Dois estranhos

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Dois estranhos

Domingo, 04h43min – Mansão

O último grupo de adolescentes bêbados havia acabado de sair em um Uno dirigido pela mãe de algum deles. Norman estava jogado no sofá, que havia sido acabado de ser limpo por uma das empregadas. Sam procurava por algo de comer na mesa de salgados. Por fim o moreno encontrou uma esfirra de carne e uma garrafa de refrigerante quase vazia. Sentou-se ao lado de Norman, e ligou a televisão, como se fosse de casa. E o loiro não se incomodou, porque de fato ele era.

Sam tentava assistir ao desenho animado de passava na Cartoon Network, mas as empregadas passando na sua frente com vassouras e espanadores estavam o irritando.

― Acho que vou ligar para Sarah. ― Norman já estava sóbrio depois de alguns copos d'água e um banho demorado. E não demorou muito para que sua consciência começasse a pesar. Ele estava com o celular nas mãos, e observava o número dela nos contatos, em uma guerra interna entre ligar ou não.

― Ela já deve estar dormindo a essa hora. ― Disse Sam. ― Se ela estava bêbada provavelmente vai dormir o dia inteiro. ― Completou.

― Tem razão. ― O loiro fechou a tela do celular, e suspirou. Olhou de relance para Sam, e o mesmo estava com os olhos colados na televisão, sem demonstrar nenhuma reação. Norman franziu o cenho.

Desde que Sam havia chegado, Norman havia notado algo de estranho no amigo. A maneira de se vestir continuava a mesma, assim como o corte de cabelo arrepiado e cheio de gel. Mas durante toda a semana a única coisa que ele havia feito havia sido matar mais da metade as aulas.

Norman ouviu dizer pelos alunos do Institut Le Rosey que ele e Seth ficavam no parque de Gyoen fumando e bebendo coca-cola. ― Isso era realmente estranho.

Sam também havia passado a festa inteira bebendo, sentado e conversando com Seth. Não olhou para nenhuma garota, nem transformou seu quarto em um puteiro como em outras vezes.

― Você está bem? ― Tomou coragem para fazer a pergunta que segurou desde o início da semana. Estava tentando fingir que nada havia acontecido. Que nada havia mudado, mas sentia que isso já não era possível.

― Como assim? ―Sam perguntou, ainda com os olhos na televisão.

― Você está estranho. ― Norman proferiu. ― Aconteceu alguma coisa?

― Não. ― Sam respondeu simplesmente, levanto a garrafa de refrigerante até a boca e esvaziando-a. ― Só estou morrendo de sono.

Norman continuou o encarando, desconfiado. Sam não queria lhe contar o que havia acontecido consigo durante os últimos anos, e isso o deixava mal. Sam era a primeira pessoa para quem Norman contava as coisas, e agora era como se eles dois fossem estranhos.

― Nos últimos dois anos eu fiquei como um louco me perguntando o que havia acontecido com você. ― Norman disse desta vez tomando a atenção do moreno. ― Eu devo ter te enviado umas trinta mensagens, mas você não respondeu nenhuma.

― Norman eu... ― Sam tentou interrompê-lo. Sabia que uma hora ou outra eles teriam que ter essa conversa, e ele definitivamente não queria que seu melhor amigo achasse que ele não se importava mais consigo. Mas Norman não o deixou terminar.

― No início eu achei que você estava tomando um tempo para ficar sozinho com a família, depois da morte da sua mãe. ― Continuou. ― Mas quando passou o primeiro ano, e ainda não havia tido nenhuma notícia sua, comecei a pensar que talvez os boatos que circulavam pelo colégio fossem reais. As pessoas diziam que você havia sido preso, estava em uma seita satânica, vendendo drogas ou até mesmo com um filho. ― Sam permaneceu em silêncio. ― No segundo ano meu pai havia me chamado depois de ligar para o seu pai, dizendo que você estava morando em Miami com seu irmão. Então eu comecei a me perguntar se em Miami não tinha telefone, ou internet. Foi bem difícil ver as pessoas vir até mim e perguntando sobre você, e eu não ter nada para dizer. Eu sabia menos que elas. Então durante muito tempo eu senti raiva de você, muita raiva mesmo. Mas no início da semana quando te vi, a raiva sumiu. Você é meu melhor amigo Sam, e praticamente meu irmão. Confio em você mais do que em qualquer pessoa desse mundo. E o que eu estou querendo dizer é que... Bom, se você não quer me dizer o que te fez sumir daquele jeito, eu não vou me importar, sei que você teve seus motivos, e os entendo, mesmo não sabendo quais são eles. ― Norman deu um meio sorriso. Sam ficou um tempo encarando o amigo, tentando encontrar uma maneira de respondê-lo. Sentia-se mal por ter feito tudo o que fez, sentia-se mal por ter magoado seu melhor amigo, e sentia-se pior ainda por não poder contar para ele o porquê.

― Eu sinto muito. ― Foi apenas o que ele disse. Porém apesar de ser simples, foi o mais sincero pedido de desculpas que ele já havia feito, e Norman percebeu isso.

― Eu te perdoo. ― O abriu o sorriso, e Sam se sentiu grato por aquilo. ― É bom ter você de volta Sam.

E pela primeira vez em dois anos, os dois se olharam como nos velhos tempos, como os dois amigos que eram e sempre foram. Não como dois completos estranhos.

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