O que eu chamava de princípio de amizade foi perdendo o sentido, pois aquilo se tratava de uma grande amizade, maior do que eu poderia desejar, mas que eu simplesmente amava tê-la.
Carolina e eu passávamos todas as noites trocando mensagens pelo celular, que na época era aqueles Nokia bem antigos. Saíamos com nossos amigos e algumas poucas vezes apenas nós dois. Depois que conheceu minha família, Carol sempre ia lá em casa. O clima, que estava tenso, havia se tornado mais agradável com a presença dela, e a meu ver até Carolina parecia se sentir bem estando com a minha família.
Minha tia Maria se animava mais ainda quando Carol passava a tarde com ela. As duas ficavam conversando e discutindo sobre livros que já leram ou tinham vontade de ler, e isso alegrava minha tia, que só podia ficar na cama.
- Eu gosto desta parte. – disse tia Maria, entregando um livro aberto para Carolina.
Quando as duas discutiam sobre livros eu sentava em uma poltrona e começava a viajar no espaço, ficando inerte em meus pensamentos. Afinal, nunca me interessei tanto pelos livros para-didáticos da escola. Na verdade não me interessava nada. Quando pequeno, sempre demorei uma eternidade para ler os livros que a professora passava como tarefa. Muitas das vezes quando eu tinha que ler um, olhava para o teto do quarto e acabava tirando um pequeno cochilo.
- Miguel! – Carolina falou, tentando chamar a minha atenção. – Você já leu O Pequeno Príncipe?
- Ih! Eu conheço esse daí como a palma da minha mão. – disse minha tia e comecei a rir. – A única coisa que essa criança lê são livros de matemática! Sempre pedia para que eu lesse para ele os livros paradidáticos do colégio.
- Cara de pau... – disse Carolina, com um sorriso divertido no rosto.
- Está bem, essa parte dos livros do colégio pode até ser verdade. Mas em minha defesa, eu conheço bem O Pequeno Príncipe. – falei, confiante.
- Ah é? Diz um trecho, então. – perguntou Carol, me desafiando.
Cocei minha nuca. Pense, Miguel! Está bem, eu podia não conhecer tão bem assim o livro, mas lembrava de alguns trechos que eram bastante clichês. Olhei para Carol que sorria convencida de que eu não sabia. Eu não podia mostrar minha fama de preguiçoso. De repente, um dos trechos veio instantaneamente em minha cabeça. Limpei a garganta para fazer aquela interpretação. Olhei bem no fundo dos olhos castanhos de Carolina, que me encaravam e falei:
- "Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde às três eu começarei a ser feliz!" – citei. Senti uma ansiedade se espalhando pelo meu peito. Carolina corou levemente e desviou seu olhar, sorrindo sem graça. Até eu fiquei um pouco sem jeito, pelo clima que parecia ter rolado. Por que eu tinha que me lembrar justo desse trecho? Não acredito que Carolina escutou eu dizer isso.
- Lindo! – disse minha tia Maria, aplaudindo. Voltei à realidade, assim como Carolina. – Até que sua memória não é tão ruim assim. Eu li esse livro diversas vezes para você. Achei que estava entrando por um ouvido e saindo pelo outro.
Revirei os olhos e Carol riu um pouco. Trocamos nossos olhares por um segundo.
- Acho que vou embora. – disse Carolina levantando-se logo depois e me pegando de supetão.
- Já? – perguntei, levantando-me também. – Fica mais um pouco.
- Está ficando tarde. – ela disse, colocando um mexa de seu cabelo para atrás da orelha e olhando para seus pés. – Melhor eu ir, tenho alguns trabalhos da faculdade para fazer.
- Eu te levo em casa. - me ofereci.
- Não precisa. O ponto de ônibus é aqui perto. Fique com sua tia. – ela disse, sorrindo e se voltou para tia Maria. – Até logo, Dona Maria.
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Saber Amar
RomanceO amor não basta para sustentar uma relação. Miguel aprendeu isso quando já tinha idade, quando talvez fosse tarde demais... O famoso "último dos românticos", Miguel acreditava muito bem na existência do amor da sua vida e que encontrou-o por acaso...