— Parabéns, você fez um excelente trabalho lá dentro — Sander sussurra para mim, assim que somos empurrados para o interior de um cubículo estreito de vidro e o homem tranca a porta.
O espaço só é largo o suficiente para comportar a nós dois, de pé, muito próximos um ao outro, então automaticamente dou as minhas costas para ele, presumindo que vá fazer o mesmo. Ledo engano. Esqueço que estou lidando com um Kravz, os mestres dos sem-noção. Em vez disso, ele permanece voltado para mim, com os ombros curvados, de forma a se aproximar da minha altura, invadindo o meu espaço, o rosto próximo ao meu pescoço.
Afunilo os olhos com o "elogio". Posso apenas presumir que esteja sendo irônico, embora nem seu olhar nem seu tom de voz indiquem isso.
— E eu ainda estou aqui esperando por seus argumentos brilhantes — retruco.
Ele ri sem humor.
— Argumentos? Lógica não funciona com esse povo.
— Esse povo? Você quer dizer, com o seu povo?
O rapaz dobra o pescoço, deixando despencar o rosto para um lado, enquanto parece refletir sobre algo.
— Não. Nem todos pensam assim. Só todos têm medo de falar o que pensam. Então, nós temos que nos fazer ouvidos. Custe o que custar.
— Quebrar a perna de crianças. Manipular pessoas. Traí-las — replico, imediatamente, sentindo-me nauseada. — Custe o que custar mesmo. Não há limites para sua determinação.
— Nem para a sua. — Sua voz ressoando bem próxima ao meu ouvido contém um sorriso. — Beijar com tanta paixão aquele seu treinador foi um pouco além do que achei que você seria capaz, mas, ei, cada um com seus métodos.
Volto meu rosto abruptamente, absolutamente estarrecida. Esse rosto mesquinho e sarcástico me provoca instintos violentos. Mas não quero dar a ele esse gostinho.
— Por que ainda me surpreende que você estava me espionando? — Reviro os olhos.
— Aliás, esqueci de dizer que você pode me manipular daquele jeito quando quiser — sussurra no meu ouvido e desliza um dedo indicador sobre meu pescoço até a região da clavícula, lentamente.
Ou ao menos de forma mais lenta do que o cotovelo que imediatamente ergo e projeto com força para trás, bem no meio da fuça nojenta do rapaz. Enquanto sua cabeça ainda está curvada num ângulo esquisito pelo golpe que dei, espalmo seu peito e aperto-o contra o vidro o mais longe de mim possível.
O que são apenas alguns centímetros.
Ele geme, elevando uma mão ao nariz para estancar o sangramento.
— Acho que quebrou — murmura.
— Nunca... mais... toque... em... mim — sibilo.
Seu queixo se enrijece e suas bochechas se colorem em tons rúbeos.
— Ei, docinho, nós vamos conviver um bom tempo juntos, é bom se acostumar — ele murmura com um beiço exagerado, os olhos estreitos, as sobrancelhas contraídas.
É só aí que percebo.
Que, neste instante, o que Sander definitivamente não quer é a mim. Não dessa forma. E que, por qualquer motivo, está fazendo todo o possível para me irritar.
— Isto é, se não decidirem expulsá-la de uma vez daqui. Deveriam.
Não... quero... dar... a... ele... esse... gostinho.
— Qual é o seu problema? — resmungo, afunilando os olhos.
— Meu problema é que você está tão ocupada tentando falar que não é capaz de ouvir ninguém! — Sander grita, repentinamente, com olhos arregalados, gotículas de saliva espirrando por todo lado. — Tudo estaria bem se você simplesmente nos ouvisse!
Nunca o ouvi gritar antes ou reagir com tanta agressividade, e confesso que isso me abala um pouco. A intensidade. O desespero. A aflição em seus olhos.
O que diabos irão fazer com a gente?
— Por que estamos aqui? O que vai acontecer?
Sander não responde, apenas me encara, com as costas de uma mão pressionada contra suas narinas. Neste exato momento, o homem retorna com duas seringas na mão. E Sander não desvia o olhar, como se dissesse "isso é o que vai acontecer".
Ainda ouço-o murmurar mais uma vez antes de tudo apagar:
— Boa viagem.
Nota da Noemi:AHhhh, o que será que vai acontecer???
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HUMANO [COMPLETO]
Science Fiction#4 em ficção-científica em 25/04/2018 Que preço você está disposto a pagar para ser aceito? ESCRITO EM PARCERIA COM Camila-Antunes Imagine uma sociedade perfeita. Não há desigualdade, fome ou violência. Um lugar onde rege paz, harmonia e respeito. ...