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                      17 de maio de 2025

    Vários dias de uma lista, que qualificava como os mais importantes da minha vida eram relembrados hoje, e com eles o desejo de festejar fazia sentir-se. Como prometido, minha filha me ajudava com as decorações do apartamento para o pequeno convívio que seria realizado esta noite. Luzes, velas e louças de diversos feitios e cores complementavam o ambiente festivo. Ambos meus pais chegaram mais cedo trazendo com eles Natan que se voluntariara para ajudar minha esposa, Enquanto eu e os mais velhos lidávamos com tarefas caseiras minha esposa encarregava-se das compras e itens de última hora. Duas horas depois da sua saída eu recebera uma mensagem de que a mesma estaria vindo ao nosso encontro, o que não tardaria a este ponto. Um sentimento de felicidade me invadia com a imagem de minha progenitora e meu rebento. Meu pai oferecia-lhe agora um presente enquanto a mais velha auxiliava na missão de abri-lo. Ella correu para mim assim que avistou o conteúdo.

— Mamã, olha! — estendeu o pequeno urso de pelúcia com um brilho no olhar que me encantara.

— É lindo, filha. Agradeces-te?

Acenou com a cabeça correndo de volta para os mais velhos. O tema de conversa não chegara até meus ouvidos mas sabia que ela tinha realizado a boa ação.
De repente como um cuco marcando a hora, meus ouvidos captarem um grito alto vindo do lado de fora da casa. Olhei pela janela numa tentativa de matar minha curiosidade levando minha família a recriar o movimento. E o ar prendeu no meu peito junto aos meus olhos arregalados ao ver o meu veículo parado do lado de fora e uma figura alta masculina diante da porta entreaberta do mesmo. Pedi que minha mãe supervisiona-se minha filha durante minha busca por respostas. Desci as escadas o mais rápido que podia para averiguar o que estaria acontecendo.
Minha esposa encontrou meu olhos por cima do ombro da figura desconhecida por meros segundos, vi uma pitada de medo em seu olhar que fez cada célula de meu corpo gelar por inteiro, e em poucos segundos desviou seu olhar para o desconhecido outra vez. Sentia o corpo imóvel, tenso, as respiração forte de minha esposa se refletia na minha própria, estava apavorada com o que poderia estar acontecendo com minha mulher do lado de fora. Durante a onde de confusão, o homem barrava Alexa, retirara do seu bolso uma arma, preta se assemelhando ao negro que meus olhos claros enfrentavam agora. Dei um passo leve em frente obrigando meu corpo a intervir, mas fui parada por um leve e discreto aceno de minha esposa me avisando para permanecer no lugar. Me recusava a parar. Avistei Natan, em lágrimas no lugar traseiro, forcei meus lábios a abrirem um sorriso para o menor, fazendo-o saber que tudo estaria bem e acabaria logo. A figura masculina falou mais alto me deixando assim entender a situação.

— Sai do carro! — gritou apontando a arma para minha companheira.

— Não. — engoliu em seco. Ela sabia que meu irmão se encontrava no banco traseiro e não deixaria que ele o leva-se junto com o automóvel.

— Tu achas que tens escolha? - aproximou o cano da zona lateral da cabeça de minha esposa.

Minha mente forçava-se a encontrar uma solução, que retirasse meus mais preciosos da situação sufocante em que se encontravam. Uma ideia me ocorrera. Fiz sinal deixando Alexa saber que iria avisar Natan para que ao meu sinal escapa-se da viatura para assim ela deixar a pessoa tomar o carro, mas essa era de longe a personalidade de Alexa e algo no seu olhar me informava que ela não estaria disposta a deixa-lo levar um dos nossos bens. O sangue corria dentro de mim com rapidez, obrigando meus pulmões a dispersar o ar com força. Encontrou meus olhos por momentos, assentiu com a cabeça levemente e meu coração soube que seu adeus caso o seu plano não tivesse o melhor desfecho. Sem que eu pudesse fazer ou dizer algo, minha esposa movimentou seu braço no intuito de retirar a arma da mão do mais velho e... e...

Silêncio. Um agudo infinito que adormecera meus ouvidos. Em algum momento o gatilho fora pressionado e sem tempo para intervenções, sem tempo para fazer o próprio tempo parar,    a bala saíra disparada em direção á cabeça daquele que era o amor da minha vida, penetrando cada camada que a compunha, manchando cada fio de cabelo de um vermelho escuro. Meu coração se recusava a realizar uma batida que fosse. Os passos não acompanhavam mais o ritmo das pernas, cada movimento meu era inconsciente, desfaleci sentindo o impacto da pele fina dos meus joelhos contra o asfalto ríspido. Um mundo de pessoas em volta de um corpo poderia ser visto. Aproximei-me ignorando a dor das feridas abertas em minhas pernas, que quase não era sentida, apenas a dor que fazia sentir-se em meu peito que piorava a cada milésimo de segundo, fazendo-me desesperar a cada passo que dava. Bati as palmas das mãos uma na outra livrando-me da poeira e retomei a corrida ainda desacreditada, tudo ao meu redor era um borrão, e mesmo que sem querer, pedi-a a todos e quaisquer deuses existentes e inexistentes que aquela cena fosse irreal.
Os olhos presos num loop de movimentos inquietos, revirando, a luta para viver se transmitia através de tremores nas mãos do corpo moribundo de minha esposa estendido naquele chão frio em semelhança á minha alma. E então, encontrou finalmente paz nos meus olhos á medida que meu corpo se ajoelhava do seu lado, que enfim chegara para encarar uma ferida que jamais se fecharia. Vendo-me ali sua expressão mudara completamente ao encontrar meus olhos, era leve, sem dor. Não havia dúvidas que sua alma tinha sido levada e agora era apenas eu e o mundo. Lágrimas desesperadas desciam por meu rosto, percorrendo com minhas mãos cada centímetro do corpo que esfriava a cada segundo que passava, pousando em sua face fria, e um aperto em meu peito como se eu sentisse cada fissura que abria em meu coração que partia. O vazio havia se instalado em mim de uma forma que eu não saberia se algum dia iria mudar. Sem que uma palavra fosse expelida de minha boa, até expelir o errado.
— IDIOTA

Talvez para uns atravessar meros centímetros de baixo de uma escada fosse superstição de azar, talvez para  outros azar era a tradução de consequências de atos outrora mal empregados, e para uma minoria azar era mero mito de ancião. Pessoas normais lidam com dias bons e maus dispersados por dias aleatórios durante o ano, ou durante a vida. Existe ainda a dúvida se algures se esconde uma imunidade a sofrimento.
Para mim sorte e azar eram parte da realidade que compunha a minha vida e resumida a 17 de maio. Então que hoje seja o fim. 17 de maio.

Fim.

17 De MaioOnde histórias criam vida. Descubra agora