Capítulo XVII

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I’m off the deep end, watch as I dive in
I’ll never meet the ground
Crash through the surface
Where they can’t hurt us
We’re far from the shallow now
[Estou a beira do precipício, veja enquanto eu mergulho
Nunca irei conhecer o chão
Caio através da água
Onde eles não podem nos machucar
Agora estamos longe da superfície]

(Shallow — Lady Gaga feat. Bradley Cooper)

— Muito bem, fico feliz com sua decisão. — Disse Safira se levantando.

Eu ainda estava confusa.

— Certo, mas o que eu faço agora, já que nem consigo controlar minhas asas?

— Vamos. — Ela respondeu abrindo a porta da sala. — Vou lhe explicar algumas coisas.

Voltamos ao grande espaço onde todos os outros ficavam e começamos a andar pelas passarelas.

— Eu criei esse lugar aqui para que fosse possível nascer uma resistência contra a ilha. — Safira voltou a falar. — Aqui eu pude desenvolver muitas coisas, como a poção que você tomou para respirar embaixo da água. — Ela fez uma pausa enquanto descíamos uma escada. — Mas uma das principais coisas foi a invocação. — Safira abriu uma nova porta na parede do bunker, porém essa, diferente das outras, não ficava no meio da parede ligada a uma passarela, mas sim no chão do lugar. — Eu posso te fazer uma oferta: eu posso invocar a sua habilidade que você vai desenvolver no futuro, assim você não terá que treinar para tê-las, só para mantê-las. No entanto, você precisa saber que isso dói, pois cria um grande loop no tempo: você só tem a habilidade no futuro porque tem a do presente que você adquiriu pegando a do futuro que é provinda do seu passado que você pegou do futuro... — Ela interrompeu o ciclo sem fim. — Lidar com isso é muito difícil. Por isso é necessário ter um controle mental muito grande... — Ela parou de falar novamente deixando que meus pensamentos fluíssem. Sendo assim, a decisão é sua.

— Outras pessoas já fizeram isso? — Perguntei hesitante.

— Sim.

— E?

— Eu já fiz isso com três pessoas.

— E o que aconteceu com elas?

— Uma não aguentou outra desistiu e a outra o fez com sucesso.

— O que aconteceu com a primeira?

— Ela não aguentou o peso da interpretação do tempo... — Safira falava calma como se memórias infelizes lhe voltassem a mente. — Ela enlouqueceu... No fim, perdeu qualquer resquício de sanidade poucos dias depois.

Eu sentia um desconforto, mas ele estava unido a uma necessidade de saber tudo o que já acontecera.

— E a segunda?

— Ela desistiu no meio do processo. — Sua voz tinha um leve tom de culpa misturado com raiva. — O que fez com que nunca tivesse as habilidades que teria se não o tivesse feito.

Anotação mental: Não desistir.

— E a terceira?

— Está olhando para ela.

Fiquei novamente confusa.

— Aplicou em você mesma?

— Sim. — Sua resposta fora simples e rápida.

— Para? — Perguntei já com a cabeça doendo.

— Para poder aplicar em outros.

— Como assim?

— Eu invoquei meu poder de invocação.

Certo... Não vamos mais perguntar.

Se fizermos poderá dar muito errado... Mas se tiverem que esperar até que eu aprenda tudo necessário... Vai demorar muito tempo... Eu tenho que voltar para casa...

— Ótimo, vamos fazer isso.

— Muito bem. — Disse fechando a porta. — Será mais rápido do que você imagina. — Ela me conduziu até o centro da sala de formato cilíndrico. — Cruze as pernas e mantenha a coluna ereta. — Ela se afastou para ficar em pé de frente para min enquanto eu a obedecia. — Agora, feche os olhos e respire fundo...

Vi a escuridão provocada pelas minhas pálpebras e senti o ar entrar e sair dos meus pulmões.

Não ouvi mais nada por longos segundos e me perguntei se Safira ainda estava ali. Quando estava prestes a abrir os olhos, senti uma coisa estranha dentro de mim, como se houvesse muita dor sem ela existir.

Uma imagem apareceu na minha mente. Vi a eu mesma atirando de distâncias longínquas e acertando no centro de alvos muito pequenos. Dessa forma, imagens semelhantes também apareceram e sumiram.

Em seguida, me assisti voando alto sobre colinas e desviando de percursos bem elaborados. Do mesmo modo que antes, mais imagens começaram a aparecer e desaparecer cada vez mais rápido.

As imagens dos dois tipos se mostravam cada vez por menos tempo e, fui percebendo aos poucos, eu me vi envelhecendo com tais habilidades.

Naquele momento, eu via uma versão muito mais velha minha voando sozinha. Assistindo a cena, senti uma dor na boca do estômago e, dessa vez, ela existia.

Quando a dor já era insuportável, senti uma voz dentro de mim que me lembrava repetindo: Controle mental... Controle mental...

Via muitas imagens. Ouvia muitas vozes. Sentia muita dor.

Apenas se deixe levar... Solte sua mente...

Sucumbi a essa intuição e repentinamente todas as coisas pararam. Eu não via mais imagens. Não ouvia mais vozes. Não sentia mais dor.

Abri meus olhos muito lentamente e, após o tempo que levou para meus olhos se ajustarem, vi Safira caída ajoelhada no chão.

Me levantei e corri até ela lhe ajudando a manter-se elevada.

— O que aconteceu? — Perguntei preocupada.

— Eu não esperava por isso... — Sua voz era baixa e fraca.

— Não esperava o que? — Muitas ideias passavam pela minha mente e todas elas pareciam tão ruins quanto improváveis.

— Suas habilidades... Eu não as invoquei de seu futuro... Elas não são do seu futuro... Não são suas... São do passado... Elas... Elas são de outras fadas... De outros Akans...

A Ilha - As Crônicas dos Nianders Vol. IOnde histórias criam vida. Descubra agora