O meu amor não é você.

Velhos amigos

Haddad

"Sorrio constrangido com a situação. - Longa história..."

Ciro aproximou-se ainda mais de mim, ajudou-me a levantar a bicicleta e sorriu amigavelmente.

- Deixe-me levá-lo ao seu destino, meu nobre amigo.

Eu já estava deveras atrasado para trabalhar, mas agora possuo alguns "direitos", a coordenação da universidade vai entender e perdoar a minha falta. Logo só poderia voltar com Ciro Gomes para casa.

- Ah... estou ficando em um apartamento perto daqui, não precisa se incomodar.

- Que isso Fernando... Deixe-me levá-lo para tomar um cafezinho, que tal?- disse o mais velho abrindo um sorriso mínimo, estreitando os olhos.

Relutei por pelo menos duas vezes, porém Ciro Gomes continuou insistindo, e devido a tanta insistência e sorrisinhos carismáticos, resolvi aceitar. - Tudo bem.

Entrei no carro e Ciro colocou a bicicleta dentro do porta malas. Ele adentrou o veículo, fechou a porta e deu partida seguindo direto pela avenida movimentada. Nisso, ficamos em um silêncio incomodo dentro do automóvel, não que eu não tivesse nada para conversar com ele, na verdade tinha muito o que perguntar, principalmente o por quê de ele ter partido para a Europa logo após o primeiro turno das eleições, me deixado sozinho. Talvez ele soubesse que eu iria desistir.

- Por que cê não tá no Brasil, Fernando? Pensei que fosse virar ministro do governo do Bolsonaro.

Abaixei um pouco a cabeça deixando o ar sair pesadamente pelas minhas narinas. Não sei se seria agradável contar tudo ao Ciro, não que eu não confie nele, muito pelo contrário, somos bons amigos, mas falar que vivi um "relacionamento" com o Jair não é uma coisa muito agradável para comentar.

- Ah... E-Estou só passando uns dias...

O cearense desviou a atenção da pista por alguns segundos para olhar para mim, estreitando os olhos. - Não sei que dias, cê já tá aqui faz uns meses que eu sei. O que aconteceu? O hitlerzinho chutou tua bunda?

Ainda olhando para baixo começo a brincar com os meus dedos, fazendo o possível para não olhar para Ciro, pois se eu o olhar não vou conseguir mentir. Somos amigos de longa data...

- Vai desembuchar cabra? - Ciro voltou a olhar para a pista.

- É complexo... - comentei baixo, mas em um tom suficiente para ele ouvir.

- Complexo... - resmungou. - Fernando meu digníssimo amigo, cê sabe que não adianta nada ficar me escondendo as coisas que acontecem naquele governo. E cê sabe também que eu me importo com o que acontece com você.

Levantei o meu rosto e virei em direção a Ciro. - Então, por que você simplesmente sumiu depois da apuração dos votos?

Vi o ex-presidenciável do PDT apertar o volante do carro com certa força, também percebi o tom avermelhado que se espalhava em seu rosto, o que denunciava raiva. - Eu percebi o que o hitlerzinho tropical estava fazendo contigo Fernando, mas achei melhor não me meter.

Franzi o cenho. Não contei nada ao Ciro Gomes sobre o que acontecia entre mim e Jair, até porque não conversamos direito durante a campanha. - Do que você está falando? - perguntei visivelmente confuso.

- Cê sabendo muito bem, mas não se preocupe, isso não vai ir ao público.

Antes que eu pudesse responder algo, Ciro estacionou o carro ao lado de uma cafeteria. Ele desligou o carro, saiu e ficou me esperando do lado de fora com o mesmo sorriso gentil de sempre. Sendo assim respirei fundo e saí do carro caminhando em direção à uma das mesas que ficava na parte externa da cafeteria.