A Torre - Parte 5: Bitter Sweet Symphony

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5 – Bitter Sweet Symphony

O dia de cantar na igreja chegou rápido demais. Leonardo acordou cedo sem motivo aparente, sem sono e sem qualquer chance de voltar a dormir. Olhava para o teto escuro, percebendo que nem ao menos o sol havia banhado aquele bairro e iniciado o grande dia de sua participação naquele coral. Eram somente cinco e vinte da manhã.

Ouviu música deprimente no fone até as sete e meia, deitado e fingindo dormir, na esperança de adormecer de verdade. Obviamente sem sucesso. Apenas conseguia dor nos ombros ao tentar dormir de lado e nos ouvidos, ao pressionar os fones contra o travesseiro.

Quando seu celular despertou, não teve jeito. Levantou-se, foi até o banheiro, lavou o rosto, tirando as remelas e algumas coisas que incomodavam seus olhos.

– Não sei se é da rinite ou de horas exposto à luz do computador, mas sempre parece que tem algo no meu olho – comentou com a Morte enquanto coçava o visor. – Às vezes tem mesmo um cisco, mas de resto, é só paranoia pra me fazer cutucar até deixá-lo mais irritado. É como se tivesse uma minhoca lá dentro.

Não é impossível que realmente tenha uma larva aí, se pelo que diz, vive coçando-o com a mão suja.

– Eu faço questão de deixar minha mão limpa antes de coçar o olho. Bem... na maioria das vezes.

Saiu do banheiro, foi até a geladeira e tomou um copo de água misturada, nem muito gelada e nem muito morna: fresca. Descia pela garganta com mais gosto, sem cortá-la pelo frio ou enjoando-a pela temperatura morna. Apenas descia, hidratando e limpando seu organismo.

Ao chegar na porta do quarto da mãe, a viu deitada de olhos abertos. Acordada.

– Vai na igreja hoje? – perguntou à mãe, a mulher inerte.

Ela fechou a cara e gemeu, escondendo o rosto como uma criança.

– Aaaah, não quero levantaaaar...! – gemia e choramingava de forma infantil.

Leonardo bufou de raiva, dando as costas a ela e seguindo para a cozinha.

– TÁ BOM! Não precisa ir se não quiser.

– LeonardooOoOo! – a mãe chamava, tentando levantar da cama, tão densa que parecia ser puxada com violência pelo centro gravitacional. – Não fala assim comigo!

Ele a ignorou. Pegou de forma violenta o suco de caixinha, a manteiga e o pão de forma. Preparou seu café lentamente, tremendo, não querendo olhar para o lado como se estivesse prestes a ocorrer-lhe um jumpscare de filme de terror barato. Sabia que se olhasse, um monstro iria pular em cima dele enquanto gritava, e então os telespectadores poderiam se assustar e supervalorizar aquela obra fútil que serve apenas para fazer dinheiro.

No seu caso, Leonardo não receberia nem dinheiro, nem sustos, nem mesmo uma nota ruim em um site de críticas. Apenas receberia o desgosto pessoal sobre uma vida que não escolheu ter, enquanto contemplava pessoas que tiveram a sorte grande de nascer no lugar certo, na época certa, na situação certa. Bingo! Você é incrível!

– Me dá um abraço? – ela surgiu ao seu lado lhe pedindo o impossível.

Ao se virar, Leonardo percebeu a terrível e diária aparência de sua mãe. Era a mais nova tendência parecer uma mendiga, pensou. Estava destruída, sabe-se lá o porquê. Estava procurando carinho de alguém que não queria dar-lhe nada. De alguém tão quebrado quanto ela. Que grande ironia.

Mesmo relutante, ele se levantou e a abraçou, mantendo os olhos enraivados e abertos enquanto ela fechava sua visão e chorava, abraçando-o de uma forma que o deixava pior. Ela não circulava os braços pelas costas dele: ela segurava em seus ombros como se ele fosse a única barra que ela se segurava para não cair de um precipício.

Minha Amiga MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora