Capítulo 38: Klaus

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Aquele barulho insistente estava enchendo os meus ouvidos de agonia e a minha cabeça de dor. Onde quer que o grilo estivesse, eu o mataria.

Abri os olhos aos poucos, mas os reflexos rápidos me fizerem querer levantar, e bati com a cabeça em algum suporte em cima de mim, cego pelo sono, pelo cansaço e por todo o resto.

Recoloquei a cabeça no travesseiro, levando minha mão à testa e xingando todos os santos existentes. Será que o som vinha de dentro de mim ou uma britadeira tinha resolvido se instalar ao meu lado?

Virei de bruços e fui descendo da cama aos pouquinhos, pelo menos eu achava que aquilo era uma cama. Certamente tinha a maciez de uma. Meu estômago revirou quando meus joelhos bateram no chão com força, e eu tentei abrir a boca para reclamar com mais classe. Meu hálito estava fedendo e eu nem precisei senti-lo para saber. Parecia que eu tinha comido borracha queimada. Aliás, eu inteiro estava fedendo.

Fechei os olhos mais uma vez, e abri lentamente, absorvendo a luz forte do ambiente e essa sensação nada boa de uma ressaca terrível. Alguém estava na minha frente. Primeiro eu vi os pés, num sapato elegante de pele de crocodilo, ou algo assim. A calça era passada a alinhada, e o terno era perfeito no corpo grande do homem. O rosto dele estava embaçado, então eu voltei a repetir o processo de consciência mental que consistia em abrir e fechar os olhos repetidas vezes, quase como um programa de edição de imagem que fica dando repeat na situação.

Aos poucos o ambiente foi clareando, e eu identifiquei o quarto neutro e sem nada mais além de móveis. Era azul com branco, com janelas enormes. Malditas janelas! Esse tipo de luz deveria ser proibida para qualquer pessoa que acaba de acordar ao som de uma britadeira e de ressaca. Eu poderia ser um vampiro e estaria derretendo nesse minuto.

Quando senti que meus olhos começavam a colaborar, os abri de vez e com vontade. Ainda estava no chão, agarrado ao lençol da cama com uma mão, e suportando meu peso morto com a outra. Voltei a fitar o homem, e sabia que o conhecia de algum lugar, pelos dreadslocks no cabelo e o brinco de ouro em forma de pena na orelha, só não tinha certeza de onde.

— Bom dia, senhor Hunter!

Minha cabeça zuniu.

— Será que dá para você falar mais baixo? — resmunguei. — E que merda de barulho irritante é esse?

Ele acenou para alguém, e o barulho tinha acabado. Forcei minhas pernas e consegui sentar na cama, com a maior quantidade de classe que consegui reunir, ou seja, nenhuma.

— Onde estou? — Perguntei estalando o pescoço, fazendo um barulho estranho.

— Rua das Laranjeiras, nº 147-B. Zona Lesta de Assunção. — A voz grave e contida do homem à minha frente veio com firmeza, me deixando arrepiado.

Assunção. Tudo bem, eu me lembrava de ter vindo para Assunção. Queria ver Katarina. Na verdade, precisava ver Katarina. Mas Rua das Laranjeiras por acaso não era...

— Klaus! — Minha linda e loira irmã emburacou pelo quarto e ficou entre mim e o grandalhão na minha frente. — Quem você pensa que é para invadir a casa dos outros desse jeito, moço?

Ela perguntou e eu quis abraça-la. Votaria nela na próxima eleição. Katarina era forte e indelicada. Parecia bastante com...

— Ele é meu irmão e está na minha casa sob minha custódia! — Ela gritou

— Custódia? — O homem perguntou, sorrindo — E você quem é? O rei da Inglaterra?

Katy enrijeceu a coluna, soltou um suspiro profundo, e deu um passo à frente, na direção do homem. Era tão pequena perto dele, que parecia que ele a pisaria com o crocodilo do pé a qualquer momento.

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