DEZOITO - O manipulador de fogo

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O som de minha bota no chão de pedra ecoou pela sala completamente vazia. Raphael andava ligeiramente a minha frente, indicando o caminho pelos corredores complicados, seus passos decididos combinavam perfeitamente com sua personalidade. O manipulador de fogo era bem diferente naquele lugar, confiante e um líder, mas ainda eu o via perfeitamente, o mesmo garoto que tinha conhecido na mansão, leal, corajoso, e incrivelmente quente.

— É sempre assim? — Perguntei antes que ele pudesse dizer qualquer coisa. — Esses treinamentos, são sempre particulares?

Vi o canto da boca de Raphael se levantar ligeiramente. Limpei a garganta.

— Quer dizer... Não é que esteja reclamando... Você é ótimo... Professor...

Ele sorriu, e algo profundo em mim pareceu se derreter.

— Não. — Admitiu. — Recrutas novos não costumam ter treinamentos particulares.

Franzi o cenho.

— Theodora...

Soltei o ar.

— Acho que não pode falar. Não precisa, não quero que se meta em problemas. — Falei.

Raphael prendeu seu olhar no meu por alguns segundos, antes de dar um passo em minha direção.

— Gava está interessada em seu poder. Acha que seu elemento é a única maneira que temos de vencer a ordem. Muitas pessoas morreram no centro político, e várias estão morrendo todos os dias com as rebeliões nos quadrantes e nos moquifos que estouram todos os dias contra as ações da ordem. Eles estão usando os prisioneiros e doentes como cobaias, e estão desesperados para encontrá-la.

Eu não esperava aquilo. Raphael sustentava seu olhar no meu, minha respiração estava pesada, e não vi nenhum pedaço de hesitação no rosto do manipulador de fogo quando ele me contou tudo aquilo.

Ele respirou uma vez antes de se aproximar mais um passo. Estávamos tão perto que eu pude ver cada brilho dourado em seus olhos negros, e pude sentir a profundidade de sua mente. Ele fechou os olhos por um instante, e os reabriu, abrindo com eles a janela para seus sentimentos, minha habilidade rapidamente os capturou, passeando pelo que antes era um escudo frio e impenetrável. Tentei me retrair, tentei não invadir. Mas a conexão de sentimentos era fácil demais para que eu pudesse evitá-la, e ele sabia disso, estava fazendo de propósito para que eu pudesse ver.

Raphael escondia muito. Eu senti um peso que determinava cada ação que tomava. Enquanto meus olhos encaravam os dele, senti culpa, determinação, raiva.

— Veja. — Ele falou. Comecei a balançar a cabeça quando mais uma vez uma onda de certeza me atingiu. — Por favor.

E então eu fiz. O link de memórias se formou.


— Não posso impedi-lo de ir. — A visão de Jase, tomou meus sentidos. — Mas Raphael, não precisa disso. Eles não iriam querer isso para você.

Eu estava sem fôlego, e o suor pregava minhas roupas ao meu corpo. Podia sentir todos os músculos de meu corpo arderem, e formigarem.

— Não vai me treinar mais se eu for? — A voz mais jovem de Raphael saiu de meus lábios. — Não poderei mais morar aqui se for?

Jase passou a mãos pelos cabelos pretos e deu um suspiro exasperado antes de responder.

— Aqui é sua casa, garoto, sempre vai ser. Mas você tem quatorze anos! Eu confio minha vida a José, mas não é seu papel vingá-los. — Meu pai falou. — O que deve fazer é crescer bem, até que seu elemento desperte, e então viver normalmente. Sem Ordem. Sem conspirações. Sem mentiras. Sem morte.

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