Segredos

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— Eu falei pra não gritar!

— Põe a blusa de volta!

— Primeiro raio, eu sei que já foi à praia e todos os caras lá não usam camiseta! Segundo raio, você me perguntou o porquê da minha chave e ele está aqui no meu tórax!

     Hesitante, tirou alguns dedos de um olho e levou um susto enorme. A grande surpresa não foi ele ser forte e treinado. No lugar onde supostamente deveria estar o coração, havia uma máquina cor de ferrugem. Era pequena, uma fenda onde cabia uma chave no centro:

— ... O que é isso?

— Bom ... os médicos chamam de P.C.R.C., Prototipo Cardíaco Robótico à Corda, mas eu ... — deu de ombros, melancólico — ... Chamo de coração.

     Tirou as mãos dos olhos, estupefata com aquilo. Seu cérebro tentava processar a informação:

— ... Colocaram uma máquina no seu coração, é isso?

— Basicamente. — concordou — Mas essa coisinha dá trabalho ...

— Por quê? Como?

— Um raio de exemplo simples. Esta chave ... — pegou o objeto — ... É o que me mantém vivo; se a corda acabar ... eu acabo junto.

— Mas por que você regula tanto a dieta, também?

— O meu sangue passa por tubos dentro do P.C.R.C. Glúten, gordura e calorias entopem esses tubos mais rápido.

— ... A bola do Creek tinha acertado esse treco naquele dia, certo?

— Exato. — suspirou — As engrenagens saíram do lugar e os tubos também. Remontaram tudo naquele dia.

— ... Aqueles "pip's" ... o que eram?

Corou e cruzou os braços. Fitou os próprios pés, meio nervoso:

— ... Era a máquina que checava meus batimentos cardíacos ...

— Por que você teve que colocar ... isso?

— ... A minha mãe morreu de câncer no coração ... eu quase tive o mesmo fim que ela ...

— FILHO!! — o homem de pele mais escura forçou o menino a olhá-lo nos olhos — Você VAI ficar bem! OUVIU!!? VAI FICAR TUDO BEM!!

Soltou-o e deixou os médicos levarem-no à sala de cirurgia. Se passavam as horas e nada. Lágrimas amargas escorriam pelas bochechas de um pai preocupado e angustiado. As portas se abriram e um cirurgião tirou a máscara, sorrindo:

— A cirurgia foi um sucesso!

— ... O que aconteceu depois?

Muitas coisas. — mexeu no cabelo, melancólico — Fiz alguns tratamentos para ter certeza que o câncer não voltaria ... como era muito forte o meu cabelo todo caiu. Quando voltei para a escola, as crianças começaram a me atormentar justamente por isso.

— Que coisa ...

— Não é só isso ... — sua expressão endureceu — Eles me batiam ... excluíam ... jogavam meu material no chão ... uma vez, até abaixaram a minha calça no meio do corredor.

— E ninguém via!?

Tavão nem aí. — ficou vermelho de raiva — E ... o pior ... foi ser feito de fantoche ... de bobo ... boneco ...

— Marília, certo?

— Exato! — suspirou pesarosamente — Eu gostava tanto dela ... MAS TANTO ... que cheguei a pensar que era amor. Contava todos os meus segredos ... e ela espalhava sem eu saber. — lágrimas de raiva vieram — Eu dei o meu primeiro beijo nela! Foi numa pessoa que beija qualquer boca ... que me humilhou ...

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