foi tudo um sonho (pt. 1)

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F R A N C E S

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   Acordo com um grito preso na garganta, isso não é comum. Me assusto com o quarto que mais parece um apanhado de sombras com contornos estranhos e isso só aumenta meu desespero. Olho para os lados e...

Estou em casa. Esse temor é inútil, foi tudo um sonho.

Me sento na cama, foco em manter minha respiração firme e meu coração nivelado por um tempo - mais do que eu julgaria necessário - e fico bem. Quando volto a mim percebo que soei, ou estou chorando e que a noite já caiu lá fora, não esperava por isso. Ao meu lado a cabeceira vibra, pego meu celular sobre o movel e já acordei quarenta e sete minutos atrasada se o horário está certo, deveria estar no bar às sete e meia com o meninos.

"Ei, vocês continuam aí?", pergunto a Eddie e ele parecia já estar esperando por isso.

"Apareceu a margarida", posso vê-lo sorrir ao escrever. "A gente não vai sair daqui tão cedo, fadinha".

"Chego em vinte minutos" também estou sorrindo e digito o mais rápido que posso, "desculpa o atraso".

Largo o aparelho na mesinha e me levando para ascender as luzes, a imagem desse buraco é reconfortante quando o faço, nunca tinha nem imaginado algo como esse sonho e só a lembrança já me aperta o peito. Corro para o banho, sei que meu rosto está inchado e quando termino de pentear o cabelo passo um pouco de maquiagem. Uma make saúde como diria a grande Helena, tenho saudades dessa menina, éramos como melhores amigas e soube que ela viajou no dia seguinte a minha chegada - tenho que procurá-la de novo.

Quando acabo coloco um vestido preto e um casaco do meu irmão. É estranho pensar que Erick foi embora pouco depois que eu cheguei também, acho que no fundo ele só não queria abandonar minha mãe com uma única filha e com a minha chegada isso foi solucionado. Sou obrigada a adimitir que tenho vontade de gritar pelos quatro cantos do mundo o quanto preciso dele agora, mas isso não iria adiantar em nada além de me fazer perder a voz e já aceitei esse fato. Eu ainda sinto o morno das mãos do meu irmão em minha bochecha e é exatamente como quando eu tinha dez anos e descobri que um Thomas não gostava de mim da mesma forma. Para resumir, Erick sempre esteve ali, então agora é doloroso saber que essa certeza não existe mais.

Afasto isso da minha cabeça e deixo meu quarto para ir ao bar, meus meninos são a única certeza por agora e não posso chorar mais.

Na cozinha escrevo um recado para minha mãe dizendo que a amo e que não precisa se preocupar comigo essa noite, vou estar com Eddie - o amor da sua vida. Queria ser uma pessoa melhor, tenho um ímpeto de me desculpar por todos os erros que eu já cometi, mas se fosse tão fácil não seria eu. Coloco o bilhete embaixo de um vaso de flores e me pergunto se quero ou não que ela o encontre, acho ferozmente que não, mas sei que não deveria ser assim. Amarro meu all-star azul que eu nem lembrava de ter comprado e no espelho da sala me sinto mais uma vez como aquela Frances ou mais ou menos isso, me sinto diferente.

Ainda está cedo demais para alguém útil estar na rua, então, pela primeira vez, não espero esbarrar com Clay por aí; pela primeira vez em duas semanas saio tranquila, sem medo e decidi que é assim que vou enfrentar a situação, não quero esperar mais nada desse garoto, o que tiver de acontecer, vai acontecer e eu espero que aconteça ao meu favor.

A lua está bonita, as estrelas brilham lá em cima mas ninguém parece notar isso. Olho pros rostos interessantes ao longo do caminho, mais algumas dezenas pro meu catálogo de sonhos e o fato de não saber quem são todos me deixa meio aflita, nós só somos capazes de enxergar metade do mundo. Se me perguntassem agora, dez minutos depois, já na porta do bar, não saberia descrever a mulher com quem esbarrei da esquina de casa.

MONEYOnde histórias criam vida. Descubra agora