- Elissa! Não! – Falei a minha filha, enquanto ela corria em direção à uma loja de brinquedos localizada dentro do Aeroporto Internacional de Birmingham. – Filha, a mamãe já pediu pra você não sair correndo assim! – Alcancei a garotinha e a peguei no colo, ajeitando ela em meus braços.
– Mãe, brinquedo! – Elissa apontou para a loja infantil à sua frente. – Por favor, mamãe!
– Nós vamos na loja, Elissa, mas você não pode mais correr assim! E se você se perde igual aconteceu no mercado? – Reprendi-a, enquanto ela me olhava com um biquinho nos lábios. – Vem, a mamãe vai comprar alguma coisa pra você brincar durante a viagem.
Caminhamos as duas em direção a loja, e, depois de muito insistir, Elissa conseguiu que eu lhe comprasse um livro de colorir e uma caixinha de lápis de cor. Quando finalmente nos dirigimos para a parte do aeroporto onde era a estação de trem, sentamos em frente ao portão de embarque do nosso trem em direção à Londres, e eu pude relaxar pela primeira vez no dia.
Faziam somente quatro meses que minha mãe, Angelina, havia falecido devido ao câncer. Então eu e Elissa ficamos sozinhas no mundo. Minha mãe era tudo que eu tinha e minha única família. Meu pai havia sumido, quando, aos dezoito anos, eu anunciei minha gravidez. Não que isso fosse ruim, já que meu pai era violento e passou a vida inteira batendo em mamãe e em mim. Quando engravidei, ele me xingou, culpou Angelina, e finalmente disse que iria sair de casa. Pela primeira vez em anos, eu e minha mãe estávamos livres daquele homem que infelizmente, era meu pai.
Como eu sempre digo a todos, minha filha não tem pai. E é verdade. Elissa é fruto de um estupro que sofri pelo meu ex-namorado. Na época, para fugir dos problemas de casa, eu saía – ficar em casa significava apanhar e ver minha mãe apanhando – e bebia muito. Em uma das muitas noites de festa, eu acabei me deixando levar e experimentei uma droga nova que estava rolando. Meu namorado na época, aproveitou-se disso para me abusar. Eu ainda era virgem. Como todas as garotas, eu imaginava minha primeira vez de modo romântico, com a pessoa que eu amasse. Mas não foi bem assim. E graças ao machismo presente no mundo, eu não obtive ajuda. Não tive coragem de falar sobre aquela noite, então simplesmente guardei para mim.
Contudo, quando descobri que estava grávida, não tive outra escolha se não falar a verdade. E ninguém, com exceção de Angie, acreditou em mim quando contei que havia sido estuprada. Claro, quem iria acreditar em uma garota que escondeu algo assim, não é? E como eu havia usado drogas ilícitas, eu era culpada, e o homem que me estuprou, não havia feito nada de errado. Sinceramente, o machismo do mundo me enoja. Nunca me passou pela cabeça procurar meu estuprador para lhe falar da gravidez, e era melhor assim.
Foi em abril de 2014 que Elissa nasceu. E quando eu vi aqueles olhinhos azuis me encarando de volta, eu tive certeza de que minha vida estava completa, e que a razão para ser feliz estava ali, em meus braços, e eu não precisaria de homem algum para me ajudar a cria-la. Afinal, eu tinha mamãe. Era tudo que eu precisava no mundo.
Quando ela completou seis meses, resolvi começar a faculdade que sempre quis cursar: Design de Interiores. Com a ajuda de mamãe, consegui conciliar a maternidade com meus estudos. Eu cuidava de Elissa durante o dia, enquanto mamãe trabalhava, e a noite, eu ia à faculdade e mamãe cuidava dela. Durante quase dois anos, fomos apenas eu, Elissa e mamãe.
Claro que eu não contava com o fato de que mamãe adoeceria. Quando descobrimos o câncer, em janeiro de 2016, o médico disse que Angie tinha apenas seis meses de vida restantes, no máximo um ano. Tentamos alguns tratamentos, mas o câncer de mamãe já havia se espalhado e não havia nada a ser feito. Cerca de oito meses depois, em novembro, Angie faleceu e eu me vi sozinha com Elissa.
Foi então que decidi me mudar para Londres, para recomeçar e deixar para trás traumas que eu gostaria de esquecer. Vendi nossa casa, tranquei a faculdade e procurei um apartamento para alugar em Londres. Quatro meses depois, em março de 2017, estamos aqui aguardando nosso trem em direção a nossa nova vida. A partir daquele momento, eu soube que seríamos apenas eu e Elissa contra o mundo.
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A Place To Call Home
RomanceUma mãe solteira, de apenas 22 anos, resolve mudar de cidade para começar uma vida nova com sua filha de três anos, após sua mãe, que era quem a ajudava com tudo, perder a batalha para o câncer. Sua vida começa a mudar já no trem a caminho de Londre...