Jéssica, Um Desenho

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Fez tantos planos naquela tarde de sábado. Porém nenhum deles o seduziu.
Pegou o material de desenho na sua pastinha azul e saiu em busca de uma cadeira e um café.
Pensou num shopping. Sem motivo subiu algumas escadas e encontrou uma loja de conveniência.
Na fachada estava escrito – café expresso. Pronto. Era só se sentar.
Acomodou-se no lugar mais escondido do lugar.
Abriu a pasta e começou a tirar o material de desenho.
Escolheu a referência e fez os primeiros traços. Desenho em preto em branco. Um passarinho olhando a chuva por de trás do vidro.
O vento gelado daquele dia cinza o fez levantar e entrar na loja de conveniência .
- oi, estou procurando um café expresso – disse ele à moça do balcão.
- está ali embaixo a máquina. Já levo pro senhor. – e o presenteou com um sorriso.
Lá voltou ele pro passarinho.
Escutou lá longe – ué, cadê o rapaz do café?
Serei eu, pensou ele pulando da pilastra e dizendo – estou aqui.
- ah, que susto, pensei que o senhor tivesse ido embora.
-imagina, cafés são iguais os sonhos, a gente nunca deve desistir.
Ela sorriu e pareceu rodopiar naquele vestido comprido que a fazia ainda mais leve.
Desenhou, rabiscou, sentiu sede. Foi lá comprar água e acertar o café.
- oi, vim pagar o café. – disse ele à moça de sorriso que se abria como cortina deixando o sol entrar.
- o senhor estava escondido ali, nem o vi.
- estava brincando de onde está wally.
Como a piada não fazia parte da cronologia da moça, ela disse – ah, wall-e aquele robozinho. Adoro esse filme. Vou até assistir de novo.
- eu também, tão bonitinho ele tentando achar vida no lixo.
- sim! Não gosto de filme de romance, mas adoro animação. Filme de romance só ilude as mulheres.
Ele pensou como poderia alguém não ser doce e dedicado a uma mulher como ela. Mas acordou dos pensamentos enquanto ela falava sobre doçuras da existência. Enquanto ela falava os olhos narravam todas emoções. Brilhavam, molhavam, era uma enciclopédia de sentimentos.
Chegaram clientes e ele disse - já já a gente fala mais e voltou pra mesa.
O material esparramado, o desenho inacabado atraíram a atenção. Depois de alguns minutos, lá veio ela. Timida, leve, de mansinho.
- não ia comentar mas seu desenho está muito bonito .
- muito obrigado!
É lá se foi a conversa fluindo e flutuando.
Entre um cliente e outro ela perguntou se ele fazia caricatura.
Cheio de duplas intenções ele disse que sim. Duplas intenções porque se fizesse o desenho da moça poderia olha–la por mais tempo. Admirar melhor aquela personalidade tão delicada e rústica.
    Enquanto a desenhava e namorava cada expressão dela, ele disse – o que mais gostei em você, é que você não faz a sobrancelha. Tudo em você é natural. De uma beleza com personalidade.
Ela sorriu e agradeceu.
Um dos clientes que observavam a cena disse – desprende o cabelo.
Ela disse – prendi pq não deu tempo pra pentear.
Mas mesmo assim o soltou. O pobre desenhista ficou em estado de choque.

Perdeu o rumo. O corpo amoleceu. Faltou-lhe o ar. Aquela cena revelava uma mulher ainda mais linda.
A mão já não mais desenhava sob um comando do cérebro. O olhar não descolou mais dela.
Não se sabe como terminou o desenho.
    Entregou a ela. Ficou ainda mais linda olhando a si mesma no papel. Feliz ela disse – vou enquadrar. Muito, muito obrigado.
Fechou a maleta azul, voltou pra casa.Reviveu e esboçou aquela noite outras vezes. Inspiração única desenhada em detalhes, num dia que se tornou uma obra prima na vida dele.

Nem todas doenças são crônicasOnde histórias criam vida. Descubra agora