, assente com o rosto.

— Você não imagina a coragem e a força que uma pessoa precisa ter para tomar a decisão que tomei. Só quem passa por isso, sabe. — Ela retoma a palavra, olhando diretamente para mim e apontando um indicador acusatório. Seus olhos úmidos agora estão cheios de ira. — É muito fácil para você vir de fora e trazer seu discurso moralista e distante, sem sentir na pele o que é cuidar de um inválido, sem nunca ter sequer contribuído com a sociedade, feito o bem para alguém. Você não passou pelo que passei. Aliás, você é uma das principais beneficiárias do sistema e isso faz de você uma hipócrita. A nossa sociedade jamais seria capaz de sustentar imigrantes se gastasse recursos desnecessários nesse tipo de coisa.

Abro a boca para contra-argumentar, mas... o que posso dizer? Realmente, não contribui com a sociedade ainda. E, sim, estou vivendo a partir da caridade de outros. Isso faz, de alguma forma, matar alguém correto?

Mesmo que eu quisesse prolongar a discussão, o homem de azul agarra meu braço e me puxa, juntamente com Sander, para fora da sala.

Antes de partirmos, ouço uma última frase da doutora:

— Se vocês são tão contra cancelamentos, existe uma solução fácil. Quando tiverem uma criança, não façam um!

E a porta se fecha.

Nota da Noemi:Interrompendo meu aniversário de 8 anos de casada só pra postar capítulo novo 😘 Esse é o poder de encorajamento dos votinhos e comentários

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Nota da Noemi:
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