03.

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Aquele era um dia bonito. O céu estava sem nuvens e a brisa era gélida. Perséfone sorriu diante da paisagem – um enorme milharal que sumia no horizonte, mesclando ao dourado do sol, que começava a nascer.

Ao seu lado, Nayra desembaraçava o cabelo com a ponta dos dedos, a feição sonolenta. Demetra vinha logo atrás carregando uma cesta grande que continha os materiais de jardinagem que utilizariam durante o dia.

— Como consegue ficar tão animada pela manhã, minha senhora? — Nayra bocejou, em seguida esfregou os olhos, piscando-os, ainda tentando acostumar com a luz forte vinda do horizonte. — Nem amanheceu.

— Como não ficar animada com uma paisagem como essa? — devolveu a pergunta, sorrindo, achando engraçado todo aquele mau humor. — Veja só, que vista!

— Milho, mato. Nada fora do comum.

— Não seja rabugenta. Vamos, me apresente a região.

As duas rondaram o local por um tempo, ambas sendo vigiadas pelo olhar atento da deusa da agricultura, que averiguava a área enquanto as garotas riam e conversavam. Havia uma fazenda nas proximidades e os humanos que ali residiam ainda dormiam, o que facilitaria bastante o trabalho delas.

— Tomem cuidado, meninas! — alertou. — É muito fácil se perder por aqui!

Elas acataram as ordens, mantendo-se mais próximas. Nayra conhecia a região como ninguém, mas seria imprudente de sua parte desobedecer a deusa maior.

— Como é ser filha do rei do Olimpo? — a ninfa questionou assim que Demetra se afastou para verificar algumas espigas. — Quer dizer, deve ser empolgante, não?

— Ah, não muito. Meu pai é sempre muito ocupado e depois de séculos a vida no Olimpo fica cansativa. Sempre as mesmas pessoas, as mesmas festas. Meus irmãos também não são uns santos, o que deixa minha mãe maluca. Apolo mesmo não larga do meu pé. — a informação arrancou uma gargalhada da outra. — Ele é bem legal, tentou me cortejar, mas...

— Entendi. — a outra sorriu pequeno. — Como os mortais dizem, “não é a pessoa certa”.

A deusa assentiu com a cabeça.

— Você já se apaixonou alguma vez?

— Não. — deu de ombros. — Mas imagino que seja uma droga. Quer dizer, muitos deuses e pessoas morrem por amor. Parece trágico e pouco inteligente.

Perséfone riu e as duas pararam ao verem a silhueta da deusa da agricultura aproximando.
Demetra ensinou mais técnicas a filha, técnicas simples que poderiam mantê-la entretida até terminar o que tinha a fazer. Nayra limitou-se conter a expressão entediada e sonolenta pelas horas seguintes. Almoçaram por volta do meio dia, uma comida simples e humana, composta por carne de caça e folhagens.

— Quando retornaremos ao Olimpo? — Perséfone questionou enquanto recolhia os pratos da mesa com a ajuda da amiga. Demetra, que prendia o longo cabelo cacheado em um rabo de cavalo, levantou-se para lavar a louça.

— Amanhã, provavelmente. Nayra, minha flor, por gentileza, recolha as roupas estendidas no varal. — a jovem acenou com a cabeça e logo desapareceu. Demetra fitou, longamente, a filha, que agora carregava uma feição entristecida. — Não fique assim, querida.

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