Capítulo 4 | Adultos

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O domingo chegou com a luz do sol infiltrando-se pelas janelas abertas do quarto. Um raio bateu contra o rosto dela, fazendo seus fios loiros se tornarem fios dourados. Eram oito horas da manhã, segundo o despertador e Jaíne jogou as cobertas para o lado bocejando.

Domingo era dia de Escola Bíblica Dominical. Seus pais já deveriam estar prontos a essa altura, por isso tomou um banho rápido.

A igreja não era longe e Jaíne realmente gostava de frequentá-la. Eles se sentaram nos mesmo lugares de sempre, no canto direito da nave da igreja e diversos vizinhos cumprimentaram seus pais com acenos de mãos. Jaíne reconhecia muita gente do seu bairro.

A igreja tinha acabado de ser reformada, então as poltronas agora eram azuis confortáveis, as paredes bege claras e o altar agora em madeira elegante.

Jaíne não era religiosa, mas gostava do pastor daquela igreja, de assistir o coral a cantar afinadamente como se fosse um concerto sinfônico, e eles cantavam uma música nova todos os domingos. Ela gostava principalmente da paz que preenchia seu coração todas as vezes que estava lá. Era algo que não deixava transparecer demais para os pais, pois se eles soubessem a inscreveria para o grupo de jovens. Os jovens eram um grupo fechado de pessoas da mesma idade que Jaíne, só que com um calendário de eventos apertadíssimos no bolso. Eles até faziam coisas legais, como ir jogar paintball e boliche, além de eventos sociais aos mais carentes que enchiam o coração dela de esperança, porém Jaíne trabalhava de segunda a sábado, e só tinha os domingos livres. Quando chegava, ela simplesmente tomava banho no automático e apagava na cama.

O líder e pastor da igreja local era um senhor jovem, curitibano, com os cabelos escuros espetados por gel, porém mesmo com sua aparência contemporânea, ele esbanjava sabedoria em cada palavra que saía de sua boca, além de contar piadas hilárias a respeito da fé e de coisas cotidianas. Ele era um pastor muito fora do comum e sempre os fazia rir e chorar ao mesmo tempo.

Quando um casal conhecido com uma criança pequena, passaram pelo corredor e se sentaram bem na sua frente, Jaíne sentiu vontade de vomitar e toda a paz alcançada fora lançada no lixo.

A única coisa ruim de frequentar a igreja do seus pais era o fato do diretor da Seventeen ir frequentemente com a esposa e a filha. Vê-lo ali, ao lado da família, sentado inocentemente na cadeira da igreja, era simplesmente impossível de aceitar. Como um homem desses consegue fingir tão bem? pensou. Ele sorria alegremente para filha, conforme o coral cantava uma música animada.

Sabia que estava sendo preconceituosa, mas cada vez que a mulher dele se recostava nele, Jaíne queria se erguer e gritar com ela. Contar-lhe tudo. Contar o quanto duas caras era o marido dela. Porém, Jaíne não tinha direito de destruir uma família. Sem contar que eles mal se conheciam. A esposa dele era uma pessoa reservada e normalmente só falava com poucas pessoas. Secretamente, orava para que a verdade viesse à tona logo.

Hoje às palavras do pastor não fizeram efeito sob Jaíne, então ela suspirou aliviada quando o culto finalmente acabou. Tal foi seu alívio, que foi a primeira a se levantar e ir ao banheiro.

Quando saiu, seus pais a aguardavam juntamente com uma outra família.

— Jaíne, vem aqui. Quero apresentar alguns amigos nossos — sua mãe disse assim que a viu.

Aprumando o vestido, Jaíne observou o casal de senhores, o jovem e uma menina de talvez uns sete anos.

— Estes aqui sãos os Caios. Janete faz bolos como ninguém — apontou para a senhora Caio, com cabelos lisos, escorridos e pretos para trás, revelando um rosto com pele de bebê apesar da idade.

Ela riu sem graça, abanando a mão no ar.

Seu pai se mexeu para o lado do Sr. Caio.

— Jonatha, conhece a minha filha? — Seu pai tinha uma das mãos no ombro dele, apontando na sua direção — Filha, o Jonatha trabalha comigo na Avenida Kennedy. Ele possui uma loja de livros do outro lado da calçada.

Jaíne sorriu, agradavelmente surpresa.

—Prazer em conhecê-lo, Sr Caio. Eu me chamo Jaíne e amo ler, talvez eu faça algumas aquisições na sua loja, da próxima vez que passar no meu pai.. — Jaíne disse para ele, estendendo a mão educadamente para a esposa — Prazer senhora Caio.

— O prazer é minha querida — senhora Caio disse, seu rosto aberto e receptivo — Quero que conheça meus filhos: Sebastian e Valentina.

— Olá — Jaíne sorriu para ambos.

Valentina era mais alta que o normal para sua idade e vestia um lindo vestido florido. Ela tinha pintas no nariz e parecia ser uma menina adorável.

— Oi — ela disse e sorriu tímida.

— E aí? — Falou como cumprimento o irmão mais velho.

Sebastian era a versão masculina do pai, ombros largos, cabelos loiros penteados por gel para o lado num topete, e suas feições joviais caiam mais certas que a feição cansada e marcada do senhor Caio.

Sua mãe piscou para eles e bateu palmas.

— Vocês terão tempo para se conhecer melhor. Convidamos os Caio's para almoçar conosco — ela disse.

E foi assim que Jaíne acabou na enorme mesa de jantar, bem ao lado do Sebastian. Ele era do tipo calado e educado, expõe sua opinião quando necessário, mas não incluía um assunto novo.

Viu sua mãe fitá-los com os olhos risonhos, cheios de uma esperança boba. Jaíne revirou os olhos, segurando com força o garfo.

— Por que será que depois dos vinte e tantos anos, o nossos pais querem nos empurrar para todo mundo?

Jaíne olhou de esguelha a voz dos seus pensamentos serem formuladas por Sebastian. Ele estava bebendo refrigerante, o rosto contorcido em uma careta esquisita.

Jaíne riu diante da honestidade dele.

— Faço minha as suas palavras. Eu tenho vinte e cinco. E você?

— Vinte e seis. Não deveríamos ser tratados como adultos então? Já que obviamente somos um?

Seus olhos facilmente se enrugaram quando ela deu um sorriso suave, mas aliviado para Sebastian.

— Que bom que pensa assim, pois no momento minha mãe está pensando que você seria um ótimo genro.

Sebastian fez outra careta, fazendo com que Jaíne risse mais.

— Devo dizer o mesmo de minha mãe a você.

Jaíne fiscalizou discretamente a senhora Caio, e a encontrou dando risadinhas com a sua mãe. Conteve sua vontade de rolar seus olhos, e devolveu o sorriso a elas.

O almoço foi bem mais leve a partir daí, pois Jaíne soube que Sebastian parecia tão desconfortável quanto ela com a atenção.

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