CAPÍTULO DEZOITO - RAFAEL

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Ao som da música Love Someone - Jason Mraz



Tanto faz se é néfesh ou psykhé, poucas pessoas sabem o que essas palavras em hebraico e grego respectivamente significam. Eu não sabia nem o significado da palavra em português, ou seja, alma. Muitos dizem que a alma é tipo um ser espiritual que habita em nós, mas depois que eu pesquisei a fundo o significado nos idiomas originais utilizados na bíblia eu aprendi que a alma somos nós. Ou seja, não temos uma alma imortal dentro de nós, nós somos uma alma. Eu sei, é um assunto complexo e difícil de entender. Mas o que isso tem a ver comigo? Bem, saber isso me fez encarar alguns aspectos da vida de forma diferente.

Primeiro que isso me deu consolo quando eu perdi o amor da minha vida na morte. Me apaixonei pela Amanda quando estudávamos os anos finais do ensino fundamental e quando ficamos maiores de idade resolvemos assumir o nosso amor. Nos casamos e vivíamos um verdadeiro conto de fadas. Não vou dizer que não tínhamos problemas, pois estaria mentindo. Todos os relacionamentos têm algumas turbulências, mas quando o amor é maior supera qualquer adversidade. E assim era a gente. Vencemos todas as barreiras juntos. Primeiro emprego, faculdade e o nascimento de nosso filho, Enzo, depois do casamento.

Quando a Amanda descobriu que tinha leucemia foi como se tivessem arrancado o nosso chão. Tanto ela como eu ficamos arrasados! Mas resolvemos lutar juntos para que ela passasse por essa tempestade a salvo. O tratamento foi agressivo. Vê-la se definhar aos poucos foi extremamente ruim. Se eu pudesse, teria trocado de lugar com ela. Amanda merecia viver, ser feliz e desfrutar da alegria de criar o nosso filho mais do que eu. Quanto mais o tempo passava a nossa esperança diminuía, até que em um dia cinzento do mês de julho ela adormeceu na morte. Ao receber a notícia foi como se uma faca atravessasse meu coração. Me senti fraco, impotente sem saber o que fazer. Minha família e amigos me ajudaram. Mas eu achava aquilo tudo tão errado, tão injusto.

- Não fique assim, Deus a levou para virar um anjo da guarda para você e para o pequeno Enzo. - Essas palavras ditas por algumas pessoas eram para me consolar. Mas o efeito foi o contrário. Se Deus havia levado a minha esposa no momento em que meu filho mais precisava, isso parecia tão injusto.

- São os mistérios da vida, meu filho! - Uma tia que eu só via nos enterros de parentes me disse isso na ocasião. Eu não conseguia compreender, fiquei com raiva de tudo. Mas um dia duas mulheres bateram na minha porta, como que enviadas por Deus e me explicou o que eu aceitei como verdade, pois usaram a bíblia para explicar.

- Sua esposa não está sendo atormentada e nem virou um anjo da guarda, veja o que a palavra de Deus diz em Eclesiastes 9:5, 6: "Pois os vivos sabem que morrerão, mas os mortos não sabem absolutamente nada, nem têm mais recompensa, porque toda lembrança deles caiu no esquecimento. Também seu amor, seu ódio e seu ciúme já não existem, e eles não têm mais parte em nada do que se faz debaixo do sol." Quando morremos deixamos de existir, pois a morte é o oposto da vida. A morte é comparada a um sono profundo onde não há sonhos e não fazemos nada. Deus prometeu a ressurreição, ou seja, um dia, todas as pessoas boas serão ressuscitadas.

Elas me explicaram, na bíblia, como será a ressurreição e me entregaram uma revista "Quando Morre Alguém que Amamos". Essa publicação me ajudou muito a superar a morte da minha amada. Saber que não temos uma alma que sai do corpo para outro lugar e saber que Deus não havia levado a Amanda me consolou de verdade. Pois ficou mais coerente com a imagem de Deus de amor que eu sempre acreditei. Aos poucos a ferida do luto foi se cicatrizando. Eu compreendi que precisava prosseguir minha vida e dar o melhor de mim para criar o Enzo com todo o amor possível. Foi isso que eu fiz. Montei minha academia e me mantive ocupado no trabalho e na criação do meu filho.

Durante os anos que se passaram eu não consegui viver um relacionamento muito longo. Eu conheci algumas mulheres que me atraíram, mas não ao ponto de mexer com as minhas estruturas. Querendo ou não, eu fazia comparações com a Amanda. Era como se nenhuma mulher conseguisse preencher o espaço que era da Amanda.

- Não se apresse. Para tudo há um tempo. No tempo certo você encontrará alguém especial. - Minha mãe sempre me dizia isso. E com esse conselho em mente eu segui, até conhecer a Drika.

A alma pode se referir à pessoa inteira, com todas as suas habilidades físicas e mentais. Ou seja, quem a pessoa é no íntimo. O ato de ser, existir. Foi isso que me chamou a atenção na Drika. Eu já havia a visto outras vezes na praça de alimentação do shopping com um rapaz e uma moça, o que eu deduzi ser seu irmão, por causa de algumas semelhanças físicas com ela e a moça namorada dele. A Drika era sorridente, atrapalhada e com um olhar inocente e meigo. Meu coração acelerava toda vez que eu a via. Era como se eu tivesse enxergado a sua alma, ou seja, quem ela era no seu íntimo. Desde então eu passei a frequentar o shopping durante o sábado apenas para vê-la. Eu tentava criar coragem para conversar com ela. Mas me sentia nervoso, afinal, ela nunca havia me visto e chegar assim, do nada, parecia ser a oportunidade ideal para receber um grande fora.

- Cara, o não você já tem, então se concentre no sim. - O Emerson, meu amigo desde a época da faculdade de Educação Física e que trabalhava na minha Academia me disse isso certa vez quando relatei minhas preocupações.

- Você não entende. Ela é diferente. - Eu respondi.

- Se for aquela gordinha que você me mostrou outro dia no shopping é realmente bem diferente, diferente de todas as minas que você já pegou, bem inferior...

- Não vou aceitar que fale assim dela. Eu nunca entendi a mania de alguns de desfazer das pessoas acima do peso. Eu a acho bonita do jeito que é.

- Já dizia minha mãe: gosto é igual cérebro, cada um tem o seu. Eu só acho que se você se sente realmente atraído por ela, precisa partir para o ataque. Eu te apoio.

Fiquei com isso na cabeça por dias até que encontrei a oportunidade perfeita. Como de costume ela estava na praça de alimentação com o seu irmão e a namorada dele. Eu procurei um lugar que ficasse de frente para ela, para chamar a atenção. Quando ela me viu, sustentei o olhar, embora eu estivesse nervoso. Olhar em seus olhos, mesmo que a distância, provocava coisas boas em mim. Na ocasião eu reparei que ela havia ficado desconfortável com meus olhares. Então levantei, tirei meu cartão de personal trainner e fui até sua mesa.

- Com licença! – Eu disse e ela balançou a cabeça sorrindo. - Meu nome é Rafael. Qual é o seu?

Ela olhou ao redor, parecia não acreditar que eu estava falando com ela.

- Drika. – Sua voz saiu em quase um sussurro. Eu não consegui parar de olhar para os seus lábios, minha vontade era de beijá-la naquele instante.

- Prazer, Drika! – Eu estendi a mão e ela retribuiu o cumprimento. Esse simples toque me fez sentir um calor agradável percorrer todo o meu corpo. Sua mão era macia e quente. – Esse é meu cartão, caso queira conversar comigo. – Entreguei, pisquei um olho e saí.

Durante os dias seguintes eu olhava o tempo todo o meu celular na esperança de ter uma mensagem ou ligação dela.


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Olá, pessoal! O que acharam deste capítulo? Ele foi focado no Rafael, deu pra perceber que os sentimentos dele pela Drika são verdadeiros. Será que vai dá certo? 

Não esqueça de clicar na estrelinha. 


OBS: Os capítulos são postados sem revisão ortográfica profunda.

Um Certo ArbogastOnde histórias criam vida. Descubra agora