Um feiticeiro negro e uma garota.

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Aquela era uma das diferenças entre ser um lobo solitário e se aventurar com alguém. Cada dia era diferente do outro porque não controlava minha companhia e eu tinha motivos para agir de novas formas, além de ter que ficar atento ao que ele fazia.

Passei quase toda a noite correndo para achá-lo, até que um riacho trouxe à tona a sede e fiz uma parada para beber água. O sol em breve nasceria e eu precisava continuar e encontrar Luahn o quanto antes. Subitamente, ouvi um uivo próximo e me fiz correr novamente. Logo pude sentir cheiro de lobos e minhas energias se renovaram, apesar de não achar rastros do feiticeiro mestiço naquela área.

Pouco antes de chegar ao encontro dos selvagens estranhos, escutei as movimentações nos arbustos e captei o que disseram:

"Algo está vindo! Corra!". Em seguida vi as caldas por um breve segundo, se embrenhando nas sombras da mata.
Naquela perseguição, não me pareceu ter mais que dois lobos na minha frente, que não se separaram na correria.

"Avisei para você não responder!" Falou um deles durante a fuga de mim. Eu podia ouvir o que diziam na mente, era a forma de lobos se comunicarem, e há muito tempo havia me esquecido como era ouvir outro.

Com o alvorecer, consegui enxergar uma cauda cinza escura de um lobo a minha frente, era questão de metros e eu poderia pegá-lo. Porém ouvi um ganido ao lado e logo um reboliço de terra, galhos e folha. Uma queda! Desviei o caminho e fui para cima da criatura. Avancei e mordi mal, pegando na lateral do rosto, soltei para agarra um ponto melhor, mas parei. O lobo de pelos bagunçados estava tão apavorado que dava mordidas no ar como louco, se remexendo no chão com ganidos e rosnados, sem se levantar ou olhar o que estava realmente acontecendo. Até sua aparência era esquisita, branco sujo com uma mancha preta sobre um dos olhos. Dei um passo para trás e ele continuou se movendo como uma minhoca assustada, na verdade, percebi que era uma fêmea.

Um barulho nos arbustos chamou minha atenção e logo o segundo lobo apareceu, parando de súbito e me encarando tenso. Este tinha um olho castanho e outro azul e seus pelos bagunçados era rajado de cinza escuro com partes mais pretas. O lupino observou a colega e depois para mim, recuando um passo, hesitante e parecendo querer fugir. Rosnei e com isso até a fêmea parou quieta, de barriga para cima. Percebi que não iam revidar e que não eram ameaça.

"Não me coma" pediu o que estava no chão. Mostrei os dentes, em desprezo.

"Onde está o mestiço?!" questionei, irritado.

O cinzento estranhou minha pergunta, olhando a colega, depois a mim:

"Não sabemos de nada. Somos apenas nômades atrás de novas áreas de caça".

"Estavam falando com eles! Não acredito em vocês!" Rosnei de novo e avancei para morder a loba caída próximo.

"Espera!" parei e olhei o cinzento: "Só queríamos informações sobre o que está acontecendo. Pareceu uma boa ideia encontrar uma alcateia onde pudéssemos viver melhor".

"E também ele é curioso" comentou a fêmea branca.

Eu os desprezava. Eram apenas lobos vagantes com algum motivo para terem sido afastados de suas alcateias originais e estavam atrás de redenção. Podia sentir o cheiro do medo e inferioridade deles.

"Viram algum humano perdido na floresta?" Perguntei.

"Você cheira a sangue de homem, vai comê-lo também?" o cinzento pareceu empolgar-se de leve.

"Só me responda!" Pisei na fêmea, irritado, conseguido um ganido de susto e ela respondeu:

"Houve um humano jovem!". Afastei-me para ouvi-la e a loba aproveitou para levantar-se. Seus pelos eram longos, sujos e bagunçados, ela mal passava de minha cernelha, na verdade, os dois eram menores que eu e mais jovens. "Ele foi levado por um feiticeiro no final do dia passado."

O Lobo-Homem e o Feiticeiro MestiçoOnde histórias criam vida. Descubra agora