Um amigo quase Homem

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       Paulo Onofre sempre fora apaixonado por ela. Um sempre tão antigo.
Talvez já esperasse por ela, mesmo antes daquele primeiro oi, que aconteceu durante a seleção de estagiários para sua empresa. Um oi acompanhado de um sorriso.
Como não poderia deixar de ser, ela fez-se estagiária.
Estagiária à primeira vista.
Assim, Paulo Onofre teve a chance de incluí-la em sua rotina. Ela e ele. O diretor e a estagiária.
Não pensem que Paulo Onofre era alguma espécie de calhorda. Não. Um pouco inexperiente apesar dos trinta anos, mas o que havia sentido por ela era sincero. Claro que algo novo é fácil de ser sentido quando não se tem histórias. Mas, não vamos menosprezar os sentimentos dele por isso.
A rotina fez com que eles ganhassem intimidade. Não entendam mal. Essa intimidade tinha formato de amizade. E o desejo conformado e reprimido de Paulo Onofre respeitava essa camaradagem. Nessa posição, ele assistiu todas as vivências, aventuras e acontecimentos da vida dela, como se estivesse num camarote observando todas  dramas e alegrias dela.
Dádiva e infortúnio da amizade, pensava. Afinal, não é fácil estar perto e não poder tocar. Ouvir horas sobre a vida dela, e não estar em nenhuma história. Conhecer as datas do ciclo menstrual e não poder beijá-la.
Porém, bravamente suportava, e covardemente alimentava a espera de tê-la como mulher.
Para seu desespero aquela menina namorava de acordo com sua idade - muito.
E sempre que se frustrava e o romance se desfazia, o ombro de Paulo Onofre era o aconchego e o consolo.
Bem feito, porque ele sempre estava disponível e paciente. Muito compreensivo.
Em meia hora de conversa, a convencia de que um dia alguém a conquistaria e faria por merecer seus desejos e planos. E nesse momento, Paulo Onofre gemia enquanto secava as lágrimas dela: Sou eu! Droga! Sou eu!
Com tantos namoros desfeitos, casos mal acabados, a indignação da menina veio à tona.
Estava desencantada com os homens. Perguntava a Paulo Onofre o que estaria acontecendo com eles.
E ele, muito delicado, explicava. Horas e horas pregando o encontro com um homem exceção: Maduro e sensível.
Numa dessas explanações, ele foi interrompido por um comentário que chacoalhou e espremeu seu coração amordaçado.
— Sabe... Quero encontrar um homem como você.
— Hã? Como? Nossa! – respondeu de surpresa Paulo Onofre tentando acreditar no que ouvia.
— Pois é, ele precisa ser: compreensivo; gentil; doce; companheiro; atencioso; delicado; sensível; e que me respeite. Mas sem ser você – Essa última frase foi acompanhada por um tapinha na mão de Paulo Onofre.
— Como assim sem ser eu?
— É... Você tem todas as qualidades, mas é meu amiguinho!
— Hum... Vou tentar entender. Quer dizer que eu sou perfeito para você, o único defeito é que eu sou eu.
— Isso mesmo!!! Está vendo porque te adoro tanto? Você me entende! Eu só procuro alguém que seja você sem ser você.
— Então se um dia eu me apaixonasse por você – ele não sabia mentir – você não ficaria comigo, apesar de achar que sou perfeito para você.
— Isso! Isso! Vamos supor, se eu namorasse você, já não teria mais você para falar sobre você. Você sendo meu namorado, não poderia ser meu amigo para me aconselhar. E como poderia viver assim?
— Hum, que interessante! Mas aposto que se você namorasse um cara como eu, você não precisaria de mim.
— Ai... Você não pode se sentir tão substituível! Claro que precisaria de você! Não precisa se achar insignificante! Você sempre será o homem que sonhei, até encontrá-lo...
— Que beleza! Nossa... Tenho certeza que seus namorados me invejavam! – Paulo Onofre esboça sarcasmo.
— Nossa é verdade! Como você sabe? Eles queriam ser você, sem ser você! Por exemplo, o Décio, toda vez que me abraçava, me beijava, transava comigo, dizia que te invejava porque sabia que deveria ser um pouco você, até dizia que se você não fosse você, suspeitaria de nós dois. Na verdade isso era charminho, porque ele sabia que nunca ficaria com você.
Paulo Onofre tinha entendido. Olhou-se no espelho como se encarasse o pior inimigo.
Voltou ao assunto.
— Mas você e o Décio se davam tão bem. Por que acabaram? Eu não entendo até hoje! – Disse Paulo Onofre tentando magoá-la.
— Sabe o que é? Depois de um tempo nos tornamos amigos demais. Ele se transformou em você sem ser você, no mal sentido, é claro. Então, depois que acabamos, nem a amizade restou. Mas o estranho é que o tesão continua...
— Tudo bem... chega! Eu não sou seu pai, nem sua amiga, nem seu irmão. Droga!
Eu sou homem e quero transar, trepar e te comer há anos!
Como resposta teve seu braço agarrado. Ela pediu que olhasse para ela:
— Ei, ei espere, o que aconteceu? Você nem parece você. Eu não quero te perder! Você está diferente, me bate?
Paulo Onofre com raiva e tesão a pegou de jeito. Transaram alucinadamente na recepção da empresa.
Exausta, ela jogou o corpo na cadeira giratória. E ficou rodando com os pés soltos no ar.
Disse ofegante:
— Parabéns você foi promovido. Com um sexo desses, quem tem problemas? Quem precisa de amigo?

Nem todas doenças são crônicasOnde histórias criam vida. Descubra agora