A aparição

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[Fiel]

O fim da tarde se aproximava na medida em que começava a nova viagem do feiticeiro mestiço e seu mestre. O mato crescia sobre o caminho da estrada mal usada que era ladeada por arvores, havendo sombra e luz.

Luahn ainda estava empolgado com o que descobriu naquele dia, porém compartilhava seus pensamentos com seu mestre feiticeiro. Eu tentei ignorar a conversa deles, andando sempre ao fundo, depois do cavalo, só porque não gostava daquele velho, mas quando ouvia o garoto rir acabava olhando interessado em entender. Apesar dessa reação logo lembrava porque não estava de bom humor com aquele grupo. Mejen era quem me fazia ficar longe, não podia confiar nele, qualquer movimento e ele sim era capaz de lançar um feitiço contra mim novamente, e considerando que o mestiço ainda tinha o que aprender, seu colar podia não me proteger novamente.

Aos poucos, ouvindo a musica do chacoalhar dos pingentes em meu pescoço enquanto caminhava, eu me distraí da solidão, lembrando das razoes e momentos até eu ter aquele presente de Luahn.

A estradinha tinha uma curva na nossa frente. Antes dela, eu parei de súbito, facilmente me sentindo tenso e preocupado, uma sensação tão repentina que meus pelos eriçaram e olhei em volta. Havia algo vindo, não havia nenhum cheiro novo no ar e não dava para saber o que era, nem da onde viria, pois parecia ter nos cercando. Rosnei, sendo percorrido por um calafrio que me deixou mais nervoso.

— Fiel? — ouvi Luahn com um tom preocupado e o olhei. Deu para entender pelas expressões dos dois humanos que também sentiam algo, afinal a magia os deixava mais receptivos ao que não se pode enxergar.

— É melhor seguimos em frente — Mejen orientou com tom sério. — Seja o que for, será bom estarmos o mais longe possível daqui.

Eu concordava então corri para mais perto do mestiço e caminhamos próximos e calados. A sensação continuou conosco, até seu ápice depois da curva...

De repente, um vento gradativo agitou o interior do túnel verde, criando uma chuva de folhas e levantando um pouco de poeira. Nós paramos confusos, sentindo que aquele era o momento da coisa se mostrar, e o ambiente pareceu escurecer-se, o que agitou o cavalo cinzento de Mejen. Nervoso, também me movi e assumi a forma humana, puxando a minha espada que Luahn carregava no cinto e ficando pronto para enfrentar o que viria.

Por alguns segundos houve apenas o vento e nossa plena atenção ao redor. Então surgiu um espectro gigante, brilhoso e turquesa mergulhado do teto de folhas e bloqueando o caminho à frente. Era um par de pernas que desceu e depois o resto de um corpo gigante, resultando num tipo de fantasma florescente de um humano bem alto, mas seu rosto e detalhes não ficaram definíveis em meio ao seu brilho de áurea pura. Apesar de ser uma presença excepcional, não havia hostilidade dele conosco, por isso nenhum de nós três reagimos, mas ficamos atentos a figura de movimentos suaves.

“Fujam” — soou uma voz feminina com ecos no ambiente enquanto a face da figura nos encarou do alto, causando um leve arrepio na nuca. — “Não prossigam nesta direção” — avisou e algo me dizia para ouvi-la. Mas Luahn deu um passo na direção dela, admirado e curioso, e chamou a atenção especifica de seus olhos brilhantes. O mestiço ia abrir a boca para falar alguma coisa, mas ela lhe disse: — “Ele está à procura de um de vocês... Um que tem o que ele precisa para permanecer aqui.”

Após dizer isso, de repente, a gigante figura virou o rosto para lado, como se enxergasse um ponto além que das copas das árvores e colinas bem a sua frente, e qualquer pequeno sinal definível de sua expressão mostrou concentração e preocupação. Assim, dando um largo passo na mesma direção como se iniciasse uma corrida, o fantasma invadiu a borda do caminho já desaparecendo no ar, acompanhada de uma brisa no mesmo sentido. Tudo voltou ao normal.

O Lobo-Homem e o Feiticeiro MestiçoOnde histórias criam vida. Descubra agora