Capítulo I

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BEATRIZ BAWDRICK

Desde que era criança tenho o mesmo sonho, na verdade não sei se o sonho é exatamente o mesmo, pois sempre que acordo não me lembro dele. A única coisa que consigo me lembrar é da imagem do belo homem, com grandes olhos tristes e azuis, sua face carrega uma cicatriz.

Uma vez comentei com mamãe sobre o homem, disse a ela que nunca tinha o visto, mas que ele estava lá, todas as noites.

Ela disse que poderia ser alguém que foi importante para mim em minha vida passada. Não sei se acredito nessas coisas, a única coisa que sei é que me apaixonei por aqueles olhos. Apesar da marca que carrega, nunca vi homem mais belo.

Não sei se um dia o verei pessoalmente, mas não custa nada sonhar, e se isso nunca acontecer, o que me conforta é saber que o verei enquanto durmo.

Dizem que sou muito sonhadora, que vivo no mundo da lua, mas com a realidade que vivemos, não nos resta nada além disso.

Estou ajudando mamãe com o jantar, não temos muitas opções, em alguns dias a comida falta, mas hoje saí para caçar e consegui pegar um coelho.

Sim eu caço, não é muito comum as garotas caçarem  por aqui, mas eu gosto. Papai sempre me deixou fazer o que queria, não que eu seja mimada, longe disso, mas eu vejo como são os pais das outras garotas de Eymor, as coitadas não podem fazer nada, além de ficar em casa e aprender a ser uma boa esposa. Papai sempre me incentivou a ser livre, me ensinou a ler e escrever, a caçar e até a lutar com a espada. Me ensinou tudo o que sempre sonhou ensinar à Henry, meu irmãozinho. Ele nasceu muito doente, até hoje não sabemos o que ele tem, meus pais eram muito ricos, senhores do castelo de Eymor, mas gastaram tudo o que tinham trazendo médicos dos quatro cantos do mundo, para ver Henry, mas tudo foi em vão. Houve sim uma melhora, talvez sem os médicos meu irmão não teria sobrevivido até hoje, mas está longe de estar curado.

Papai volta hoje de viagem. O nosso Reino está falido, e ele foi tentar pedir ajuda ao lorde do reino vizinho, Hawley. Ele era muito amigo do antigo Lorde Lawford, mas com sua morte, quem assumiu o posto foi seu único filho.

Ouvi histórias bizarras sobre esse tal lorde. Alguns dizem que é um vampiro, que ninguém nunca o viu, porque só sai do castelo no meio da noite, em busca de alimento. Outros dizem que ele vive trancado no seu quarto, mergulhado na escuridão, pois é filho do próprio diabo.

Para mim, são só histórias para assustar as crianças, talvez seja só um homem mal -humorado, que não gosta de ter contato com as pessoas.

Mas em qualquer uma das hipóteses , peço a Deus que ajude meu pai.

O sol acaba de se esconder no horizonte e o ensopado de coelho já está quase pronto, quando ouvimos o barulho da carruagem se aproximando.

Saio correndo em direção aos portões, a viagem foi longa, foram dez dias e, meu coração está doendo de saudades.

Quando chego ao portão papai já está entrando por ele. Me jogo em seus braços fortes e ele me abraça apertado.

— Oh querida, senti tanto a sua falta.

— Eu também papai. Contei os minutos até o senhor voltar.

Seguimos para a casa ainda abraçados.

Mamãe nos esperava chorosa na porta. Apesar de todos os anos de casados, nunca deixaram a paixão esfriar. É lindo de ver o amor de um para o outro.

— Senti saudades, minha doce Ellen. — Ele diz depois de deixar um beijo casto em seus lábios.

— Eu também, meu esposo. Mas vamos entrar, você deve estar cansado e faminto. O jantar está servido.

— Com certeza querida. Mas antes vou passar no quarto de Henry.

Já na mesa de jantar, papai nos conta como foi a viagem.

— O reino de Hawley está a cada dia mais rico. Devo admitir que  o novo lorde é um ótimo administrador , mas é um tanto peculiar.

— Por que diz isso papai — Pergunta Henry ao meu lado.

— O homem não sai dos aposentos. Quando pedi para falar com ele, me recebeu no quarto, com as janelas fechadas e nenhuma vela acesa , não consegui nem ver seu rosto.

— Realmente estranho. — penso em voz alta.

— Mas e então meu marido, ele aceitou nos ajudar?

Meu pai respira profundamente e suas feições se entristessem.

— Ele disse que não emprestaria, mas doaria o dinheiro...

— Isso é ótimo papai— o interrompo e ele me olha com os olhos tristes.

— Mas para isso tem uma condição. — Ele me encara — Ele quer a mão de Beatriz em troca.

— Minha filha não é mercadoria Patrick. Como vamos entregar a nossa filha à um homem que nem conhecemos? — Mamãe fica desesperada.

— Disse a ele que falaria com Bea primeiro, e se fosse da vontade dela, iriam se casar.

Ele olha para mim esperando a resposta. Mas o que eu poderia responder? Sinto o peso da responsabilidade nas costas. Se eu recusar serei responsável pela desgraça de todo o vilarejo. Essa era a última esperança que tínhamos, todos os dias crianças morrem de fome, pais de família,  desesperados, se suicidam e eu, tenho em minhas mãos a chance de reverter tudo isso. Eu aceitarei. Mesmo que seja infeliz pelo resto da vida, por me casar com um homem que não amo.

— Prepare o mensageiro papai. Eu aceito me casar com lorde Lawford.

— Você só pode estar louca minha irmã, você já ouviu o que dizem sobre ele? E se ele beber todo o seu sangue?

Apesar da tristeza que sinto, sorrio.

— Meu irmão, não devemos acreditar em tudo o que dizem. E veja pelo lado positivo, quantas vidas serão salvas com essa união? Não devemos ser egoístas. As pessoas estão sofrendo, estão morrendo, se posso fazer algo por eles, com certeza o farei.

Papai segura minha mão, seus olhos estão marejados.

— É uma atitude nobre minha filha. Estou orgulhoso de você.

Me limito a acentir com um movimento de cabeça.

Mamãe não diz nada. Mas percebo a tristeza em seu olhar.

— Se me derem licença — Me levanto — gostaria de me recolher.

— Claro querida. Amanhã bem cedo mandarei o mensageiro ao reino de Hawley.






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