Capítulo 1

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A claridade do quarto faz minha vista arder quando abro os olhos. Tento achar a coberta para me cobrir, mas não a encontro. Minha cabeça lateja demais e meu estômago está totalmente embrulhado, como uma super indisposição matinal depois de um porre federal.

Passo a mão pelo rosto, em uma tentativa inútil de aliviar as pontadas que parecem atravessar meu crânio, e pressiono minha testa.

Eu bebi tanto assim?

A noite passada é apenas um borrão. Não me lembro de nada, nem mesmo de ter bebido. Mas o que explicaria essa ressaca monstro?

Sento-me na cama, decidida a me levantar e procurar por algum analgésico, só que esse não é meu quarto. Olho ao redor e, não, definitivamente, não é meu quarto. Agarro os lençóis, sentindo o tecido fofo demais na minha palma. Forço minhas pernas para fora e finco meus pés no chão, ignorando a tontura que toma conta de mim.

Nem ao menos reconheço a roupa que visto. É uma camisola de unicórnio. Tem brilho.

O que está acontecendo?

As paredes do cômodo são de vidro, percebo isso apesar da cortina. O piso é escuro e gelado. Mas não perco tempo apreciando a beleza do lugar, preciso saber onde estou.

Eu fui para a casa de um estranho? Meu Deus, eu não costumo fazer isso.

Ao colocar a mão na maçaneta, a porta é aberta pelo outro lado e um homem entra.

Ando para trás rápido demais e sinto tudo escurecer, me escoro no móvel atrás de mim.

— Sarah! — ele chama, deixando uma bandeja no criado mudo. — Graças a Deus você acordou. — Soa tão esperançoso.

— Onde estou? — Me esquivo de seu contato e me afasto um pouco mais, encostando na parede.

— Em casa — diz como se fosse óbvio. — Você caiu ontem e bateu a cabeça, pode estar confusa. Vem aqui para eu te examinar...

— Fica longe — aviso, pegando um livro grosso de cima da mesinha. — Quem é você?

brincando, ? — Dá um risinho. — Sarah, senta aqui...

com cara de quem tá brincando? — grito, em desespero, e levanto o livro. É um exemplar grosso de A Divina Comédia.

O homem acende a luz, e então posso vê-lo com mais clareza. A memória do dia que nos conhecemos salta como um flash.

— O que você fazendo aqui?

É o moço que cuidou da minha mão e levou embora a camisa mais bonita que já fiz. Era uma encomenda. Eva me deu uma bela bronca. Isso já faz anos...

Qual o nome dele mesmo?

Era com... M... Manuel... Era de um anjo... Miguel? Gabriel! Anjo Gabriel. Foi isso.

Gabriel.

Ele é médico! Chegamos a nos encontrar depois desse dia.

— Eu moro aqui. — Suas mãos estão para cima, não sei se querendo me acalmar ou em sinal de rendição já que o ameaço com o livro. — Nós moramos aqui.

— Olha, não sei o que aconteceu, mas eu nem sei onde estou. — Escorrego até o chão, derrotada pela vertigem e o corpo mole.

— Sarah... Merda. Olha para mim. — Pede, ansioso. — Qual seu nome?

— Sarah Antero. — Massageio minhas têmporas.

— Quantos anos você tem?

— Por que você...?

[DEGUSTAÇÃO] Todas as Noites que Nunca AconteceramOnde histórias criam vida. Descubra agora