Capítulo 16

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Joana

Fevereiro

Agora

A biblioteca era calma e silenciosa. As suas janelas estendiam-se por toda a parede, sobrando pouca parede sem vidro. Eu olhava através dela para um jardim, ainda sem flores e branco como neve apesar de ser só geada. Não me recordo de um inverno tão frio e bruto como este. A minha camisola grossa de lã não servia para me impedir de tremer e mesmo as minhas botas não eram quentes o suficiente para manter os meus pés aquecidos. Sentia que não sentia nada. O Miguel chegou vindo da outra ponta da sala onde havia uma pequena área de computadores. Vinha acompanhado por uma rapariga linda de cabelo ondulado, eu já a conhecia, Rita. A melhor amiga da Inês, a rapariga que tinha dormido com o namorado dela. Vinham os dois de braço dado e riam-se alto até uma senhora de meia idade os mandar calar. Olhei para ele por cima dos meus livros de química, observando os seus movimentos perfeitos, aqueles que me deixaram sozinha rodeada de estranhos numa festa. Nunca mais tinha falado com ele nem com Maria e sinceramente depois daquela saída atabalhoada de cada dela não me parece que ela me queira ver outra vez. Assim que o Miguel cruzou o olhar com o meu, despediu-se da rapariga e rumou até á minha mesa. Sentou-se e tentou pegar me na mão que acabei por desviar.

-Joana eu lamento tanto.

Não lhe repondi.

-Já passaram 3 meses, tens de me perdoar.

-De onde conheces a Rita?

Ele olhou atrapalhado para mim.

-Porquê?

-Curiosidade.

-É uma velha amiga minha. -desbloqueou o telemóvel para ver as horas e voltou a mete-lo no bolso.-Já podemos fazer as pazes?

Suspirei fundo. Nunca mais ia confiar nele. Rancor é um sentimento que guardo com muito carinho apenas para não ser enganada mais uma vez.

-Sim, podemos.

Ele sorriu-me e desta vez deixei-o pegar-me na mão. Ele achava que o tinha perdoado mas ele estava tão errado. Ou talvez não. Gostava de não acreditar nas pessoas.

(....)

Naquela manhã decidimos acabar o estudo em minha casa. Mal parámos o carro á entrada, a minha mãe veio á varanda e acenou. Ela adorava receber visitas, queria dar aquela imagem de perfeição que a vizinhança tanto gostava. O meu pai não tinha voltado para casa nem eu sabia algo sobre ele desde aí. Claro que a minha mãe tinha pensado em tudo e inventou uma história sobre uma amante, naquele bairro toda a gente engoliu a história e ficou o meu pai com o papel do vilão. Não é que eu não concorde, ainda estou desiludida por ele não querer saber de mim, mas sejamos sinceros, o vilão da história é a minha mãe. Ela é doida e eu estou presa com ela.

O Miguel fez questão de fazer conversa de circunstância com a minha mãe enquanto esta fazia um lanche da manhã para nós. Eu fugi daquilo e fui diretamente para o meu quarto estudar. Estava eu já a copiar umas coisas para o meu caderno de química quando um telemóvel começou a tocar, primeiro pensei que fosse o meu mas ao desbloquear e ver que não tinha nada, calculei que fosse o do Miguel. Num toque de curiosidade dei uma olhadela ao telemóvel pousado de cima da minha cama que apitava repetidamente com mensagens. Todas elas da Rita. Num misto de raiva e curiosidade, li as mensagens, todas elas super confusas mas uma ficou-me na cabeça:

«Imagina o que diria a Joana se soubesse o que fizeste à Inês. Nem digas que é mentira, eu conheço-te e toda a gente vai descobrir.»

Passou-me imensas coisas pela cabeça. Todas elas piores que as anteriores e pensei se ele seria o rapaz daquela noite, se ele teria matado a Inês. Mas porquê o faria? Não deu tempo para aprofundar o assunto porque nesse momento Miguel entrou de rompante no quarto e tirou-me violentamente o telemóvel das mãos. Não parecia ele, provavelmente não o conhecia de verdade.

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