Trilhas do destino

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Uma bela dama. Cabelos negros. Olhos mais negros ainda.

E o brilho parecia ainda mais forte com aquela íris com complexo de pupila.

Essa linda mulher morava num trem. Tinha lá sua cama. Sua rotina.

Tinha suas estações, seus embarques, seus desembarques.

Adorava morar nesse trem, sentia-se feliz lá. Conhecia cada vagão. Cada caminho que ele fazia. Conhecia até o barulho das rodas nos trilhos. A hora da chegada e a hora da partida, mas sempre se perguntava: até onde ele poderia levá-la?

Essa era a sua vida. Passar por inúmeros lugares sem sair do seu abrigo.

Numa comum manhã abriram uma nova linha naquela estação.

A linda dama correu até a janela. Viu o novo trem. Não soube muito bem o porquê, mas quis embarcar nele.

Então, toda manhã ao acordar olhava pela janela do seu vagão só para verificar se o outro trem estava parado por ali. Segurou a vontade de visitá-lo. Uma, duas, três, vinte vezes.

Ficava na janela imaginando para onde ele ia. Imaginava o itinerário dele. Os horizontes, as paisagens, as pontes, seus caminhos.

Era madrugada quando ela vestiu seu capuz. Pôs a cabeça camuflada pela porta e verificou se tinha alguma alma viva por lá. Sentiu a brisa gelada, ouviu os gafanhotos, e o estalar dos fios que conduziam corrente elétrica.

Do outro lado da estação aquele trem. Sim, o trem que a fazia sonhar.

Respirou fundo. Tomou coragem. Abaixou o gorro e correu. Atravessou voando a linha férrea. Num salto pulou para o outro trem.

Seus olhos negros iluminaram as paredes. Era tudo novo. Era tudo encantador. Era tudo conhecido.

Intrigada bisbilhotou cada cantinho. Cada vagão. Encantou-se.

Quis morar ali para sempre.

De repente o trem ligou seus motores. E naquele momento teve a oportunidade de sair do trem, ou permanecer nele para ver até onde ele poderia levá-la.

O pânico se instalou na menina. Pensava: Deus, onde eu me meti!

Se eu ficar aqui, posso conhecer e viver tudo que sonhei na vida. Se eu voltar para meu vagão, vou viver no conforto que já conheço para o resto da vida.

Foram os cinco segundos mais importantes, decisivos. Mais apreensivos e mais eufóricos.

E assim, o trem que a veio buscar, partiu. Num caminho lindo. Mágico. O itinerário chamado destino.

E ela, na janela do seu vagão, entre soluços e suspiros deu adeus.

Nem todas doenças são crônicasOnde histórias criam vida. Descubra agora