Capítulo 21 - A segunda aliança

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A segunda aliança

Três dragões jaziam estendidos um ao lado do outro sobre o campo sagrado do Vale das Montanhas Escarpadas. Cada um deles estava rodeado por folhas douradas e galhos cortados em forma de bastonetes que, por sua vez, eram circundados por um anel de pedras, grandes o suficiente para conter o fogo que logo seria ateado aos corpos. Do alto de uma rocha, Moghes observava Fadfall deitado ao centro. O pai vencera a morte inúmeras vezes e, de certa forma, o líder dos dragões esperava que ele abrisse os olhos a qualquer momento, mesmo que sua razão insistisse em tentar convencê-lo que, desta vez, ele não retornaria do mundo além vida.

- Eu não deveria tê-lo deixado ir...

- Não foi sua culpa. – Prie estava de pé sobre uma das endentações da pedra. – Ele morreu lutando bravamente e recusou o tratamento das fadas para que seus companheiros o recebessem primeiro.

- Então, ele teve a chance de se redimir. – Moghes se emocionou. – Ele desejava muito isso.

- Fadfall tinha um espírito aventureiro e imaturo, mas não era covarde. – A fada voou até o amigo e lhe tocou a face no momento em que uma lágrima fujona escapou, deixando-a bastante molhada.

- Desculpe-me. – O dragão soprou um bafo quente na amiga para secá-la. – Eu sei. Ele não nasceu para ser líder de uma aldeia. Meu pai sonhava com o mundo e se deixou seduzir por suas tentações. Fico feliz em ter feito as pazes com ele.

Os dois ficaram em silêncio. Prie sabia que naquele momento, Moghes devia estar revisitando a mente em busca de lembranças que reavivassem sua história com Fadfall. Certamente, algumas seriam boas recordações e outras nem tanto. Era visível a emoção do dragão. Os guerreiros mais valentes da aldeia haviam se colocado fora do anel de pedras, Hei Yu estava entre eles.

Moghes se lançou no ar e se posicionou acima dos companheiros abatidos, lançando uma rajada de fogo em seus corpos. Hei Yu foi até ele e repetiu o gesto, sinalizando para que os colegas os seguissem no ritual. Em instantes, as chamas se espalharam, consumindo os cadáveres em labaredas gigantes.

Prie se manteve na rocha e acompanhou o funeral lá de cima. Felizmente, nenhuma fada havia sido abatida na batalha e Wicnion respirava esperança, sob o comando de Tedros, o Salvador. Talvez fosse chegado o momento de sua espécie retornar à floresta para reconstruir a Aldeia das Fadas, mas antes de tomar qualquer decisão, ela precisaria reunir as auxiliares e também as mais antigas.

De onde estava, Prie sentia o calor da imensa fogueira abaixo dela. Os dragões esperariam o fogo se extinguir para recolherem as cinzas de seus companheiros que seriam misturadas e armazenadas para que futuras mamães pudessem aspirá-las. Eles acreditavam que as borralhas dos guerreiros dariam a seus rebentos as mesmas virtudes que eles tinham em vida. Enquanto observava as chamas amareladas bailarem suavemente, ela se perdeu em pensamentos. Desde o início, a sacerdotisa estava ciente de que o acolhimento na Aldeia dos Dragões seria provisório e, para dizer a verdade, durante muito tempo sonhou com o momento que retornariam à floresta e seriam livres novamente. Todos os dias uma fada a procurava para lhe cobrar isso, pois se sentiam ameaçadas ali. Então, um dia ninguém apareceu... e mais outro... e outro. De repente, ela percebeu que o vale havia se tornado o lar de sua espécie também.

E agora? Como seria viver fora dali? Certamente, ela sentiria muita falta de Moghes. Instintivamente, Prie direcionou seu olhar para o líder dos dragões e seu coração bateu mais rápido. No mesmo instante, ela percebeu seu rosto ruborizar. Ela o amava tanto que, sem dúvida, o correto seria ir embora. Sua espécie não possuía exemplares machos, mas formava casais. Aquelas que nasciam dotadas com a semente da reprodução, assim como Ermínea e a filha Delwyn, eram as mais desejadas como companheiras. De repente, tudo lhe pareceu tão injusto. Casais estéreis e algumas poucas fadas abençoadas pela capacidade de gerar nova vida. Uma sacerdotisa destinada ao celibato que havia se apaixonado por um dragão.

O Portal de Anaya - Livro 3 - A evoluçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora