Aquela planície pedregosa, durante a primavera, ficaria recoberta de musgo, ocasionando até a impressão de se tratar do verde de algum campo. Mas era uma ilusão, não havia grama verde e sedosa e sim o verdejante escorregadio musgo, ocultado as duras pedras. Quando o seu nome era Skymir e não carregava o título de Utgard, ali era o seu ponto de caça preferido. Os cervos abandonavam a proteção das florestas para lamber e mastigar o saboroso musgo, uma das poucas coisas a sobreviver em Jotunheim. As arvores eram altas, centenárias, folhas afiadas e frutos duros. Os animais eram escassos, sorrateiros e bestiais. Mesmo assim, Skymir era feliz e tinha orgulho de ser um Jotun. Entretanto, agora era o vermelho que pintava a planície. Vermelho do sangue de seu povo ou de seu inimigo, já não mais sabia. Quando a lâmina de uma espada corta um Asgariano ou um Jotun, independente das grandes diferenças físicas, o líquido que verte de sua ferida é igual. Rubro e quente. No final, na morte derradeira, todos eram iguais.
Andar por entre as pedras úmidas de sangue derramado não era difícil. O que era sim difícil era pisar nos corpos dos que pereceram em batalha. Não havia como evitar...Eram demasiados. A carne ainda era fresca, a podridão ainda não contamina o ar. Ainda. Contudo, sabia que na manhã seguinte, sentiria um cheiro bastante diferente. Podia ver ao longe, nas bordas da floresta, olhos amarelos, ouvia o rosnado faminto. Os Vargr, lobos gigantes, estavam a espreita. Quando a noite por fim caísse, eles sairiam e avançariam pela planície se deliciando dos corpos. Skymir não teria muito tempo, mesmo com seus quatro metros de altura, com sua longa e grossa espada, não poderia destruir uma alcateia de Vargrs, ainda mais quando, em pleno inverno, eles teriam a disposição tamanha fatura em alimento. A fome suprime a prudência. As feras irão atacar tudo e a todos.
"Talvez aquele encontro não fosse, da mesma forma, prudente" Pensou indo para uma seca de torta árvore, localizada quase no centro da planície. Mas tal como os Vargs, Skymir também tinha fome, uma fome que não seria saciada com alimento...Ele tinha fome de paz.
Abaixo da árvore, um homem estava sentado. Cabelos longos, grisalhos. Uma barba cobria a parte inferior de seu rosto. Barbas... Jotuns não tinham tanto pelos faciais. Para alguns de seu povo, tal características dos outros povos era por demais nojenta. Outra característica estranha dos povos além de Jotunheim era usar placas de metal para proteger seus corpos, a qual eles chamavam de armadura. Jotun, usavam poucas peças de roupa, um saiote que cobria suas partes intimas, às vezes, mantos de pele de animais, normalmente dos poderosos bjǫrns (ursos gigantes). Logo o manto era uma prova da habilidade do guerreiro e não uma mera peça de roupa para cobrir o seu corpo. Os outros povos sentiam frio, por isso se cobriam com tantas camadas de tecido, era o que diziam...
O homem, que detinha a cabeça apoiada em uma longa lança, levantou seu olhar e fitou o gigante que se aproximava. Skymir ainda sentia impressionado com quão penetrante era aquela mirada, apensar do homem ter apenas um único olho.
"Ele não é apenas um homem..." frisou em seu pensamento "Era um Aesir!".
– Utgard. – falou o Aesir assentindo com a cabeça.
– Rei Odin. – respondeu parando a poucos metros, ainda estava receoso em se aproximar ainda mais quando Gungnir, a lança sanguinária, conhecida por sempre acertar o seu alvo e matar o seu inimigo, estava bem ali, sob a mão de seu mestre, Rei Odin, senhor de Asgard.
– Pode me chamar de Odin somente...Essa não é um encontro oficial, não é mesmo? – falou de forma cordial o Aesir, piscando o olho.
– Se for esse o caso, pode me chamar de Skymir, o nome Utgard é o título que os Jotun dão aos seus reis e lídereres.
– Oh! Isso explica muito, afinal, o meu povo vem lutando com vários Utgards ao longo da história. Sempre achei estranho que todos os seus reis tinham o mesmo nome. Questionei meus tutores, mas nenhum soube esclarecer de fato, então criei a estranha fantasia que todo o Jotun era nomeado de Utgard ao nascer.
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Entre Trovões e Gelo
FantasiOs nove reinos vivenciaram, durante séculos, um conflito constante entre o reino de Jotunheim, governado pelos Jotuns, também conhecidos como gigantes, e o reino de Asgard, formado por Aesir e Asynjur, seres semelhante a humanos apenas em aparência...