O Motim Anarquista

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 As motos faziam um círculo para os dois lutadores em seu centro. A multidão de músculos urrava sob suas jaquetas de couro e bandanas ao estilo Axl Rose. Alguns buzinavam suas motos enquanto caixas de som faziam Thunderstruck tocar bem alto naquele beco parisiense. 

No centro, quase ofuscado pelos faróis das motos, o brutamonte de dois metros fitava a garota que aparentava não chegar aos vinte anos de idade. Ele estava sem camisa, exibindo os músculos pálidos. Trajava uma calça jeans rasgada e botas de couro. Seu cabelo era uma miríade de espinhos verdes na cabeça angulada. Ele apontou o dedo para a rival.

— Há décadas nossa gangue aproveita tudo o que o gado pode oferecer, inclusive suas fêmeas! — A voz trovejou, respingando saliva no ar. — Aí vem essa garota, depõe nosso líder e acha que pode mudar nossos costumes! Nós somos Brujahs! Nosso único dever é com a causa! O resto que se foda! — Vários motoqueiros berraram em aprovação. As poucas garotas que os acompanhavam ferviam um silêncio azedo nos olhos.

A adolescente à sua frente manteve os braços cruzados, queixo erguido. Ela trajava uma jaqueta de couro sobre uma camiseta branca com o símbolo do Anarquismo e coturnos de montanhista.

— Essa sua causa é deturpada, Calix! — ela vociferou, seu cabelo extremamente curto resplandecendo a cor índigo. — Nosso clã luta por um mundo melhor, pela queda do velho, pela ascensão da liberdade! Que mundo é esse que você quer onde se pode estuprar qualquer mortal assim, a esmo? — Ela cuspiu no chão. O projétil de saliva atingiu o cimento com tanta força que o local rachou como se tivesse sido atingido por uma bala. — Eu me oponho à sua causa! Derrotei seu líder em combate justo e agora ou você me obedece... ou vem pro pau!

— Mata, Calix! — a multidão torcia. — Arranca os caninos da vadia!

— Mostra pra ele, Aica! — outros esbravejaram. — Chuta as bolas dele!

Em velocidade sobre-humana, o sujeito correu para Aica. Deu um pulo de vinte metros que trincou o chão em direção a uma parede de um dos prédios do beco. Ali, se impulsionou contra a jovem como uma bala de canhão, deixando um buraco de tijolos, poeira e viga retorcida para trás.

 Ele vinha sedento, seu punho direito em riste, uma lança de músculos rochosos voando desenfreados. A nova líder dos Brujah ainda olhava para o local onde ele estava, como se não tivesse acompanhado a velocidade de seus movimentos. O punho de Calix estava a cinquenta centímetros de Aica quando ela olhou para ele, os lábios sorrindo, fechados em escárnio.

O sujeito de cabelo verde não conseguiu acompanhar os fatos que se desencadearam nos milésimos de segundos seguintes. O mundo de Aica se tornou absurdamente lento. As gotas de saliva dos gritos da multidão caíam vagarosas no ar. As ondas sonoras de AC/DC vibravam distorcidas, quase indistinguíveis. Nesse estado de lentidão, só Aica se movia normalmente. Ela agarrou o pulso direito de Calix, rodopiou com ele no ar para aproveitar o impulso gravitacional e o martelou contra o chão.

Explosão. A maioria dos Brujahs nem se moveu quando as pedras de cimento estouraram em suas caras — era como se tivessem batido em metal bruto. Alguns usaram a disciplina Rapidez para desviar das pedras, outros ainda coletaram algumas e jogaram uns contra os outros.

 Algumas brigas começaram ao redor do círculo de motos, enquanto a poeira erguia-se da cratera lá no centro. Brian Johnson continuou cantando quando Aica torceu o braço do gigante até que a carne rodopiasse, rasgando a pele, despedaçando as fibras dos músculos e triturando a junta dos ossos.

O braço de Calix voou para o alto, o sangue jorrou em esguichos volumosos ao som de gritos horrendos. A jovem de olhos azuis manteve a expressão séria, sem se afetar pela pancadaria ao redor ou pelos urros de dor do rival. Calix gritou por quase um minuto até que seu olhos ficaram totalmente negros. A Besta agora tomava conta dele.

A garota de cabelo índigo viu seu oponente desaparecer no chão, diante de seus olhos. Foi então que ouviu metal se retorcendo à sua esquerda. O Brujah estava erguendo uma moto com seu braço esquerdo e outra com a força de sua mandíbula. Quando a vampira deu por si, uma Harley Davidson estava voando em sua direção.

 Sem hesitar, Aica desceu seu punho sobre a moto com a mão espalmada e reta. Uma fenda se abriu no metal como se fosse plástico barato. Tubos, graxa, correntes, tanque, gasolina, tudo se dividiu ao meio e se deslocou pelas laterais da garota.

Sem aviso, a outra moto atingiu Aica pelas costas, explodindo uma tonelada metálica em sua espinha. Ela foi lançada para o alto como se tivesse sido disparada por uma pistola; subiu transversal, perfurando as paredes do prédio do beco. Ela passou por vigas, tijolos, canos, cortinas, móveis, uma mesa de jantar com uma família comendo e por uma cama de casal. 

Sua trajetória cortou a velhinha ao meio, destruindo sua coluna, costelas, espalhando suas tripas na cara do marido que acordou desesperado. Gritos ecoaram pelo prédio, seguidos de vazamentos de água e incêndios. Ela ultrapassou o teto com um estouro e enfim chegou ao terraço, onde a gravidade diminuiu e ela pôde cair por ali.

A garota se levantou em um pulo. Parecia quase ilesa, não fosse a sujeira e suas roupas todas em farrapos. Estava imersa no sangue da velhinha, pedaços do fígado ainda despencavam de seu cabelo. Na mesma velocidade inimaginável, o brutamonte sem um braço pareceu se teletransportar na frente dela. Ele bufava e babava enquanto os cabelos ondulavam, o suor saindo aos litros de seu corpo, junto com o rio de sangue do membro faltante. Aica sorriu.

— Achei que sua Besta fosse mais forte, Calix. Você bate como um garoto.

Lá embaixo, a porrada rolava solta entre os Brujahs. Eles batiam uns nos outros sorrindo, competindo para ver quem urrava de dor primeiro ou quem conseguia arrancar o olho do outro mais rápido. Homens e mulheres se digladiavam, mordiam, enxaguavam de sangue e satisfação. 

Mal perceberam quando o som de um trovão surgiu no centro do círculo de motocicletas. Thunderstruck não tinha terminado de tocar quando Aica apareceu segurando a cabeça de Calix. Uma chuva escarlate caiu alguns segundos depois. Junto com ela, vários pedaços de carne branca, fatiados em tiras de músculos, tripas, miolos e órgãos genitais.

— Quem é o próximo?!! — ela berrou com tamanha imponência que todos pararam de brigar. — Mais alguém desafia minha liderança nessa gangue?! Se assim for, pode vir! — A vampira cuspiu no chão outra vez.

Alguém que Aica não havia notado até então começou a bater palmas atrás dela. Era um sujeito que sorria sob o capuz de uma jaqueta verde escuro.


                                              ***

Palavra do Autor:

Hey, sanguessugas literários! Se estiverem curtindo a história, não esqueçam de deixar seu voto! Ademais, tenho uma pergunta: algum de vocês que estão lendo conhecem Vampiro: A Máscara? Já jogaram esse RPG? Comente aqui embaixo que eu quero saber!

🦇 Vampiro A Máscara 🦇 O Despertar de Caim 💀Onde histórias criam vida. Descubra agora