O Rei - Parte 3: Cool Kids

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3 – Cool Kids

Eu tinha tantas roupas, nem sabia qual usar na festa. A maioria delas estavam levemente pequenas em mim, mas ainda cabiam. Cada Faceta decidiu fazer seu próprio look para a saída e se vestiram como bem entenderam. Sei que parece meio esquizofrênico tratar partes de sua personalidade como entidades antropomórficas – essa palavra ainda vai pegar –, mas é o que tenho para hoje, me desculpem. Parecia que eu tava naquele filme do Shyamalan com o James McAvoy.

Razão se vestiu com um terno e gravata, ambos comprados para o casamento de Christina, que tinha sido anos atrás. Não cabia mais em mim, mas nos meus sonhos, quem sabe?

Prazer estava parecendo um garanhão de novela mexicana. Cabelos penteados para trás, camisa de botão meio aberta mostrando o peitoral magro que sustentávamos, calça jeans colante, cinto de vaqueiro e uma pinta de pegador. Um chapéu e pareceria um cowboy de sexualidade questionável. Patético.

Ansiedade ainda não tinha escolhido sua roupa.

Tristeza ficou na cama, vestido de cobertor. Não queria sair.

Disciplina se vestiu de militar com roupa verde e camuflada. Não sei de onde ele tirou aquilo. Estava de cabeça raspada, para minha surpresa. Eu tinha pensado em fazê-lo antes, mas agora vejo que fico bem melhor cabeludo.

Alegria usava uma camisa justa com manga bem curta que deixava seus bíceps à mostra, calça colorida e um arco na cabeça, fora várias pulseiras nas mãos e um copo cor verde neon. Parecia estar indo para um open bar LGBT.

Testosterona estava com uma camisa de academia, bermuda e tênis, flexionando os músculos inexistentes.

Raiva usava uma roupa que eu tinha usado na igreja antes, algo como o que aqueles missionários de outros países usam quando vêm fazer missão aqui no Brasil. Também lembrava aquele cara do Um Dia de Fúria, sempre irritado, como se fosse explodir. Ah, relembrando que ele era um anão, bem Tyrion Lannister em seu julgamento.

Medo era uma criança. Era eu criança com meus medos irracionais. Usava uma blusa com estampa do Ben 10, shorts jeans e sandálias cafonas que meu pai acha que ainda estão na moda.

Eu, no entanto, me trajei de uma blusa preta de Star Wars, calça jeans (preta), all star (preto) e um casaco... preto. Eu colocava o capuz e virava o protagonista hacker de Mr. Robot.

– Ai, que morbidez esse seu look, Leo. Tá muito Britney 2007 Edition. Só falta raspar a cabeça que nem o fundamentalista otário.

– Você é um canalha, isso sim. Canalha mil vezes! Isso é uma forma de mostrar que estou pronto pra guerra entre o bem e o mal. Hoje vamos para a toca de Satanás!

– SATANÁS? MEU DEUS, E SE ESTIVERMOS INDO PRA LÁ E A VAN BATER? E SE A GENTE MORRER? SOCORRO, VAMOS SER QUE NEM NAQUELAS HISTÓRIAS QUE O PESSOAL DA IGREJA CONTA.

– As histórias amedrontadoras de um jovem que desobedeceu às ordens dos pais e morreu de forma trágica?

– Em nome de Deus não vamos passar por isso!

Amém. Não que isso sirva de algo.

– Já perdeu sua fé, Leo?

É mais complicado que isso, Disciplina. Eu não quero... ah, tanto faz.

– Não quer responsabilizar a Deus ou ao Diabo pelas coisas boas ou ruins, certo? Quer estar além das entidades sobrenaturais, justificar sua falta de fé na vida com a falta de fé em tudo, principalmente no sentido da existência.

Minha Amiga MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora