CAPÍTULO 5-O QUARTO CLIENTE (V.L.-versão light*)

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Armando abriu seu guarda-roupas desanimado: ele estava quase vazio.

Muitas peças haviam sido levadas por Edgar e outras ele vendera para pagar as dívidas.

Dirigiu-se até a geladeira pequena que ele conseguira de segunda mão, após vender a geladeira antiga, que era maior e mais nova.

Mudara muitos hábitos: preferia fazer refeições fast-food e vendera o micro-ondas.

_Que miséria, meu Deus! Se isso não for o fundo do poço, eu não sei o que é!_suspirou desanimado passando a mão na barba que ele estava deixando crescer, assim como os cabelos.

Não dava pra ficar gastando dinheiro nos cremes que ele usava para se barbear, evitando ficar com a pele irritada. Melhor deixar do jeito que estava. Os clientes não tinham reclamado.

Comeu três bananas, duas barrinhas de chocolate e tomou um copo de leite. Esperava que aquilo fosse suficiente para mantê-lo alerta naquela noite, visto que a insônia marcara presença nos últimos dias.

Vestiu-se da melhor maneira possível.

Ainda não acreditava que alguém com quem ele morara durante tanto tempo o tivesse enganado daquele jeito.

Sentiu a mão do Gordo em seu ombro, quando subia os degraus da entrada do prostíbulo.

_Trouxe o meu dinheiro, Scoth Lee?_o homem perguntou sem fazer rodeios.

_Só terei o dinheiro no final de semana. Sabe como é...estou cheio de contas atrasadas e...

_E isso é problema meu?_interrompeu o outro de forma grosseira._ Já dividi em várias prestações e ainda vai atrasar? Não está pensando em me passar a perna não, né?!

_Claro que não._respondeu rapidamente.

_Então entra logo que já tem gente te esperando._deu um pequeno empurrão no ombro dele.

O Gordo apontou para o lado do barzinho que vendia bebidas baratas num canto da entrada principal.

Armando preferiu acreditar que o seu cliente seria um rapaz feio, magro e baixo que estava sentado ao lado de um homem obeso e de aparência duvidosa.

_Qual dos dois?_perguntou esperançoso.

_Os três._o Gordo pareceu entusiasmado._ Aquele negão que está saindo do banheiro também está a fim de te comer esta noite. Filho, não sei se é porque você baixou o preço ou porque está se empenhando mais, pois todos os dias tem cliente te esperando. Deve ser por isso que está magro desse jeito. Veja se não vai desmaiar debaixo do cliente, hein?!

O Gordo se afastou antes de ouvir o sussurro de Armando:

_Se eu não der conta, te chamo._não se conteve.

Dirigiu-se ao quarto desanimado. Abriu a gaveta onde se encontravam os quites básicos oferecidos pelo Gordo, caso os rapazes não tivessem.

Bons tempos aqueles em que o enfermeiro se orgulhava de usar apenas materiais de primeira qualidade. Os melhores lubrificantes, as melhores camisinhas...agora, até o roupão era aquele surrado oferecido pelo Gordo.

A maioria dos clientes vinha direto do trabalho, suados e alguns vinham totalmente imundos mesmo.

Olhou para o relógio que indicava que cada minuto que se passava o aproximava cada vez mais daqueles homens imundos e anônimos que o esperavam.

Olhou-se no espelho e lembrou-se das palavras da mãe:

_Evite cair, filho. Porém, se o fizer, não se iluda, pois ninguém irá levantá-lo. Terá de fazê-lo sozinho e rápido, antes que a mão que não lhe estenderam novamente te empurre ao chão.

Armando ouvira aquelas palavras numa das visitas que fizera à mãe na cadeia. Já haviam se passado tantos anos e ele ainda se lembrava daquelas palavras. Na época, ele tinha apenas quinze anos e tivera que transar com o carcereiro para que ele liberasse a sua entrada.

Foi naquele dia que Scoth decidiu não voltar mais para a casa do padre que o acolhera assim que a mãe fora presa.

Foi ali que ele decidiu sobreviver sozinho, sem a ajuda de ninguém. Descobrira que poderia ganhar dinheiro fazendo com os outros homens o que era obrigado a fazer de graça com o padre desde os doze anos.

Já eram quase três e meia da manhã, quando o dono do prostíbulo bateu na porta do pequeno banheiro. Sem esperar permissão, entrou, assustando Armando.

_Já tomou seu banho? Que pena!_riu o Gordo.

_Nem vem. Já esgotei a minha cota de hoje e vou pra casa._não escondeu a sua revolta.

O Gordo tomou a toalha que ele segurava e começou a enxugar-lhe as costas lentamente.

_Você está certo. Não queremos que ninguém te machuque, não é mesmo? Especialmente agora que você está voltando às boas.

O dono do prostíbulo lhe estendeu as duas cédulas de cem reais.

_ O que é isso?_perguntou Scoth Lee desconfiado.

_Tem gente te esperando aí fora. Ganho duas dessas se te convencer a aceitar.

_Nada disso, Gordo! Ninguém mais entra no meu rabo hoje! Tô quebrado e vou pra casa!

O Gordo enfiou as cédulas na mão de Armando.

_Pense melhor, Scoth. Ele nem parece ser tão mal e prometeu ser generoso. Vai pagar mais, se gostar.

Armando gemeu, se sentindo tentado a ganhar aquele extra:

_Não faz isso comigo, cara. Eu tô quebrado!

_Financeiramente também, esqueceu? Não se pode contrariar o cliente...especialmente um que já começa com duas dessas.

Armando olhou as cédulas que tinha nas mãos. Estava precisando tanto daquele extra!

_Vamos fazer o seguinte: vinte minutos de intervalo, ok?! Porque você já está me devendo aquela grana e eu não vou querer perder estas duas. Tome._estendeu-lhe duas chaves.

_O que é isso?

_As chaves. O movimento hoje estava fraco e todo mundo já foi embora. Quando terminar, fecha tudo pra mim. Tenho cópia da chave lá em casa._o homem preparou-se pra sair.

_Espere aí...eu não disse que vou aceitar!_indignou-se sentindo-se pressionado.

_Vai sim...ou vai ter que me dar este dinheiro que vou perder por causa da sua teimosia._ameaçou o outro.

_Mas isso é chantagem, porra! E ainda vai me deixar sozinho com ele?

_O cliente é seu e eu já ganhei o meu. Ele já está te esperando no quarto. Vinte minutos. Tenho certeza de que vai tirar de letra e vai ser mais um cliente satisfeito._disse Gordo fechando a porta atrás de si.

Armando olhou-se no espelho:

_É, bicha...tem um lugar além do fundo do poço e é nele que você está.

O estômago doeu: receio por receber o homem sozinho e fome.

Sabia que não havia nada pra comer.

Respirou fundo e se dirigiu ao quarto. Precisava de dinheiro...viesse ele de onde viesse, conformou-se.

Deu dois toques na porta e entrou.

O homem já estava deitado na cama, totalmente nu. Parecia alto, forte e branco.

A luz do quarto estava apagada e ele notou que somente a fraca luz sobre a cama estava acesa.

_Posso acender a luz?

_Não. Não precisa ter medo de mim, Scoth Lee, só quero me divertir um pouco. Tire logo este roupão idiota e deite-se aqui.

Olhou em volta receoso: era uma sensação estranha olhar para os cantos escuros do quarto e ter a certeza de que os dois estavam sozinhos no prédio antigo.

O homem exigiu que ele permanecesse na cama por quase uma hora, até que uma voz grossa e masculina ordenou:

_Chega!


(*V.L.=Este capítulo é uma adaptação da versão estendida.)

GÊMEOS: ENTRE A LUZ E A ESCURIDÃO/ versão light-não contém cenas de violênciaOnde histórias criam vida. Descubra agora