Capítulo 1

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Mais uma tarde tediosa estava se passando, pensou Katrina enquanto seu olhar ia de encontro ao vidro da janela. Lá fora os galhos das árvores iam e voltavam com o vento, no quarto só havia silencio e tédio, até que a mãe de Katrina resolveu invadir sua privacidade, abrindo a porta sem o mínimo de cuidado, assustando a menina.

– O que houve mãe? - Perguntou com os olhos arregalados.

– Preciso que vá ao mercado para mim, agora mesmo - Falou sua mãe, com aquele ar autoritário de sempre.

– O que ganho com isso?

– O imenso prazer de sair desse seu quarto sem graça e escolher o nosso jantar - Respondeu sorrindo.

– Bravo, - Kat bateu palmas, fingindo empolgação - finalmente vou ter utilidade nessa casa. - Concluiu sarcástica, enquanto sua mãe revirava os olhos.

Kat desceu as escadas sem o menor ânimo. Durante o percurso ela ia pensando no quão animada era sua vida. Nada de extraordinário, umas quedas e joelhos machucados na infância, algumas amizades que ficaram para trás após a mudança, e a solidão que restara em sua nova escola, o que era o pior, afinal, aos 16 anos, tudo o que se quer é aproveitar a vida ao máximo, só que era terrível fazer isto sozinha. Apesar de se julgar pouco sociável, ela não entendia como ainda não havia feito amizades, afinal a escola era enorme, e trazia grandes possibilidades, mas aqueles adolescentes malditos passavam por ela torcendo o nariz, e sussurrando coisas como "caipira", como se o fato de ter vindo do interior do estado fosse motivo de piada.

Após escolher uma janta de primeira qualidade, pizza congelada, ela iniciou uma procura de extrema importância: encontrar sua batata frita predileta. Sem olhar onde ia, acidentalmente atropelou o pé de alguém com o carrinho do supermercado. Pobre coitado do pé, e do dono dele. O rapaz se encolheu de dor e pulou igual a uma gazela, além de ter ficado vermelho como pimenta. Kat correu até ele, analisando a possibilidade de ter arrancado um pedaço do pé do garoto.

– Ai meu Deus! Me desculpe, não fiz por querer.

Ele estava de cabeça baixa, provavelmente se recuperando do susto de quase perder o dedo mindinho.

– Acontece, - Respirou fundo - não precisa pedir desculpas - Disse levantando a cabeça para olhar a assassina de dedos.

Ao ver os olhos verdes daquele garoto, os dela quase saltaram das órbitas. Ele sorriu gentilmente, tentando disfarçar a dor que havia sentido, inclusive, ele atuava bastante mal.

– Mas é claro que devo pedir desculpas, está doendo muito? - Ela ainda estava olhando assustada para o pé do rapaz, com medo de que à qualquer momento o dedo machucado fosse cair, graças à sua tão incrível capacidade de não prestar atenção por onde andava.

– Já passou, obrigado pela preocupação.

– Agora vou prestar mais atenção aos pés das pessoas, seria uma vergonha ter que pagar uma cirurgia plástica de um dedo estrangulado.

– Você é engraçada - Ele riu.

– Obrigada - Respondeu ela, sorrindo.

Ela percebeu que estava ficando vermelha de tão constrangida que estava, afinal, aquela foi a conversa mais longa que teve com alguém daquela cidade desde a sua chegada à 3 meses. Ela terminou de colocar o necessário no carrinho de compras e seguiu para o caixa. Enquanto esperava sua vez naquela  fila que mais parecia a entrada para o Campo de Asfódelo de tão grande, começou a mexer no celular, quando de repente sentiu uma pancada brusca no bumbum.

– Ah, me desculpe, não foi por querer...

Ao se virar, ela viu os olhos verdes do mesmo garoto de algum tempo atrás. Este sorriu ao ver que era ela a quem ele quase deixou sem bunda.

– Não precisa pedir desculpas, agora estamos quites. - Kat tentou soar sarcástica.

– Temos que parar de quase aleijar um ao outro - Afirmou ele, com um sorriso exageradamente largo.

– Concordo.

– Ah, e caso tenha que me pagar indenizações pelo meu dedo, saiba que meu nome é Matheus Albuquerque.

– Certo, o meu é Katrina Nunes, caso tenha que pagar para pôr silicone em meu bumbum - Rebateu ela.


Os dois caíram na risada ao mesmo tempo, e logo começaram a conversar sobre suas capacidades de serem desastrados. Quando Kat finalmente chegou até o caixa, ofereceu o número do telefone para ele, e ele ofereceu o dele. Ela passou as compras e foi para casa, se despedindo de Matheus com um sorriso. Estava tão empolgada que quando via algo verde, lembrava dos olhos dele, ou se via algo amarelo lembrava do cabelo dourado que ele tinha.

Kat chegou em casa com um sorriso enorme e gracioso no rosto, e sem dúvida o motivo dele era Matheus Albuquerque, seu mais novo amigo.

À noite ela ainda estava eufórica. Jantou, tomou um belo banho, assistiu algumas notícias no jornal, e finalmente deitou-se em sua cama, mas tudo com um sorriso bobo nos lábios. Ainda deitada e sorridente, ela pensou que Matheus era aquele tipo de garoto que deixa as meninas meio bobocas, igual ao estado em que se encontrava naquele momento. Ela ficou imaginando o que ele estaria fazendo e, pouco depois seu celular tocou. Um arrepio nervoso passou pelo seu corpo ao ver na tela do celular o nome dele.

Ela atendeu e se odiou por estar com uma voz tão rouca.

– Te acordei ? - Pelo tom de voz, ele parecia estar sorrindo.

– Se tivesse me acordado, eu soltaria uma bomba na sua casa - Ela rebateu.

– Você é a cúmplice do Bin Laden?

Os dois caíram na gargalhada, demorou algum tempo até que se recuperassem da crise de risos.

– Sua risada me faz querer rir - Disse ele após um pequeno intervalo de silêncio.

– Eu sei que é feia.

– Não disse isso, só quis dizer que sua risada é tão espontânea e animada que é quase impossível não rir junto.

– Eu...não sei o que dizer... - Kat gaguejou nervosamente.

– Diga que vai sorrir assim quando nos virmos novamente.

– Pretende me ver? - Ela não conteve um sorriso.

– Bom, eu tenho motivos para ligar...

– Diga-me, senhor Matheus.

– A senhorita Nunes aceitaria me encontrar amanhã, na praia? - Indagou ele após respirar fundo.

– Que atrevido, é falta de respeito convidar uma moça que acabou de conhecer para um banho - Respondeu ela, deixando escapar uma risadinha.

– Ô criatura, e quem falou em banho? - Ele perguntou, parecendo constrangido.

– É uma praia, ué.

– Sem banho, apenas conversa, areia e vento na cara - Falou exasperado.

– Então, de que horas nos encontramos?

– Às 15:00 horas? - Sugeriu ele.

– Combinado.

– Certo, então, te desejo uma boa noite, senhorita Nunes.

– À você também, senhor Albuquerque.

Ela desligou o telefone e começou a pular de um lado à outro do quarto. Euforia era pouco para descrever o que ela sentia, seus lábios eram pequenos para o tamanho do sorriso que queria dar. Kat relembrou aquela conversa milhares de vezes antes de conseguir ter sono, e nada poderia chatear ela. Era loucura, mas seu coração não parava de bater forte, e ela adormeceu pensando que poderia estar se apaixonando por alguém, pela primeira vez.


Amor sem fronteirasOnde histórias criam vida. Descubra agora