Capítulo 20: Declarações silenciosas

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Tudo parecia parar naquele momento.
Eu me perdia na imensidão de seus olhos,
e sabia que ela se entregaria em igual intensidade.


O sol já se punha, lançando seus raios através da janela sobre minha cama e iluminando o rosto preocupado de Thamy, que estava sentada a minha frente.

— Devdas me disse que foi quebrado uma espécie de feitiço que ocultava essas lembranças de você. — Thamy começou a falar como se lesse em meu rosto, o grande ponto de interrogação que atormentava minha mente. — Mas é necessário que o desfaça por inteiro, pois só quem o colocou aí é capaz de tirar. — Continuei em silêncio e ela retornou a falar. — Mōkṣa me contou o que você sonhou. — Passou a mãos sobre os cabelos e desviou os olhos dos meus. — Na verdade ele me mostrou.

— Mōkṣa? — Repeti, adorando o som que ele fazia.

— Significa "salvação" em Híndi, Devdas tem muita criatividade para nomes. — Brincou ela, sorrindo de canto, timidamente.

Levantei-me e fui até ela, me prostrei de joelhos aos seu pés, acariciei sua barriga.

— Mas não teria nome melhor para nosso bebê, porque ele me salvou e trouxe você de volta para mim.

Ela sorriu alegremente, abraçou meus ombros e chorou baixinho.

— Por que alguém faria isso com você? Todas as pessoas tem o direito de saber de seu passado, de sua história. — Ela levou as mãos aos olhos e limpou as lágrimas.

— Isso terei que descobrir, meu amor. — Tomei suas mãos nas minhas, olhei fixamente em seus olhos. — Não se preocupe com isso agora. — Sorri para ela e a beijei.

— Eu sei, meu amor, mas isso está me tirando o sono. — Ela desviou os olhos dos meus e fitou além de mim. — Não sei o que faria no seu lugar, eu já me sinto sem rumo conhecendo meu passado, agora imagine você. — Ela voltou a me fitar claramente preocupada.

— Mas eu sei exatamente o que fazer. — Sustei seu olhar. — E por hora, nos preocuparemos com nosso bebê, nosso Mōkṣa. — Beijei sua barriga e ele se mexeu em resposta.

— Está bem, meu amor.

Eu amava o biquinho que ela fazia ao me chamar de amor, amava o modo como ela confiava em mim ao ponto de me contar seus medos, e sabia que ela me amava na mesma medida. Eu não sabia ao certo o que iria fazer, mas algo precisava ser feito e naquele momento eu precisava passar confiança a ela. Mas eu sabia exatamente por onde começar: vasculharia todos os cantos da minha mente a procura de pistas, visitaria quem fosse preciso, iria a todos os lugares, pois se algo foi ocultado de mim, foi por algum motivo, e eu preciso descobrir qual é.

— Algo ainda te preocupa. — Toquei seu queixo e a obriguei a me olhar.

— Estava pensando em sua chave... Porque Kael a queria.

Minha chave me lembrava de minha mãe, não biológica, tê-la dado a mim. Mas agora com essas novas lembranças; eu as ganhei de minha mãe ainda bebê, antes dela me entregar naquela casa. Mas não fazia sentindo algum, alguém como Kael querer algo tão sem valor.

— Minha chave? — Passei a mão pelo pescoço, quase que em um ato reflexo.

— Sim. — Ela parou de repente, como se avaliasse até que ponto eu poderia saber dessa história. — Ele mandou que eu a pegasse, naquele dia no Lavenka. De inicio eu não entendi o por quê, ele só me explicou que eu não precisava saber naquele momento e que a conseguisse o quanto antes, pois se tratava de algo que ele desejava muito. — Ela mordeu o lábio inferior, claramente constrangida.

O Sabor da PerdiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora