VIII

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    -Alô? ALÔ?? Oi Karla!! –Ayana se esforçava para ouvir a ligação cheia de chiados e cortes. Desde que o tempo mudara para frio e chuva há três dias, os telefones e internet estavam péssimos.
-Oi Ayana! Tudo bem? O que manda?? –Respondeu Karla aos berros do outro lado.
-Então K, tô num proj... ALÔÔ... OI... Eu tô num projeto lindo!! Mas a gente precisa DA SUA AJUDA!!
-A GENTE QUEM? QUEM TÁ ENVOLVIDO??
-Eu o Danilo E UNS DOIDOS... Tá ouvindo? TÁ OUVIIIINDO?? Eu te ouço sim... Tá baixo, mas não corta... VOCÊ VAI AMAR AMIGA!! Precisamos de uma matemática!! Você cursou trigonometria não foi??
-EU SOU MAT.. MÁTICA! Estou trab... com energia ren... vel... Ss.. tent...bilidade sabe?? –Ayana não entendeu nada, mas parecia uma pergunta.
-Sim eu sei! É verdade!!! E aí você vem??
-Hoje?
-Quando quiser!!
-Posso... da... ras.. qui...
-Tá bom amiga, tô te esperando, obrigado! Você vai adorar essa!!!
-Ok! B..ss..
-Tá bom, tchau!! –Elas desligaram.
-Que ligação horrível!! –Protestou Ayana com irritação.
-E aí? Ela vem? –Perguntou Danilo um tanto ansioso. Um especialista em matemática ainda era o que faltava na equipe.
-Eu escutei um "posso", mas não sei se vem hoje. Ainda bem que ela sabe exatamente aonde me refiro quando digo "aqui". Imagina explicar um endereço numa ligação dessas...
-A gente podia buscar ela...
-Eu não consegui nem escutar direito se ela vem hoje! Vou saber onde ela tá? Mas está vindo. A gente não tem muita opção... Poucos são de confiança pra esse início de pesquisas e vamos precisar revelar mais do que o tradicional para o especialista em matemática.
-É... É verdade... Falando em tradicional, foi ótima a ideia de dizer que as relações entre música e vídeo são um concurso nerd. Até professores vieram. Onde você arranjou aquele troféu?
-É meu, da escola. Ganhei um concurso de soletrar!
-É, pelo menos o troféu é oficialmente nerd! –Ele riu e ela deu um soco leve no ombro do esposo.
-Como se você fosse "ô descolado"!
-Mas eu sou músico pelo menos...
-E eu pratico futebol... –Respondeu ela em tom de desafio. Ele bufou e foi taxativo:
-De nerd e de louco toda a nossa turma tem um pouco!
-Amém! –Encerrou ela e eles caminharam abraçados até a oficina do casarão onde tudo estava acontecendo.
Já faziam quase quatro dias desde que Natã e Alexandre tinham partido. Não deram mais nenhum sinal e as ligações feitas para Piltor sequer eram completadas.
Como sabiam bem, a causa era complexa e as autoridades locais não ajudavam. Com certeza estavam travando alguma batalha por Charles e Adriano, por isso não estavam totalmente preocupados, pois tinham ótimas cartas na manga, além de ótima estrutura para os garotos. A qualquer momento eles entrariam pelo portão com o carro de Alexandre, pois o furgão havia sido deixado no casarão por conselho do Dr. Cavalheiro, para ajudar na primeira impressão com a assistente social.
O casal saiu na oficina e parou para admirar sua "equipe" trabalhar duro, em busca de desvendar o segredo do imenso mapa de sons e imagens que lhes fora apresentado.
A chegada da grande matemática Dra. Karla Nascimento naquela tarde, fecharia a equipe, que já contava com dois físicos teóricos, três astrólogos, um maestro, que só aparecia as vezes, e três músicos, além de alguns amigos, todos filósofos, nerds e geeks, que palpitavam bastante, e dois professores de física quântica que traziam seu assistente, um jovem de 14 anos que não falava nem interagia muito, preferia ver e escutar apenas, mas que teria grande importância naqueles estudos, como sabemos hoje, o Professor Dr. Sant'Anna, mas que nessa época era apenas o pequeno Vinny.
Todos trabalhavam juntos e algumas das primeiras descobertas a respeito de uma Base Comum foram observadas após a chegada da Dra. Karla Nascimento e seus conhecimentos matemáticos, que completaram a equipe, ajudando a finalmente ultrapassar a primeira barreira, fazendo-a parecer bem lógica logo em seguida mas que só pôde ser quebrada através de seus complexos e detalhados cálculos, que mostravam as ligações exatas entre um acorde e um conjunto de estrelas por exemplo.
Se ao menos Natã e Alexandre ligassem e dessem sinal verde e o projeto pudesse ser expandido além dos mais próximos, poderiam dar um salto nas descobertas, mas o quarto dia desde que partiram veio e foi, e nenhuma notícia foi dada.
Finalmente, quase às dezesseis horas do quinto dia desde que eles se foram para Piltor, o portão rangeu e se ergueu e o carro de Alexandre pôde ser visto entrando e estacionando no pátio do casarão.
-Quero só ver a cara deles quando virem essa galera lá na oficina! –Comentou Ayana com Danilo, enquanto ambos assistiam a chegada dos amigos através da janela de um quarto no segundo andar.
-Eles vão é ficar de boca aberta com as descobertas... E agora que o garoto tá aqui... Quer dizer, ele tá aqui não é?
Natã havia saído do lado do passageiro, se dirigiu até a porta de trás do carro e a abriu para um garotinho de touca cinza sair e logo em seguida ele a fechou. Ayana e Danilo se entreolharam.
-O irmão de Charles não pôde vir!! –Concluiu ela.
-Putz que droga! –Rebateu Danilo se encaminhando para a porta do quarto, -vamos lá receber eles!
Desceram correndo enquanto colocavam suas blusas de lã e moletom. Pararam em frente à porta e ouviram o barulho da tranca estalar e em seguida a maçaneta girou e a porta se abriu. Entraram Alexandre e um garotinho que pelos vídeos, com certeza era Adriano. Logo atrás veio Natã, que fechou a porta e sem dizer palavra, caminhou diretamente para a janela que dava para seu jardim, permanecendo ali, parado, olhando as flores e plantas através do vidro.
-O que tá acontecendo? –Perguntou Ayana entre a ansiedade e o medo de ouvir a resposta. Alexandre sumiu com Adriano em direção à cozinha. Natã permaneceu de costas para o casal. Ouviram sua voz muito embargada declarar roucamente:
-Está morto! –Fez-se um silêncio gelado e o tempo parecia ter parado no cômodo. O que era branco ficou cinza e o mau tempo passou a ter um significado triste e desolador, enquanto tinham a sensação de que o chão havia desaparecido.
Foi Ayana quem cortou o silêncio com um sonoro "O QUE???" e Natã se virou para eles de cabeça baixa. Quando levantou a cabeça, seus olhos cintilavam de lágrimas que ele lutava para conter. Com a voz rouca e ainda mais embargada ele respondeu:
-Estamos voltando do enterro do garoto! -Fez uma pausa e soluçou, -Acabou tudo!! Charles se foi pra sempre... –E não podendo mais se conter, deixou as lágrimas rolarem dando vazão à imensa dor que sentia.    

Charles Mártir E O Segredo Do UniversoWhere stories live. Discover now