Não quero ficar sozinha, mas Gabriel precisa trabalhar. Isso é uma droga.
Essa casa é tão grande e silenciosa. Para ajudar, a chuva de ontem a noite arrancou a antena da televisão. Como se não pudéssemos ficar mais ilhados do que antes.
Sem celular, internet, televisão e até contato humano. Vou enlouquecer.
— Não vai, anjo, você vai ficar bem. — Gabriel se olha no espelho do saguão e briga com a gravata. Sua pasta está entre as pernas, e ele torce o tecido, até que desiste. — Vou sem.
— Nem pensar. Eu faço. — Me voluntario. — Posso? Se for bizarro demais...
Gabriel nega com a cabeça, desacreditado.
— Bizarro deve ser eu te chamando de apelido fofo o tempo todo e só depois pensando que eu sou um homem estranho para você.
Um homem estranho para você.
Suas palavras são tão doloridas.
Não quero esse clima entre nós. Seremos amigos, pelo menos.
— Então, vem cá. — Chamo-o com a mão. — Levanta a cabeça.
Puxo sua gola para cima e passo o tecido de cetim em volta de seu pescoço. O cheiro dele é tão bom que me faz querer tocá-lo. Demoro mais do que o necessário de propósito. Dar nós em gravatas, para mim, é como amarrar o cadarço. Mole, mole.
— Hum, obrigada. — Confere no espelho. — Você que me ajudava todo dia, e agora estou com vergonha de ter sido acomodado em vez de aprendido por conta.
É bom saber dessas pequenas coisas. Dão significado ao que sou e ao que fui.
— Eu te mimava a esse ponto, então? — Brinco.
Sorri, todo bobo.
— Eu sou o cara mais mimado da face da terra e por culpa exclusivamente sua. — Acusa.
— E o que mais eu fazia que contribuía com isto? — Coloco a mão na cintura.
Gabriel arruma o paletó, mas não deixa de me encarar. Seus olhos combinam com a camisa azul que usa. Não consigo me decidir se seu cabelo é loiro escuro ou castanho bem claro, fica nessa divisa, mas contrasta perfeitamente com tudo. É feito à medida. É o tipo de pessoa que eu encomendaria se fosse possível escolher atributos e comprar na Amazon.
— Acho melhor eu não comentar dessas coisas. — Sua alegria morre. — Não quero que se sinta na obrigação de fazê-las ou algo assim. — Pega a pasta. — Droga, já ia me esquecendo de novo.
Ele corre até nosso estúdio compartilhado e volta com um notebook, daqueles menores e na cor rosa. A parte de cima é decorada com o tema de costura e ballet.
— É seu. — Me entrega. — Até me esqueci dele, mas você costumava usar algumas vezes, acho que tem desenho de roupas. Pode ser que te faça lembrar, mas...
— Mas?
— Eu não sei a senha. — Confessa. — Acho que você pode ter anotado em algum lugar, ou pode tentar datas específicas. É com você, Sherlock.
— Por que você não sabe a senha? — Passo a mão no adesivo de uma tesoura.
Entendo o negócio de privacidade e tudo mais, mas o que eu poderia querer esconder a ponto de nem ele ter acesso?
E se eu tiver um caso?
Minha nossa.
— Sei lá. Você o levava em alguns lugares. — Nem Gabriel tem certeza do que fala.
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[DEGUSTAÇÃO] Todas as Noites que Nunca Aconteceram
Mystère / ThrillerSarah é uma costureira dedicada, com a carreira em ascensão e sem tempo para relacionamentos. Focada no trabalho, ela vê sua vida mudar ao acordar em um quarto totalmente desconhecido, em outro país e com um homem que diz ser seu marido. A...