Capítulo 13

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Ferdinand lembrou-se da despedida naquela manhã. Raphael lhe dissera que estava cheio de trabalho durante a semana inteira e só estaria livre para vê-lo sexta-feira à noite. Será que era verdade? Ou apenas um preparo para o adeus final? Será que o namoro já estava prestes a acabar? Meu Deus, e ele ainda não tinha nem bem começado...

Sentiu uma dor forte no peito, como se tivesse levado uma facada.

Antony percebeu que havia algo de errado com o amigo.

— Ferdinand? Você está se sentindo bem? Aconteceu alguma coisa? Ele encarou o amigo com olhos cheios de tristeza.

— Não. Está tudo bem.

Mas Antony não era bobo. Ferdinand era transparente como água e não sabia mentir. Era evidente que estava se apaixonando por Raphael Farrid. E era evidente também que iria acabar se dando muito mal. Mas o que ele próprio podia fazer, senão ajudá-lo a colar os pedaços de seu coração, quando ele lhe desse o fora?

— Tem certeza?

Ele deu um sorriso triste.

— Tenho. Não se preocupe.

Claro. Tanta certeza quanto dois mais dois eram cinco.

Ferdinand voltou a escritório cheio de desânimo. Sentia-se incapaz de se concentrar no trabalho, embora aquilo fosse uma necessidade. A campanha para um novo cliente estava a todo o vapor e ele não podia nem pensar em atrasar o andamento do projeto.

— Como estão as coisas, Ferdinand?

Ele quase deu um pulo da cadeira ao ver seu chefe ali, de pé à sua frente, encarando-o de uma forma meio estranha.

— Hã... Está tudo bem, Marcus.

Mas aquele homem não costumava ser enganado com muita facilidade, era astuto por demais, afinal não fora à toa que conquistara sua reputação profissional.

Marcus Oliver era uma pessoa difícil e exigente, um trabalhador perfeccionista e incansável, guiado por uma porção de demônios que só ele devia conhecer. Ninguém sabia de muitos detalhes a respeito de sua vida pessoal, a não ser o que se comentava na imprensa.

Até meados dos anos oitenta, havia trabalhado como diretor de criação numa agência de publicidade de médio porte na cidade de São Paulo. Então, pedira demissão e abrira seu próprio negócio na garagem de sua casa. Sua única funcionária havia sido uma secretária eletrônica.

A princípio, a concorrência não havia lhe dado à mínima importância. Não tardaram, porém, a perceber que o haviam subestimado.

Sete anos depois ele estava multimilionário, dirigindo uma das maiores agências de publicidade do país. Empregava centenas de pessoas, pagava-lhes generosos salários e exigia dedicação e eficiência em troca.

— Está tudo bem mesmo, Ferdinand?

Não dava para enganar o astuto Marcus Oliver. Ninguém jamais conseguira tamanha proeza.

— Eu... quero dizer... acho que não estou conseguindo me concentrar direito no trabalho hoje.

— Será que eu posso ajudá-lo em alguma coisa?

Aquilo não deixava de ser irônico. Marcus, ajudando-o em seus problemas com Raphael? Uma grande piada! Os dois eram farinha do mesmo saco. Ricos milionários, totalmente voltados aos prazeres da carne! Não adiantava pedir conselhos a seu chefe. Ele iria lhe dizer para aproveitar o momento, divertir-se bastante, então ter inteligência suficiente para cair fora, antes que Raphael o fizesse.

— Não, obrigado, Marcus. E que... fui ao casamento de um amigo no sábado e acho que exagerei na bebida. Mas prometo voltar a ser Ferdinand de sempre amanhã de manhã, está bem?

Festas e ressacas eram algo que Marcus Oliver compreendia muito bem.

— Combinado. Mas trate de não fazer nenhuma extravagância no próximo fim de semana, porque pretendo marcar uma reunião com meus funcionários mais importantes na segunda-feira de manhã. E o quero bem sóbrio, está bem?

— V... vou estar. Pode ficar tranquilo.

— Ótimo. Se quiser falar comigo, estou na minha sala. Até mais, querido.

Ferdinand observou-o se afastar. O fato de ele a chamar de querido era algo comum, que não tinha nenhum significado especial. Outros funcionários recebiam o mesmo tratamento.

Foi o que começou a aborrecê-lo. Raphael passara o tempo todo a tratando de doçura, meu amor e meu bem. Ficara feliz com tamanha demonstração de carinho. Agora, porém, compreendia que tais palavras podiam significar a mesma coisa que o "querido" de Marcus Oliver.

Homens! Bah! Eram todos iguais!

Quantos outros homens Raphael tratava daquele modo? Dezenas? Centenas? Um desânimo profundo tomou conta do seu ser no momento em que o telefone tocou.

— Alô? — ele atendeu, a voz carregada de irritação.

— Será que estou chamando numa hora imprópria?

Era Raphael. Raphael Farrid, o ricaço da voz sedutora e do corpo irresistível.

Ferdinand segurou o fone com mais força.

— Bem, eu diria que depende.

— Depende do quê?

— Do motivo pelo qual me ligou.

Talvez nem tivesse mais de se preocupar com aquele homem. Era provável que tal chamado fosse apenas a despedida final.

Sinto muito, querido, mas acho melhor deixarmos as coisas como estão. Não temos nada em comum, não é mesmo? Além disso, pertencemos a mundos tão diferentes...

Bem que seu amigo Antony tinha razão. Raphael tinha se aproveitado de sua fragilidade e agora estava prestes a descartá-lo como se ele fosse um traste inútil. Maldito!

— Eu liguei a respeito de sexta-feira — respondeu ele, interrompendo-lhe os pensamentos. — Lembra-se de que ficamos de nos encontrar?

Ele ficou tenso.

— Lembro, sim.

— Eu tinha me esquecido completamente da festa dos meus pais. Eles estão completando quarenta anos de casados e vão oferecer um jantar lá em casa.

Que desculpa esfarrapada!

Ferdinand sentiu vontade de gritar de tanta frustração.

FELIZES PARA SEMPREOnde histórias criam vida. Descubra agora