É um lugar bastante amplo, costumava ser cheio de barracas e pessoas comprando e vendendo todo tipo de mercadoria, os portões sempre abertos recebendo mais e mais pessoas. Em datas comemorativas faziam festas que lotavam o ambiente. Mas durante a Grande Mudança não foi festa que levou as pessoas alí. A diversão foi substituída pela tristeza de ter que deixar tudo pra trás, a música por choros, conversas tristes e palavras de ordem das forças armadas. As barracas serviam agora de abrigo e os portões, de proteção contra as Coisas. Quem tinha carro fugiu, quem não, ou se recusou a sair ou esperou alí ajuda do governo. Entretanto naquele dia algo deu errado, e antes da ajuda chegar tudo se resumia a corpos e destruição. Aqueles que se recusaram a sair da cidade usaram o galpão como depósito de lixo. E mais tarde o último sobrevivente manteria as Coisas presas alí.
E lá está agora passando pelo buraco da parede. Cai deitado e ao se dar conta da situação arrasta-se rapidamente, encostando-se na parede. Acende o lampião e prepara a besta. Levanta-se e lentamente caminha, buscando entender onde exatamente está. O buraco deu para um banheiro que já devia estar sujo quando tudo aconteceu. É grande com algumas privadas e pias, feito para atender muita gente. Procura então o menino. Checa de bloco em bloco, sem abrir as portas para não fazer ruído. Chama-o em sussurros, diz que ali é perigoso e tem que sair rápido, mas nada responde. O banheiro está vazio. O pequeno saiu.
A chama do lampião não é o suficiente para afastar os Perigos, mas é o bastante para alertá-los e irritá-los. Abandona o instrumento aceso no banheiro para que não se perca e segue a busca adentrando na escuridão. Logo após a saída, entulhos das mais variadas sucatas fazem dois montes que formam um corredor que parece se estender para além da vista. Andando cautelosamente, sussurra ao menino. A luz deixada para trás atinge fracamente o ambiente, permitindo a visualização da silhuetas dos entulhos. O odor é insuportável. À medida que avança menor é sua visão de algo.
Já sem estímulo visual algum, quieta-se para se guiar pela audição. Tenta ouvir algo que revele o paradeiro do menino. Toda a sucata range como o alertando do perigo, mas nenhum sinal dele. Ao tatear em volta, descobre que o corredor se tornou um túnel. A temperatura baixa de repente, tudo se torna gelado e sua roupa não é mais útil em aquecer. Avança contra o frio. Já está perdendo as esperanças, pensa voltar logo, antes que algo ruim aconteça com ele.
Já estava certo de que era tarde demais para a criança quando escuta um grito infantil que lhe puxou pra frente correndo em direção ao berro. Trombando e tropeçando no lixo ao redor desequilibra e dá de cabeça no chão. Fica inconsciente quase instantaneamente.
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MATHEUS
Mystery / ThrillerSozinho e assombrado por um passado nebuloso, Matheus sobrevive dos restos de uma cidade abandonada. Enfrentando seus medos mais intensos e segredos mais obscuros.