D'squina

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A doce menina, sentada na esquina, olhando para a imensidão cinza, se recordou [daquele cheiro].

Maldito perfume amadeirado, maldito sabor de bala de morango.

"Tudo bem" —  ela sabia.

"A vida é feita de rasos amores" —  eles diziam.

Rasos amores, eu cheia de dores, carregando flores mortas nos bolsos.

Dorival vinha dizendo: "dê meia volta, garota, Ainda Há Tempo." Mal sabia Dorival.

Perdida há tempos já estava, Dorival. Lembra-se daquele remédio que a iria curar? Lembra-se das palavras recitadas que me iriam curar? Lembra-se das costas partidas que os iria educar?

Quem precisa de cura é o mundo.

Acinzentaram sua visão enquanto cores são matéria frágil, doçura de criança, tinta da vida!

Aquela doce menina já não era mais doce, ela já não via mais cores.

Daltônica não, meus senhores. Esmagada. Acreditar na felicidade fora seu maior erro.

Ela foi Maria. Bonita também.

Ela foi Marina, e também chorou as lágrimas caídas no chão. Era branca como farinha, marcada com vermelho sangue. Dela só restou o silêncio.

Ela também foi Bruno, apedrejado até a morte por amar José.

Foi Dona Celestial. A dona da pele mais negra da cidade e das cicatrizes que nunca cicatrizaram. Cortaram-lhe um pedaço. De seu corpo, de sua alma, de si mesma.

Degraus frios, chuva de prata. Gotas amargas que inundam o céu.

Chegam ao telhado, mas nunca molharam você.

O vento dança com seus cabelos, finos como a corda que sustentava o mundo em suas costas.

O cantar dos pássaros, o grito da alma. Ela abriu suas asas no topo da selva de pedra. E pela primeira vez, voou para a liberdade.


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Art: "Secret Jarden", by John-Paul

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