Guarda-chuvas, roupões e criaturas sobrenaturais

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A orquestra que atingia os tímpanos de Rosie repercutia nas abas do guarda-chuva cor de rosa que ela segurava. A rua 89 estava vazia, fazendo o som inquietante reverberar por cada pedacinho da longa região asfaltada. O rímel já devia estar por todo o seu rosto. Tivera sorte de não ter ninguém passando pela rua no momento. Às vezes, conhecer muita gente podia se tornar um problema irritante quando você terminava com seu noivado de quase um ano.

O grande Big Bang da noite era esse: conhecer muita gente. Não admirava que sua mãe tivesse convidado 333 convidados para um “simples” jantar de noivado, o qual acabara de ser lançado ao lixo.

O que de fato a espantava, era ter lido, acidentalmente, a mensagem no celular de Nick.

“GOSTARIA DE VC DENTRO DE MIM AGORA”

Um trovão gritou no céu, cortando-o em seguida com um raio ofuscante. Já nem sentia mais os pés. Estavam dormentes após ter andado quase cinco quarteirões chorando e esperneando.

Só queria ignorar a cara de Nicholas pelo resto da vida. O que não era fácil, já que ele se tornara o papel de parede do seu celular há quase dois anos. Pelo visto, teria que exterminar o celular do mesmo jeito que fizera com o anel de noivado. Aquela merda de 20 quilates já deveria estar no esgoto à essa altura, mas Rosie não se arrependia nem um pouco. Ele tinha dinheiro suficiente para comprar uma casa inteira daqueles, inclusive para a tal garota da mensagem no celular.

Atravessou a rua num salto, ignorando a água espirrando no vestido impecavelmente branco. A madeira cor de vinho e a varanda iluminada por vagalumes apareciam no fim da rua, dando-a a sensação de conforto que necessitava. Deixou o guarda-chuva jogado em um canto e abriu a porta com um rangido grotesco. Ela sempre se esquecia de lubrificar as juntas da coitada.

Retirou o vestido em um puxão, deixando-o esparramado pelo chão liso e escuro. Subiu as escadas com a lingerie branca rendada que tinha comprado especialmente para o after-party. Os 150 dólares já começavam a doer no seu coração. Pegou o primeiro roupão que viu, e começou a se enxugar. No processo, de olhos fechados, a mensagem retornava à sua mente; o olhar culpado de Nicholas; a mãe tentando-o acalmar; os convidados cochichando ao seu redor...

Puxou o roupão com tudo, levando os brincos juntos.

Por que os homens tinham que ser desse jeito?

As lágrimas escorriam pelo seu rosto, levando cada pedacinho de esperança e futuro que ela houvera criado com Nick. Rosie já tinha chegado ao ponto de imaginar os nomes dos filhos, dos cachorros e até das viagens à férias que fariam. Como ela pudera ter sido tão estúpida?

Bateu na cabeça diversas vezes, culpando a si mesma pela burrice de não ter sido suficiente. Por que não era mais bonita? Mais engraçada? Mais louca na cama?

Kinkle se atirou na cama, contorcendo-se entre os lençóis e sentindo o aroma de rosas e alecrim invadirem-na. Nick e ela já haviam transado naquela cama tantas vezes... Inspirou fundo, sugando todo o ar que podia. Seu peito parecia prestes a explodir em decepção e sofrimento. A angústia já dominava seu corpo como uma cobra se enrolando pela extensão da cabeça até os pés.

Algo pinicou seu braço, irritando-na. Ergueu-se da cama lentamente, as costas curvadas e caídas. A visão que tinha do espelho era de longe a mais agradável que tivera. O cabelo castanho escuro parecia-se com um ninho de pássaros que ia do topo da cabeça até os ombros. O rosto era a junção do batom vermelho e do rímel extremamente preto que escorrera pelo seu rosto durante todo o trajeto. Parecia uma mulher de 27 anos derrotada.

Ah, era isso que ela era.

O braço direito de Rosie pinicou novamente, atraindo os projetos de unha que ela tinha para coçar a região. O farfalhar da cortina de bolinhas vermelhas de sua janela, geralmente, era algo que a acalmava; fazia-a lembrar que ninguém poderia invadir as peculiaridades do seu quarto além dela mesma — e de Nicholas. Porém, tudo a estressava naquele momento.

Fechou a janela com um baque, evitando olhar para o pequeno jardim, e, em seguida, para a árvore velha. As incrições N&R estavam em algum lugar sobre o cascalho da madeira.

Que merda. Absolutamente tudo naquela casa e nos arredores, na sua vida, lembravam-na de Nick. Ah, mas quem iria imaginar que o cara “perfeito” seria capaz de trair a mulher “perfeita”? Nem a avó de Rosie, dita vidente, conseguiria prever tal fenômeno.

Nicholas Parker sempre foi o cara perfeito. Desde que Rosie o conhecera na universidade quando fora buscar documentos para trocar de campus, Nick já a encantava. Muitas meninas diziam que ele era um safado sem limites — algo que Rosie tirou proveito o suficiente —, e que não tinha compromisso com nada. Porém, a imagem que Nicholas mostrava para Kinkle era o completo oposto do que circundavam as fofocas nas universidade.

As rosas, os doces, os passeios ao cinema, à sorveteria, à livraria, ao playground... Tudo parecia um sonho lúcido para Rosie e para seus pais, que achavam Nicholas o homem ideal para ela casar e ter filhos. Rosie também achava. Aceitara o pedido de namoro sob o luar da praia, o de casamento na casa dos pais no dia do seu aniversário... Era tudo mágico.

Até a maldita mensagem naquela droga de celular. Devia ter atirado o aparelho na cabeça de Nicholas. Com força.

A irritação em seu braço prosseguiu, levando os olhos dela ao local. A vermelhidão já tomava conta por causa da coceira, e não aparentava ceder tão cedo. Talvez se colocasse gelo...

Um farfalhar de asas ressoou no seu ouvido.

— Acho melhor parar antes de ganhar uma terrível infecção.

A voz que viera atrás de si, continuou:

— Eu estou atrás de você, querida.

Quando Rosie virou o rosto para olhar quem ou o quê estava em cima da sua penteadeira,  fora tarde demais. O vulto negro de asas borrou sua visão, e ela caiu na escuridão da própria desgraça.

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Oi, pessoal! Bom, essa é uma história que eu realmente tenho muito apreço, e estou escrevendo com um grande entusiasmo. Espero que possam acompanhar a trajetória da Rosie! ✨.

Deixem uma estrelinha se gostarem, e comentem o que acharam! <3.

Até breve! 🕸️.

Rosie Kinkle - Nada Será Como AntesOnde histórias criam vida. Descubra agora