Capítulo Dez: Gustavo

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Bebi a xícara de café que minha mãe havia me servido rápido até demais queimando um pouco minha língua. Eu merecia mesmo ser queimado por fazê-la se preocupar comigo nessa altura da minha vida. Ela me encara com certeza de que preciso de ajuda, e ela não está errada. Eu só não sei o que responder.

"E então, não vai falar nada?"

Essa era a deixa para eu começar a falar? Não estou com coragem, acho que ela não precisa saber disso. Acho que não preciso dizer nada. Vou deixar que ela faça o que quiser comigo. Tenho certeza que ela saberá o que está fazendo e vai ser o melhor. É impossível evitar as lágrimas outra vez. Caramba, eu preciso mesmo de ajuda. Não consigo falar sobre nada, só fujo e penso em bebida, isso sem contar que choro por tudo.

Quando minha mãe vê as lágrimas caindo, ela muda a expressão, eu que a encarava agora de canto, sinto um frio na espinha. Estava fazendo ela sofrer ainda mais, e esse não era meu objetivo...

"Filho, o que está acontecendo? O que tanto te perturba? Por favor, me fale de uma vez?" Sua mão pousa sobre a minha, que alisa freneticamente a alça da xícara.

"Eu sou gay." Soltei de uma vez. Pensei que ter independência financeira me livraria dessa conversa, mas estava errado, e estava errado em todas as desculpas que inventei para postergar essa conversa. Aqui aos vinte e cinco anos de idade, pensando que tinha tudo sobre controle, descubro que ainda tenho tanta coisa inacabada e que talvez a vida seja assim mesmo, sempre nos surpreendendo com mais 'problemas'... Sofri por muito tempo sozinho, mas isso já não me importa mais. Agora não tem mais volta. Falei para minha mãe a verdade e tudo o que poderia fazer era esperar a sua reação, que estava demorando demais...

Ela seguiu me encarando calada. Dona Sandra não esta facilitando nada aqui, ela quer mesmo que eu fale tudo de uma vez. A conheço e sei que quando eu começo falar e ela não interrompe é porque quer que eu fale tudo. Tudo, seja lá o que tudo significa para ela. Então eu abri a boca e segui falando:

"Eu não os culpo por nada, acredite em mim. Eu não me aceitava. Eu não acreditava que sou o que sou. Eu precisei de muita coragem para me aceitar, e tive uma ajuda extra na bebida, eu acho, mas não consegui manter isso como uma boa coisa, foram incontáveis os dias que perdi do trabalho por estar bêbado ou passando mal. Não sei como ainda não fui demitido. Não sei como ainda estou vivo; eu sei que não é assim, temos um problema vamos lá e resolvemos com bebida, mas eu não sei o que fazer. Me senti perdido, sem luz, sem saber qual caminho seguir. Sentia-me excluído de tudo o que eu acredito simplesmente por ser o que sou. E o que eu sou? Sou Gustavo Torres que gosta de rapazes e acredita em Cristo. Sim eu sou isso, mas não só isso. Sou alguém que enfrenta os problemas de forma errada e se esconde atrás de uma garrafa de tequila. Já magoei muitas pessoas, afastei gente boa, gente ruim, amigos de verdade e os que tentaram pelo menos ser. Me tornei um poço de amargura sem fim, uma carcaça bonita que bebe e que beija homens as escondidas. A alguns dias atrás um homem muito bonito me chamou pra sair. Me fez o convite quase sete da manha enquanto eu tomava o café da manhã na padaria que vou todos os dias antes de ir ao trabalho. Me convidou de uma forma romântica e inusitada, mas o que importa, já que fui ao encontro e ele não apareceu. Talvez ele tenha notado que sou problemático demais para ele. Talvez tenha percebido que sofro com essa maldita doença, que eu não quero aceitar. Não o culpo se foi isso que aconteceu... Eu realmente não o mereço. Ele é médico e sabe como eu descobri isso? Em um dia que bebi tanto que tive que ir tomar glicose e soro na veia, e lá estava ele, com seu jaleco e sorriso perfeito me perguntando se tinha sofrido uma intoxicação alimentar, mas não estava lá por causa da bebida, é obvio que ele sabia. Eu não agüento mais essa crise de autopiedade e não quero que a senhora entre nessa. Eu preciso ficar sozinho um tempo. Talvez me internar em uma clinica de reabilitação seja a melhor coisa que eu possa fazer para mim mesmo e para todos que estão a minha volta... " Eu falo quase sem respirar e o meu coração acelerado me mostra que talvez eu tenha descarregado um pouco demasiado sobre minha mãe, mas eu não conseguiria fazer de outra forma. Eu precisava disso. E agora pensando bem, devo gratidão ao André. Não me importa o que é que tenha acontecido com ele, e nem se o verei outra vez, mas eu me permiti e agora estou conseguindo me organizar, de uma forma desorganizada mas estou e isso é o que importa.

"Isso é tudo?"

"Não... com toda certeza não. Sou infeliz. Mãe... Eu não sei o que significa ser feliz de verdade. Eu não sei o que significa o amor. Eu não sei tantas coisas que jurava que a vida me mostraria, e eu não consigo compreender o porque não sei de todas essas coisas? Eu não quero seguir sendo essa pessoa. Eu não quero mais. Preciso voltar a ser o garoto que eu era." Aponto para a foto em que esta em cima do meu armário da cozinha, ao lado da garrafa de tequila que provavelmente minha mãe esvaziou, onde estou abraçado com ela. "Quero voltar a ser aquele garotinho. Quero voltar a ter aquele sorriso.

Minha mãe chora junto comigo agora. Ela se aproxima e me abraça. Alguém no mundo sabe me explicar como é que elas conseguem amar tanto assim. Como elas conseguem deixar de lado seus próprios preceitos, conceitos e todos os eitos para que você se sinta confortável em seu colo? Eu simplesmente descobri que isso se encontra em mais uma coisa que eu não compreendo na vida. Se sou minha própria mãe, me daria uma surra e me trancaria no meu quarto por todo um semestre comendo apenas pão e água, quem sabe assim eu criasse vergonha na cara, mas eu sei que isso não é a questão. Eu sei que sou bom, que tenho minhas qualidades e que nem sempre fui essa desgraceira total, mas e agora como faço pra recuperar minha essência? Alguém pode me dizer como? 

***

Olá, amores! Como estão? 

Hoje postei um duplo de Gustavo né... Ele pedia esse momento emocionante com sua mamis!!

Espero que gostem. Gratidão por estarem aqui.

Um grande beijo e bom final de semana!!

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