Onde vivem os humanos

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Era noite e pouco antes de chegar ao fim da ponte notei que havia duas pessoas junto do brilho de um lampião. Uma delas correu na minha direção, não me espantei ao reconhecer Luahn, que realmente havia me esperado como tinha dito. A garota me alcançou, envolvendo os braços em meu pescoço, colidindo seu corpo ao meu e me apertando com um inspirar forte.

— Finalmente! — disse ela contra meu ombro. Estranhei que ela não tivesse suas coisas consigo. Murmurou: — Não estrague a cena, Fiel, abrace-me de volta, ele está olhando! — Obedeci, envolvendo-a e levando os olhos para a pessoa com a luz que começou a se aproximar. Pude farejar seu cheiro, era o mesmo cavaleiro que a trouxe para a cidade.

— Porque ainda está com ele? — questionei sem soltá-la.

— Ah, eu tentei me livrar dele, mas... — seu tom era aborrecido e aninhou-se, deixando seu abraço menos estrangulado — ele disse que se procurava comigo e que não podia me deixar sozinha aqui. E eu acho que — riu — está apaixonado por mim.

Apertei a mestiça contra mim quando ele parou ao nosso lado, nos olhando, não podia deixá-lo roubá-la de mim novamente... E Luahn me soltou e empurrou.

— Irmão, este é Octavian — ela sorriu ao apontar o cavaleiro ruivo que estava com vestes comuns.  Olhei-a quando me chamou de irmão e depois rapaz falou comigo:

— É um prazer conhecê-lo! — estendeu a mão para mim, num cumprimento que já vi antes, e apertei-a. — Sua adorável irmã disse-me que se separaram no caminho para Prata Leal. Deixa-me feliz saber que chegou bem.

Ele sorria simpático, analisando-me, talvez visse que nós não nos parecíamos muito para sermos irmãos.

— Ah! Aqui estão suas coisas — Luahn distraiu-me de afrontar o olhar dele, soltando o cinto com espada e faca e me entregando. — Octavian arrumou um lugar para passarmos essa noite na cidade apesar de eu ter dito que não era necessário.  — informou-me e olhou para o rapaz, o mesmo sorriso de antes para ele, como se o admirasse.

— Não é nenhum esforço para mim — ele sorriu de volta. — Descansarei melhor sabendo que serão bem tratados na cidade.

Passei a crer que o rapaz apreciava qualquer oportunidade de ter atenção da mestiça e que, na verdade, não era o cavaleiro, mas Luahn que deixava abertura para ele ser iludido de ter alguma chance intima com ela.

Após isso fomos guiados pelas ruas de pedras da cidade populosa chamada Prata Leal, onde Octavian havia crescido e sabia dos detalhes dos melhores lugares, tanto que não parou de conversar com Luahn, comentando como as terras eram valiosas pelo metal que era extraído nas minas e pela população que gerou homens de nome famosos por seus conhecimentos e feitos no mundo.

Ali a noite era diferente da do vilarejo onde encontrei o mestiço, não havia ruas desertas e nem o silencio de paz, as pessoas estavam em todos os cantos, surgindo de becos e até correndo, os lampiões espalhados no alto das vias mais importantes criavam uma confusão de sombra e luz dourada para meus olhos, me deixando em alerta e tenso, e os sons às vezes eram súbitos, conversas altas, xingamentos e coisas assim, até mesmo um gato caiu de um telhado e saiu correndo, e eu jamais poderia definir um cheiro para seguir no meio daquela confusão.

Em um dos cruzamentos de ruas, onde as casas costumavam ser altas, havia mulheres paradas que observavam as pessoas. Um delas, de cabelos longos, negros e com cachos, analisou Luahn e Octavian que caminhavam alguns passos na minha frente; ela sorria de leve, balançando o corpo como se ouvisse uma musica que não havia no local e nem eu podia ouvir. Quando passei por ela, a mulher me parou, estendendo a mão e tocando meu tórax. Olhei-a e ela abriu um sorriso mais largo.

O Lobo-Homem e o Feiticeiro MestiçoOnde histórias criam vida. Descubra agora