CAPÍTULO 18

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A livraria teve um movimento atípico naquela segunda-feira e, ao fim do dia, eu sentia uma dor incômoda e irritante na base da coluna e estava exausta e exasperada. Quando cheguei à entrada da garagem de casa, sonhava com a perspectiva de um jantar rápido e um demorado banho de espuma. Só que não pude estacionar o carro no lugar habitual, porque a vaga estava ocupada pela última coisa que eu queria (ou esperava) ver ali. O carro de Gonzalo.

– Que inferno! – murmurei, ao parar meu carro ao lado do dele e olhar em seu interior.

Vazio.

Gonzalo já havia entrado.

Um movimento fugaz na janela chamou minha atenção, o que significava que alguém ouvira minha chegada. Sem chance agora de fazer o que seria minha reação instintiva: uma rápida retirada e ficar dando voltas a esmo pelas ruas, até que ele fosse embora.

Eu devia esperar por isso, pensei, sentada no carro, bufando em silêncio. Era praticamente inevitável, dada a maneira como meus pais haviam reagido à notícia do nosso rompimento. Por dias, eu evitara contar a eles, mas, assim que soube que o fim do nosso noivado era de conhecimento público, não tivera escolha senão me sentar com meus pais numa noite após o jantar e efetivamente partir o coração de mamãe. Ver a desolação tomar conta de seu rosto à medida que eu explicava o mais devagar e pacientemente possível que Gonzalo e eu tínhamos decidido que não nos casaríamos mais foi tão horrível quanto imaginei que seria.

– Chegamos à conclusão de que talvez tenhamos precipitado um pouco as coisas – explicara delicadamente, imaginando se a mentira soava tão falsa para eles quanto para mim.

Meu pai, sentado no sofá ao lado de mamãe, que se mostrava chocada e consternada, não aceitara uma explicação tão vaga quanto aquela.

– Mas você conhece ele há 25 anos. Como isso pode ser precipitado?

Valeu por essa, pai! Estendi a mão para pegar a de mamãe, pensando se era daquele jeito, dilacerados e desesperados, que os pais se sentiam quando contavam aos filhos que estavam se divorciando. Minha mãe parecia mesmo tão desamparada quanto uma criança ao ouvir que seu mundo estava prestes a ser destruído.

– Acredito que nos precipitamos ao ficarmos noivos. Não tínhamos reatado por tempo suficiente para tomarmos esse tipo de decisão. Acho que ambos mudamos muito durante o tempo em que estivemos separados. Não somos mais os mesmos de quando éramos adolescentes.

Minha mãe havia assentido, calada, o que poderia ter significado que ela compreendia, não fosse o fato de seus olhos estarem confusos e cheios de lágrimas.

– Quando se ama de verdade, o tempo que se está junto não importa. Sua mãe e eu ficamos noivos depois de apenas três meses.

Mais uma vez, pai, obrigada!

– Quem sabe vocês não mudam de ideia... – dissera mamãe, em uma voz tragicamente esperançosa.

– Não creio, mãe.

– Todo mundo tem um desentendimento de vez em quando – dissera ela, como se me falasse de um mundo que eu nunca tivesse vislumbrado. – Provavelmente, é só um pouco de medo, um frio no estômago. Deve ser isso. Frio no estômago.

Coração congelado.

Na verdade, mãe, frieza em tudo.

Meu pai não comprara a versão que eu havia tão cuidadosamente ensaiado, mas ao menos tivera o bom senso de não me pressionar mais.

– Eu já tinha o vestido e o chapéu, e tudo o mais – dissera mamãe, em tom de lamento. – Vocês dois são tão perfeitos juntos! Todos dizem isso. Mesmo quando eram criancinhas, faziam tudo juntos; eram inseparáveis. Ele era um bom menino naquela época, e ainda é. Vai ser um bom marido, e um bom pai também, um dia.

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