~Meio humano~

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~Luahn ~

Assim como eu, Carlyne encarava Fiel, mas seu movimento de rosto, com expressão preocupada chamou minha atenção e logo ouvi os rosados próximos. Névoa e Carvão haviam negado entrar na casa conosco, porém, de repente, estavam ao lado da mesa, encarando Mejen ao mostrar os dentes e lançando breves olhares para a mulher e até para mim com leve desconfiança.  

Era uma situação carregada e confusa. Eu havia acabado de descobrir que não veria minha mãe mesmo após a morte, porque ela era eterna com a lua, e o homem que me criou podia ser atacado. Mas eu não podia fazer os irmãos deixarem de defender Fiel, era a função deles no bando, os compreendia.

— Pare com isso Mejen, por favor — pedi ao meu mestre, que ainda estava concentrado. — Ele já está sofrendo demais. Deixe-o, pois não vou conter os lobos — indiquei a dupla com um movimento de cabeça e o feiticeiro os notou.

— Está bem — soltou-o, movendo a mão que sustentava seu feitiço.

No mesmo segundo, Fiel se levantou da mesa com uma expressão séria e incomodada e saiu da casa sem olhar para ninguém, assumindo a forma lupina logo depois da porta e sendo seguido pelos seus dois companheiros menores.

Por um tempo, observei aquela saída pensando em ir atrás dele e dar uma razão para que ele não tivesse rancor do homem que me criou. Contudo, meus pensamentos se desviaram, ecoando suas palavras, todas elas, numa tentativa de guardar os detalhes daquele pedaço da minha história e família que Fiel contou.

— Mejen... — sussurrei ainda mergulhado nas informações. — Ele disse... — olhei-o, confuso e incerto se havia ouvido aquilo ou não — para que eu nascesse humano? O que significa?

 Logo após perguntar, eu tive minha suspeita de resposta e ela parecia uma peça disforme e inacreditável que ligava os acontecimentos da lua cheia e o meu nascimento. 

— Luahn... — ele apoiou a mão sobre a minha paternalmente, notando que eu ainda estava atordoado na estranha situação de não conhecer minha própria origem e não ser mais apenas um humano com dom de magia. — Eu não sei sobre seu pai. Alana era jovem e nunca me disse algo confiável de quem ele realmente era. Ela sempre mudava a história a cada vez quando eu buscava saber. Na verdade, — sorriu de leve — vocês dois fazem isso, às vezes mudam o foco da conversa ou brincam com a verdade quando lhes convém.

Não acompanhei a nostalgia dele, que sorria de leve e queria que me confortar. Eu ainda estava suspenso e sem reação, pois aquela vida de jovem feiticeiro, de repente, não era mais a mesma.

— Bom, pelo que eu entendi de tudo... — Carlyne disse receosa e interrompendo o silêncio que ocupou a casa. — Você tem uma metade não humana. E a julgar pela criatura que se transforma em algumas noites... — encarei-a, entendendo sua linha de pensamento — você tem uma grande ligação com os lobos.

Arregalei os olhos e me levantei bruscamente, indo atrás de Fiel o mais rápido que podia. Já que Mejen não sabia, o lobo teria que me dar mais algumas explicações.

Naquele inicio de tarde, enxerguei Fiel deitado perto do canteiro de chás e temperos, um lugar que eu também gostava pelo aroma calmante das plantas, mas foquei-me. O lobo cinzento me notou  ainda longe e levantou-se, caminhando para mais distante com a cauda baixa e nenhuma expressão além das orelhas baixas de incomodo. Corri para alcançá-lo, chamando a atenção de Carvão, que cavava a terra distraído, e da irmã, deitada na sombra da moita de um chá.

— Eu quero mais respostas! — disse-lhe quando estávamos mais próximos e quase perto de uma das cercas da fazenda, distante da casa. Fiel parou e virou-se, silencioso. — Desculpe o Mejen, ele apenas não te conhece ainda...

O Lobo-Homem e o Feiticeiro MestiçoOnde histórias criam vida. Descubra agora