Poucas vezes eu tinha a opção de tirar folga por algumas horas, e aquele era um desses momentos. Sempre gostei dessa clareira que ficava na saída leste da cidade. Era profunda e silenciosa, sem o barulho do rio, só algumas cigarras e o vento fazendo sua dança eufórica. Era uma noite sem estrelas e carregada de nuvens escuras e assustadoras. A chuva logo cairia, mas eu não queria me mexer. Estava extremamente bem acomodada. Quase ninguém passava por aquela estrada pela noite, principalmente se uma festa de arromba estivesse acontecendo no Centro, como era o caso.
O dia tinha sido bem puxado. Gustavo sugou de mim até o que não tinha. Provei para todo mundo que além de cantar, também podia dançar. Isso foi péssimo porque me rendeu mais uma cena com Rany e um pedido neurótico para que eu fizesse um solo em outra canção. De jeito nenhum que eu faria um solo!
Sai de lá devendo uma roupa lavada para a menina que tinha me emprestado aquele pedaço de pano que ela dizia se chamar roupa de exercício. Por isso os caras da escola não tiravam os olhos daquelas garotas, elas andavam por ai com roupas compradas na sessão infantil. Claro que me senti depravada vestindo aquilo, mas eu gostava de provocar Klaus e naquela manhã ele estava especialmente irritante. Acho que ainda estava com raiva de mim pelo modo um pouco... obtuso com o qual eu tinha falado com ele na casa do meu irmão. E tudo bem que passei aquele final de semana inteiro me sentindo uma idiota, já que eu realmente tinha sido uma, mas não deixaria ninguém se aproximar de mim pelos motivos errados, inclusive Klaus.
O garoto era corajoso e altamente provocante, e tenho autoridade para dizer isso, visto que meu corpo entrava em colapso todas as vezes que ele resolvia ser legal ou sussurrar ao meu ouvido. Eu tinha quase certeza de que ele fazia de propósito para saber até onde eu iria sem bater nele, mas em alguns momentos, principalmente quando ele olhava fundo nos meus olhos, me sentia como se eu pudesse saltar de avião sem paraquedas porque sabia que ele me seguraria lá embaixo. Sei que isso não faz sentido algum, mas era o que sentia. Claro que eu dispensava metade das coisas boas que sentia.
Meu telefone tocou de dentro do carro e eu pulei do capô.
— E ai gata garota! — Era Rany e mais um barulho imenso de várias pessoas gritando juntas.
— Mas que inferno é esse? — Perguntei afastando o aparelho do ouvido. — Estamos vivendo um apocalipse zumbi?
Ela riu.
— Quero saber onde você esta. Pensei que viria para a festa da cidade. Tem muita coisa bacana para escrever no jornal. Você sabia que Luana está ficando com aquele idiota do Rubens?
Era realmente uma chance de ouro, mas eu não estava no clima, principalmente para a vida amorosa de Luana e Rubens.
— É, resolvi tirar umas férias por hoje, estou exausta. Mas você pode anotar tudo e depois conversamos.
— Sei bem como Gustavo pode ser antipático. –—Rany resmungou do outro lado e escutei algo caindo. — Desculpa, cara! — Ela falou com alguém. — Mas o resultado foi excelente!
— É. Foi mesmo não é?
Nos duas rimos um bocado da minha presunção. Mas eu a merecia, ora bolas! Tinha feito a mesma cena tantas vezes que provavelmente sonharia com ela por alguns dias.
— Então o que a digníssima Lorena está fazendo nesse momento? — Ela perguntou com uma voz cansada, como se estivesse andando.
— Estou comendo uma pizza maravilhosa em cima do capô do meu carro, curtindo o céu nublado da estrada leste.
— Sozinha?
— Você está mesmo me perguntando isso? — Me senti ultrajada por ela achar que eu precisava de alguém para me divertir. Talvez realmente fosse mais divertido com alguém, mas eu era Lorena Sanchez, e pessoas não gostavam de se divertir comigo.
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A Mais Bela Melodia
RomansaA história de Lorena e Klaus se passa em Esperança, uma cidade pequena, onde vivem entre as desavenças na escola e conflitos pessoais, levando uma cidade inteira a presenciar os escândalos de uma adolescente rebelde e seu rival popular e repleto de...