O Hospital Salete Munhoz Lima ficava no centro da cidade de Carmela do Sul.*Era um prédio moderno, enorme, com cinco andares e um amplo estacionamento.
Na opinião da população, era o melhor hospital da Região Sudeste do país. Bem equipado, muito bem administrado pelo doutor Leopoldo Fernandes, tinha a fama de ter os melhores profissionais e pagar os melhores salários. Médicos e enfermeiros se orgulhavam de trabalhar ali.
Naquela noite, o hospital recebera um grupo de vítimas de um acidente de trânsito. Sete pessoas haviam sido atropeladas num ponto de ônibus. Um carro esporte perdera o controle e o motorista subira na calçada.
Além das sete vítimas, duas com ferimentos graves e cinco com ferimentos leves, também havia sido levado ao hospital o motorista que provocara o acidente.
Dois policiais conduziam o indivíduo visivelmente bêbado pelo corredor. Ele tinha a mão direita sangrando muito e também precisava de socorro.
O rapaz alto, claro, gordo, tatuagem de um âncora no braço esquerdo e a tatuagem de um dragão no braço direito, aparentando pouco mais de vinte anos, estava dando muito trabalho para os policiais que tentavam contê-lo.
Um dos enfermeiros deixou a emergência disfarçadamente, quando viu o rapaz chegar.
_Armando, quebre este galho pra mim, pelo amor de Deus!_disse o enfermeiro Edgar enfiando-se rapidamente num quarto onde o namorado media a pressão de um idoso.
Armando, 27 anos, era alto, moreno claro, cabelos lisos e avermelhados, olhos castanhos e tinha um corpo atraente.
Já o namorado, 30 anos, era o oposto: baixo, moreno escuro, cabelos anelados, olhos negros e gordinho.
_Edgar, o que foi agora?_perguntou Armando irritado por ter sido incomodado em seu trabalho._Estou ocupado e só faltam trinta minutos para eu deixar o meu plantão.
Armando sorriu para o paciente, como a pedir desculpas pela atitude do namorado. Quando se despediu e saiu do quarto, foi seguido pelo rapaz que morava com ele há quase dois anos.
_Ninguém quer assumir o idiota que dirigia o carro que atropelou aquelas pessoas no ponto de ônibus. Ele está completamente alterado e deve ser um filhinho de papai idiota, porque já mandou os policiais tomarem no cu umas duas vezes. Mesmo assim, você sabe que ele tem que ser atendido e agora é a minha vez, fofo! Assuma esta pra mim, lindo!_implorou Edgar.
_Pois volte lá e diga pra eles chamarem um médico pra apagar o cara e aí você faz o serviço, ok?! Não vou perder o meu compromisso por causa dessa figura de jeito nenhum, Edgar!
_E que tal eu lavar as janelas pelos próximos seis meses, hein?! Sei que você odeia lavar janelas, Armando! Por favor...me socorra ou eu vou ser chamado a atenção daqui a pouco.
Armando suspirou cansado. Edgar sempre fazia esse tipo de coisa, pedindo que ele o cobrisse nos casos mais complicados, mas o namorado sabia que se ele não tivesse aquele emprego, não teria também o dinheiro para pagar a sua despesa no apartamento e sobraria pra ele sozinho.
Um som chamou a atenção dos dois: o rapaz vomitara quase nos pés de um dos policiais.
Ao ver a cena, Edgar deu um toque no ombro do namorado:
_Quem cala consente! Te devo mais essa!
O enfermeiro baixinho e gordinho saiu apressadamente sem olhar para trás.
_Droga!_disse Armando se recriminando por deixar-se ser manipulado daquele jeito.
Mesmo com a ajuda dos dois policiais, foi difícil atender o rapaz que tentava chutar todo mundo o tempo todo e gritava palavrões.
O médico assumiu o caso, assim que o enfermeiro informou que acabara de limpar a mão do rapaz.
Armando dirigiu-se ao banheiro dos funcionários do hospital, decidindo tomar banho rapidamente, ou chegaria atrasado em seu compromisso.
Uma dorzinha de cabeça se insinuava atrás dos olhos e ele sabia que indicava que precisava dormir mais durante a noite, mas não naquela noite.
Apesar de receber um bom salário, o enfermeiro era obrigado a completar sua renda atendendo clientes no prostíbulo do Gordo. Agradecia a Deus por ter boa aparência, carisma e saber tratar muito bem os clientes, como elogiara o Gordo algumas semanas depois que o aceitou.
Os atendimentos ou programas eram feitos às sextas-feiras ou sábados, dependendo dos seus plantões no hospital, a partir das vinte horas e, geralmente, ele atendia dois ou três clientes por noite, nunca um quarto.
No outro dia, ele dormia até às duas da tarde, quando se levantava e ia faxinar o apartamento. Tirando lavar as janelas, ele tinha que admitir que adorava fazer faxinas.
Infelizmente, apenas ele era organizado no apartamento, porque Edgar tinha a mania de deixar as roupas espalhadas, a toalha molhada sobre a cama ou mesmo se esquecer do prato, muitas vezes com restos de comida, em cima do rack da sala.
Haviam se conhecido há dois anos, na porta do prostíbulo, onde Armando gostava de ficar oferecendo seus "serviços". Edgar aceitara o convite de Armando para entrar.
Desde o início, os dois demonstraram ter uma boa química. Edgar voltou outras vezes e sempre exigia ser atendido pelo enfermeiro. Com o tempo, Armando passou a atendê-lo em seu próprio apartamento, sem cobrar de Edgar. Chamá-lo para morar com ele, foi o próximo passo.
Armando trabalhava, às vezes, em plantões dobrados, cobria folgas dos colegas, para pagar a clínica onde a mãe estava internada e que consumia quase a metade do seu salário de enfermeiro. Apaixonado pela mãe, não admitia que ela ficasse internada em uma casa qualquer, especialmente, porque ela tinha Alzheimer e precisava de cuidados especiais.
Às vezes, ele tinha que aceitar receber alguns clientes na sexta e também no sábado, quando tinha folga no hospital, para fechar as contas no final do mês.
O nome de guerra, como ele dizia, era Scoth Lee e ele tinha uma clientela fiel que vinha quase todas as sextas-feiras. De vez em quando, apareciam dois ou três estranhos e ele os atendia também.
Armando observava que, às vezes, quando chegava algum homem que não tinha boa aparência, ou mesmo que aparentava higiene duvidosa, o Gordo já mandava pra ele, pois sabia da enorme tolerância do enfermeiro.
Fora apresentado ao dono do prostíbulo, Gordo ( um homem forte, negro e com um bigode enorme), por um antigo enfermeiro do hospital, que também recebia seus clientes ali. Ele lhe contara sua dupla identidade que, assim como no caso de Armando, lhe ajudava a manter as contas em dia.
Armando engoliu dois comprimidos com um copo de água assim que chegou no prostíbulo do Gordo, tentando aliviar a dor de cabeça que se tornava mais forte.
Rezou para que os clientes daquela noite não pedissem mais do que ele pudesse atender, pois o Gordo não gostava de ouvir queixas dos clientes.
Armando respirou fundo e colocou o seu melhor sorriso no rosto, ao se dirigir para o quarto que lhe era destinado para trabalhar.
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*Nota do autor: nome fictício.
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GÊMEOS: ENTRE A LUZ E A ESCURIDÃO/ versão light-não contém cenas de violência
RomanceDurante o dia, ele era o enfermeiro Armando...durante a noite, ele se transformava no prostituto Scoth Lee. Tudo ia bem, até que o enfermeiro prostituto conheceu os gêmeos Rodrigo e Ricardo. No início, ele achou que entrara no paraíso: morar numa ma...