Entre o choque e a indignação, eu encaro a minha amiga sentada do outro lado do balcão, esta que mantem a cabeça abaixada. Ando de um lado para o outro, tentando controlar a raiva crescente em meu peito, mas, ainda que em me esforce, é impossível.
– Como assim você sabia que ele estava em Londres e não me contou nada, Manuela?
Ela me espreita por debaixo dos cílios e solta um suspiro. E não precisa de muito para decidir que o balcão é mais inofensivo do que eu e voltar a encará-lo.
Continuo andando de um lado para o outro, sem temer abrir um buraco no chão da cozinha. Meu olhar paira sobre Manuela e me obrigo a respirar fundo para segurar a acidez em minha língua, que coça para sair da boca.
Estou com os nervos à flor da pele e eu gostaria muito de não usar essa desculpa para simplesmente despejar toda a angústia que sinto sobre a desmiolada sentada a minha frente. Ainda que fosse muito justificável eu lançar a bomba sobre a Manu, principalmente nesse momento, eu não serei insensível à ponto de não ligar para o fato de que ela já tem os próprios problemas.
Estes que, diga-se de passagem, estão perdurando mais do que eu imaginava.
Forço os meus pés a estancarem diante o balcão e cruzo os braços sobre o peito. O clima é tão pesado, que posso senti-lo nos ombros. Manu permanece calada e cabisbaixa, até mesmo pensativa, e eu não posso deixar de notar que é a primeira vez em tantos anos que nos estranhamos dessa maneira.
O que só me faz perceber que Adrian mal chegou e já trouxe dores de cabeça.
Por mais alguns minutos, limito-me a observar ao redor e fazer com que a raiva se esvaia com esse gesto. Sentindo-me um pouco mais calma, solto um longo suspiro e sento na banqueta rente a minha amiga, ainda calada.
Sei que está agindo assim porquê sabe exatamente que eu tendo a ficar ainda mais nervosa conforme discuto e essa é à sua maneira de me dar tempo para esfriar a cabeça. E eu a agradeço imensamente por isso.
– Por que você não me contou, Manu? – pergunto, largando mais um suspiro no ar.
– Me desculpe, Clara. Não foi a minha intenção esconder de você, acredite.
Trocamos olhares por um instante, cheios de significado, e sou incapaz de permanecer irritada por mais tempo. Afinal, eu sei que ela não fez com uma má intenção.
Pego a sua mão estendida sobre o balcão e a aconchego entre as minhas. Dou-lhe um sorriso reconfortante.
– Eu sei que não, Manu. Eu sei.
Minha amiga sorri fraco e aceita as desculpas, ainda que esdrúxulas; respeito o silêncio que segue momentaneamente, esperando que ela tome a iniciativa de começar a falar.
– Tudo começou a algumas semanas atrás, enquanto eu estava andando nos arredores do estúdio de dança com o... Com o Sebastian. – Manu inspira e noto o quão doloroso foi dizer o nome dele – Eu vi um rosto conhecido na multidão enquanto esperava na frente de uma cafeteria na qual paramos. De primeira, eu tomei um grande susto. Tentei enxergar melhor, mas a tal pessoa havia desaparecido tão rápido quanto apareceu. E, bem, como aquela área é frequentada por muitos estrangeiros, eu pensei ser apenas impressão minha. Afinal, qual era a chance de ele estar logo aqui?
Faz uma pausa e suspira. O aperto de seus dedos nos meus se intensifica.
– Mas há alguns dias, eu o encontrei em frente ao shopping Westfield, depois que...
– Depois que brigou com o Sebastian?
Ela fica em silêncio e finge não entender a minha pergunta, quando volta a falar:
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Inabalável
RomanceSe apaixonar não estava nos planos de Clara, especialmente por um de seus alunos do Terceiro Ano. Mas aconteceu e é recíproco. John Berryann também se rendeu ao sentimento e os dois vivem um relacionamento escondido dos olhos de todos, sob as fachad...