Capítulo VI · Humildade

96 41 11
                                    

Nunca tinha cá estado antes. Tudo isto para mim era uma novidade. Todos estes edifícios enormes, com ruelas apertadas e vazias. Até mesmo a sala de transporte aqui era pequena, escura e suja. Levantei-me.

Peguei no dossiê que estava escondido na minha mala e comecei a lê-lo. Os planos sobre o que deveria fazer enquanto estivesse em Gémeos eram claros, mas a curiosidade sobre aquele dossiê era maior.

Bastaram-me quatro passos para fazer porcaria. Tropecei e caí de caras no chão, o pior é que estava a chover, então caí em cima de uma grande poça de lama. Estava agora todo sujo, toda a minha roupa, a minha mala e inclusive o dossiê estavam agora cobertos daquela pasta castanha.

Dei um longo suspiro de desespero, pois se o meu objectivo era não dar nas vistas, já tinha arruinado a missão antes mesmo de começar. Tentei tirar a maior parte da lama das minhas coisas antes que alguém me visse neste estado, mas tarde de mais.

Não sabia bem onde, mas algures eu conseguia sentir um par de olhos a olhar para mim, e depois de uns trinta segundos á procura deles lá os achei, atrás de umas caixas de madeira avermelhada encostadas a um dos grandes edifícios que faziam parte da imagem de marca da Facção. Mal desviei o olhar da caixa e me voltei a concentrar nas minhas roupas o corpo que sustentava os olhos movei-se e veio ao meu encontro.

Era uma rapariga, talvez um pouco mais nova que eu. Pequena, com longos cabelos louros e usava um vestido simples de cor creme. Tinha uma expressão ligeiramente triste nos seus olhos azuis, mas erguia um sorriso confiante. Em menos de nada dirigia-me palavras:

- Parece-me que precisas de ajuda, estranho!

- Parece que sim! Não sabia que mesmo na metrópole chovia. - Afirmei um pouco confuso.

- Sim, é raro chover aqui, mas dá um charme estranho à nossa região. Pena que não tenhas conseguido ver esse lado da chuva.

- Sim, é pena.

- Tu não és daqui pois não? - Perguntou a rapariga. - Não me lembro de te ver por aqui, e acredita, eu lembrar-me-ia.

- Não, não sou. Tenho uns afazeres aqui e sinceramente não sei por onde começar. - E não sabia, pelo menos não agora.

Agora, sendo que a loura deu conta da minha presença, era difícil escapar dela. Talvez até fazê-lo fosse pior, podia ela denunciar-me instantaneamente. Quase como se lesse os meus pensamentos, a rapariga falou:

- Não te preocupes, eu não te vou denunciar. Aliás, até te ofereço a minha ajuda para os teus afazeres. Tens é de vir comigo mudar de roupa, senão não te vou conseguir proteger.

Aceitei a ajuda e fui então com ela, guiou-me pelo que parecia ser um labirinto interminável. Em menos de nada chegámos até á casa dela. Estranhamente era a única casa desta rua que se encontrava um pouco afastada de todas as outras. Além disso também tinha uma cor diferente, em vez das fachadas em preto tinha-as em bege.

Por dentro a sua casa era visivelmente humilde. Pouca decoração, pouca iluminação e ainda menos espaço para se mexer. Logo na entrada era possível ver a cozinha, a sala de estar e o que parece ser um corredor, escondido por dois cortinados, um azul e um branco.

- Entra, põe-te à vontade. Eu já volto. - E percorreu o caminho até ao corredor, desaparecendo.

Quando perdi a rapariga de vista pude então observar que a maioria dos têxteis nesta casa tinham um tom azulado. Os poucos móveis que tinha eram avermelhados, tal como as caixas onde a encontrei no início. Provavelmente vivia sozinha mas não o fazia à muito tempo, sabia disto porque conseguia ver umas calças de homem. Não que ela não as pudesse usar, mas não acredito que o fizesse.

Só passado alguns minutos é que dei conta dela á minha frente. Tinha uma das suas mãos encostadas ao meu peito, cheias de roupa.

- Eu tinha um irmão. Ele morreu o ano passado - Afirmou ela. - Nunca cheguei a deitar as roupas dele fora, portanto se quiseres podes usá-las. A minha casa de banho é a terceira porta á esquerda no corredor, sente-se à vontade para te arranjares.

- Obrigada...

- Maggie, o meu nome é Maggie Denver.

Agradeci mais uma vez e fui me trocar. As roupas que Maggie me deu até eram bastante giras, uma camisa de flanela bordô e umas calças azuis-escuras. Tomei banho, vesti-as e saí. Demorei no total uma coisa de meia hora.

Quando voltei já a minha nova amiga estava deitada no seu sofá. Não parecia estar a dormir, mas também não parecia estar acordada, fiquei então confuso sobre se devia acordá-la ou deixá-la estar. Mas mal eu cheguei perto dela levantou-se. Olhou para mim umas duas ou três vezes, ergueu um sorriso tímido, corou e disse:

- Sinceramente não se ficas mais giro com ou sem lama! - E começou a rir. Fazendo-me rir também. - Sabes, enquanto estavas a tomar banho dei conta de que ainda não sei o teu nome.

- O meu nome é Phael. - Respondi um pouco nervoso. - Sou de Touro.

- E o que é que alguém de tão longe veio fazer a Gémeos?

- É uma longa história. - Respondi, tentando evitar o assunto.

- Não te preocupes, se tu tiveres tempo para contar, eu também tenho para ouvir!

Em parte estava com medo que ela me denunciasse depois de ouvir a história, mas por outro lado algo me dizia que podia confiar nela. Comecei então a contar a minha história.

- Eu...

A Guerra do ZodíacoOnde histórias criam vida. Descubra agora