Nas tuas asas

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O resto do dia é preenchido com aulas de biologia, físico-química e Português depois de almoço. Ultimamente tenho gostado das aulas de Português. Estamos a ler "Amor de Perdição" e o fim trágico desse romance traz-me algum conforto emocional, por não acabar com um simples "e viveram felizes para sempre". Talvez, também, porque ultimamente tenho encontrado o meu refúgio nos livros e nas letras.
Quando chego a casa, atiro a mochila para o chão do haul de entrada enquanto tiro as sapatilhas. Dirijo-me à cozinha, abro o frigorífico e fico a olhar para ele. Cinco minutos já se devem de ter passado e continuo a olhar para ele. Desisto e abro o armário das bolachas. Pego num pacote de bolachas e numa banana e sento-me no sofá da sala. Ligo a televisão e assisto o fim de um filme romântico. Como é óbvio o homem aparece a porta da amada com um ramo de flores pedindo desculpa por todos os erros que cometeu. Filmes românticos, ou acabam em tragédia ou acabam com finais felizes. Já eu devo de estar mais voltada para a primeira opção.
Desligo a televisão e pego novamente na minha mochila em direção ao quarto. Tiro os livros e ocupo-me a realizar os trabalhos de casa.

Enquanto tento resolver o quinto exercício o meu telefone começa a tocar. É o meu pai do outro lado da linha.
-Estou, Mi? Já chegaste a casa?
-Sim pai, porquê?
-O Fernando convidou-nos para ir jantar a casa dele esta noite.
-O quê?? - digo aterrorizada. Vou estar na casa daquele estranho mas que me disse tanto com o seu toque? Só pode estar tudo doido. O meu pai só conhece o homem à alguns dias e já programam jantares? Só pode estar tudo doído!
-O que foi Matilde?
-Nada pai, é só que... sei lá... nós nem os conhecemos!
-Ora essa, para quê que servem os jantares?
Merda
-Fala com a tua mãe e ajuda-a no que precisar. Já sei que ela vai querer arranjar-se para não parecer uma "doente" como ela diz e como se não o fosse filha...
-Ah...-suspiro- está bem eu trato dela.
-Eu passo aí às sete e quinze.
-Ok pai.
-E Matilde?
-Sim?
-Eles não são pessoas muito simples...
-Fantástico..

Existirá algo mais para acontecer hoje?

Deixo os trabalhos de casa por fazer e desço as escadas para ir ter com a minha mãe que se encontra no sofá a ver televisão.
-Mãe, pelos vistos vamos jantar fora hoje?
-O quê filha, vamos à pizzaria?
-Não. Vamos comer à casa de um "S. Fernando", o novo sócio do pai. Ele vem buscar-nos às sete e quinze por isso temos que ser rápidas.
-Está bem filha, está bem.
-Mas se tu não estiveres bem não vamos mãe!
-Não Mi, eu acho que agora já me sinto um pouco melhor.
-Um pouco?
-Melhor, vá.
-O pai disse que eles não eram pessoas simples.
-Fantástico.
-Foi o que eu lhe respondi ao telefone.
-Bem, então temos de tratar de nos por bonitas.
-Precisas de ajuda para alguma coisa mãe?
-Se não te importares Mi.
-Claro que não.
Dei-lhe a mão e fomos as duas para o seu quarto. Perguntei- lhe o que queria vestir e ela disse que gostava de usar o vestido azul esmeralda de meia manga. Um vestido bastante bonito e que não me importava de usar, mas a minha mãe diz sempre que terei tempo para tapar as curvas, agora é altura de as mostrar. Coisa que nunca me agradou, confesso. Ela amarrou um lenço florido na cabeça e pediu que lhe coloca-se um pouco de blush e máscara de pestanas para ganhar um pouco "de vida", tal como ela disse. 

-Matilde, agora é a tua vez de te pores bonita. Vai lá que eu agora trato do resto sozinha, obrigada filhota.                

-Está bem, volto já.

Dirijo-me ao meu quarto e abro as portas do guarda fatos como quem abre dois portões de uma quinta já antiga. O quê que eu vou vestir? Não tenho nada de jeito! Oh meu Deus, oh meu Deus, oh meu Deus! O quê que eu vou vestir?!  Atiro praticamente metade de toda a roupa para cima da cama e continuo sem saber o que vestir. 
-Ah! - dou um grito.
-Mi, está tudo bem? - a minha mãe grita assustada do quarto dela.
-Sim mãe, é só uma crise existencial.
Ouso-a as suas gargalhadas abafadas pelas paredes.

É este, sem dúvida que é este! Finalmente encontrei o vestido ideal! Tiro o vestido vermelho de renda e com folhos que comprei no ano passado depois de ter ido ao cinema com a Lília e a Carolina. É mesmo o vestido perfeito. É bonito mas não muito ousado e posso usar com as minhas All Star. 

Visto-o e vou para a casa de banho tratar do cabelo e maquilhagem ( coisa que eu percebo bastante como é óbvio assim que se olha para mim). Primeiro lavo os dentes e a cara e coloco creme hidratante. Depois opto por tratar da "maquilhagem" em primeiro lugar. O quê que eu sei fazer com isto? Nada, só o básico. Nunca serei capaz de fazer uma dessas maquilhagens como as Kardashians fazem. Foi uma sorte a minha mãe não ficar com blush espalhado por toda a sua cara e sega de um olho. Bem alguma coisa vai ter que sair daqui. Pego no corretor e coloco em alguns pontos chave tal como nas olheiras e em algumas imperfeições que se encontram na minha testa e queixo. Depois aplico BBcream, sombra de um castanho que é apenas um pouco mais escura que a pálpebra, mas não muito. Escolho um batom que também passe despercebido e quanto à maquilhagem estou pronta. Quanto ao cabelo, escolho prender as mechas da frente mas com alguns fios soltos para dar um ar mais descontraído.