Capítulo 6: Vi a morte em seus olhos

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Naquele instante, eu tive medo por você...

Encostei na parte traseira do carro e inspirei fundo, deixando aquele ar puro adentrar meus pulmões; eu nunca me sentira tão vivo. Fechei os olhos por um minuto, e concentrei-me em escutar tudo ao meu redor. O vento na copa das árvores, o cantar dos pássaros e o silêncio. Voltando a abrir os olhos, fitei a rua de chão, que se estendia a minha frente. Para além das fronteiras que meus olhos alcançavam. De repente um carro preto enorme; uma caminhonete para ser exato, surgiu no horizonte. O frio e a paralisia que tomou meu corpo me anunciou, que não era coisa boa.

— Caio, entre no carro... — Thamy surgiu pela porta, correndo em direção ao carro. — Agora! — Ela gritou, tirando-me da inércia.

Fitei os olhos preocupados de Aristeu, antes de entrar no banco do passageiro. Eu nem havia fechado a porta direito. quando ela já arrancara com o carro. Deu a ré, cantando pneu e levantando uma cortina de poeira, enquanto ela entrava na estrada, e se afastava da casa pelo sentindo inverso do outro carro. Ela trocava as marchas rapidamente, cuidava dos retrovisores, e mantinha as mãos firmes no volante. Pelo espelho pudemos ver, eles estavam se aproximando. Ela fez uma curva repentina para a esquerda, me fazendo bater com a cabeça violentamente no vidro, e o corpo na porta, minhas costelas queimaram e eu arfei.

— Desculpe. — Ela disse me lançando um breve olhar.

Ainda sem ar, eu apenas balancei a cabeça positivamente. Me concentrei em minha respiração, pois pontos pretos surgiam em minha visão e, eu não podia desmaiar agora. Fitando o retrovisor, vi que eles ainda nos seguiam. Grandes árvores começaram a nos fechar por todos os lados, ela conseguiu uma certa distância e respirou mais tranquilamente. Virou novamente para a esquerda, adentrando mais a floresta, colocou o carro em meio a uma grande junção de flores e árvores pequenas; o escondendo por completo. Thamy me guiou para mais adentro, me instruindo a ficar em silêncio e, cuidar para que não fizesse muito barulho. Ouvimos pneus cantarem ao pararem, depois o bater de três portas.

— Dominus, Demétrio e meu irmão, Kael. — Ela enrijeceu, ao identificar nossos perseguidores.

Nos concentramos a ouvir os passos, mas de repente eles cessaram, Thamy escutou primeiro; eles estavam voando. Fitei o céu coberto pela copa das árvores, e vi dois vultos negros. As asas deles de longe se comparavam com as de Thamy, eram menores e menos brilhantes, seria um milagre elas conseguirem sustentar aqueles enormes corpos.

Thamy com um grande impulso, flutuou antes de abrir as grandes asas. Que primeiro se encolheram junto ao seu corpo enquanto ela subia mais alto com movimentos circulares pra só depois abri-las em todo o seu comprimento. Era silenciosa e graciosa. Atingiu um deles, Demétrio por primeiro. Socou seu estômago com uma força desumana, montou em suas costas, tomou a base das asas com ambas as mãos, apoio os pés nas costas dele; entre elas, e chutando-o para baixo, as arrancou de seu corpo, que caiu com um baque surdo a centímetros de meus pés. Completamente sem vida. Tudo isso durou apenas dois segundos.

Lançou as asas longes e partiu para atacar Dominus. Acertou o primeiro golpe, mas foi surpreendida por ele, que a bateu no rosto lançando-a para baixo. Ela caiu batendo em galhos, até encontrar o chão, arfou, mas logo se levantou. Dominus havia sumido, ela me fitou, havia pânico em seus olhos. Senti mãos me agarrarem pelo pescoço, sua pele fria em contato com a minha parecia roubar o calor de meu corpo. Minhas costelas voltaram a queimar e o ar não mais entrava em meus pulmões. Vi Dominus atingir novamente Thamy, antes do dono das mãos me virar. Agora estava de frente para Kael, ele puxou minha camisa, arrancando os botões e, expondo minha pele. Traçou um risco vertical sobre minhas costelas; antes quebradas e agora um pouco melhores e, envoltas em faixas. Senti sua unha rasgar as faixar, depois a pele; que se abriu. E então cortou minha carne. Ouvi murros e socos a minhas costas, mas não conseguia me concentrar, para saber se Thamy ainda estava bem.

— Olhe para mim, mundano. — Kael cuspiu sua ira contra mim, enquanto cortava aos poucos minha carne; indo mais fundo. Eu urrei de dor e, ele se divertiu com minha reação. Aquele homem, obtinha uma maldade sanguinária nos olhos.

— Solte-o... Agora, Kael. — Thamy esbravejou. Senti meu corpo mais frio e rígido, enquanto o sangue o abandonava.

Ele virou meu corpo com facilidade, tirando meus pés do chão, fazendo nos ficar de frente pra Thamy. Se não fosse por seus longos cabelos negros e suas asas inconfundíveis, eu diria que aquela não era ela. Sua face havia mudado, assumindo uma figura um tanto quanto; demoníaca. Suas orbitas estavam totalmente negras, as maças do rosto, estavam salientes sobre a pele pálida. Suas unhas estavam maiores e pontudas. Dentes ferozes e afiados, se acomodavam em seus delicados lábios. Suas asas, se moviam juntamente com sua respiração profunda.

— Eu disse, para solta-lo. — Sua voz ecoou pela floresta. Não mais com seu timbre doce e suave, mas sim com uma junção de vozes, graves e agudas, até meu corpo estremeceu com a intensidade de sua ordem.

Kael me jogou para o lado; com a facilidade que se livra de um boneco sem importância. Meu corpo bateu no chão, de lado e quase sem forças eu apenas elevei um pouco a cabeça para poder vê-los.

— Maninha, pensei que nunca mais a veria assim. — Ele me olhou por sobre o ombro, com o sorriso maligno estampado em seu rosto. — E por um humano. — tsc tsc tsc. — Ele estralou a língua e balançou a cabeça negativamente. — Você envergonharia nosso pai.

— Seu pai! — Thamy esbravejou entre dentes.

Ela partiu pra cima dele e, ouvi seus corpos se chocarem. Minhas pálpebras insistiam em fechar, e sem forças para resistir deixei a cabeça pender e, sentindo a gama fria tocando meu rosto, me entreguei a sonolência. Meus últimos flashes, foram dela sendo lançada ao ar, e da gargalhada de Kael, com a dor da irmã.

— Thamy... — Sussurrei, antes da incônscia tomar meu ser.

Fechei os olhos desejando apenas, poder salva-la.

O Sabor da PerdiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora