; doze

997 55 8
                                    

Olhei para o relógio e vi que são, precisamente, seis da manhã.

Não dormi nada.

Não consegui.

Depois daquele pesadelo, só conseguia pensar numa coisa: o Francisco não me merece.

Não interessa o que ele diz. Eu sei perfeitamente que, por muito que ele me ame, haverá sempre algo que nos afasta.

Desde o dia em que o jogador tocou no assunto "filhos", não consigo tirar isto da cabeça.

Levanto-me da cama, cuidadosamente para não acordar o meu namorado.

Abro o roupeiro e retiro de lá uma das minhas malas de viagem.

Começo por colocar as roupas mais essenciais e depois coloco todas as minhas outras coisas.

Pego na mala e vou até à porta mas, devido à pouca luz que havia no quarto, a mala choca com a cama, o que causa algum ruído.

Observo o Francisco a remexer-se mas, para minha felicidade, ele continua a dormir.

Abro a porta e saio da divisão.

Vou até à cozinha e olho para o bloco de notas que está no balcão.

Não sei se deveria ou não deixar alguma coisa escrita para lhe explicar o porquê de sair de casa mas não tenho coragem para o fazer.

Eu sei que estou a ser covarde por não conseguir ter uma conversa séria com o lisboeta.

Mas eu preciso de ir.

Abandono a casa e entro no meu automóvel.

Durante todo o caminho até à casa dos meus pais, sou incapaz de evitar as lágrimas.

Como é que a nossa relação foi capaz de chegar a este ponto?

Éramos tão felizes e tudo mudou.

Eu sou a culpada disto tudo.

Eu e o meu estúpido trauma.

O trauma que não me permite ser mãe.

Quem me dera que tudo fosse diferente. Quem me dera poder controlar este medo. Quem me dera poder fazer o Francisco feliz.

Estaciono o carro e retiro a mala.

Como tenho as chaves de casa dos meus progenitores, abro a porta e tento não fazer barulho, uma vez que ainda é cedo e não quero acordar os meus pais.

No entanto, ao virar o meu corpo na direção da cozinha assusto-me ao ver a figura da minha mãe.

Devias ter-te lembrado que ela acorda sempre muito cedo!, pensei.

- Filha? O que fazes aqui a uma hora destas? E com uma mala? O que é que aconteceu? E estiveste a chorar porquê? Tu e o Francisco acabaram? - atirou-me com um monte de perguntas e suspirei.

Sentei-me num dos bancos da divisão, deixando as coisas que trazi num canto.

- Eu saí de casa. - sem quaisquer rodeios, proferi.

- O quê? Porquê?

Aproximou-se de mim e depositou as suas mãos nos meus ombros.

- Fala com a mãe. - sussurrando, solicitou.

- Antes que comeces aí a pensar mal do Francisco, nós não discutimos e ele não me expulsou... - soltei uma risada. - Ele nunca o faria. Ele é demasiado boa pessoa para o fazer... Eu é que não sou a pessoa certa para ele.

- O que raio é que estás para aí a dizer? Porque é que não és a pessoa certa para ele?

- O Francisco quer ter filhos. - não precisava de dizer mais nada. A minha mãe sabia.

Vejo-a a sentar-se ao meu lado e dá-me as mãos.

- Leonor, não é por ter acontecido comigo, que, automaticamente, acontece contigo.

- Eu sei mãe, mas... É difícil. Eu não quero passar pelo que tu passaste e não quero que o Chico sofra tal como o pai sofreu. - algumas lágrimas deslizaram pela minha face. - Entendes o meu lado?

Num gesto inesperado, a mais velha abraçou-me fortemente.

- Oh meu amor, se há alguém neste mundo que te entende, essa pessoa sou eu. - a minha mãe também não conteu as lágrimas.

- Eu posso ficar aqui? - questionei-a.

- Isso nem é pergunta que se faça, mas, não achas que devias falar com o Francisco? Ele vai ficar desesperado quando não te vir lá em casa. - acautelou-me.

- Por favor, não me faças sentir pior do que já estou.

- Tudo bem... Eu só quero que sejas feliz. - deixou um carinhoso beijo na minha testa.

Levei a mala até ao meu antigo quarto e deitei-me sob a cama.

Peguei no meu dispositivo eletrónico que se encontrava no bolso de trás das minhas calças.

Para já, ainda não havia nenhuma mensagem ou chamada por parte do Francisco mas era apenas uma questão de tempo até ele acordar e não me ver em casa.

Parece que a Leonor perdeu a cabeça e saiu de casa.

As coisas não andam nada bem dentro da cabeça da Leonor...

LUZ ; francisco geraldesOnde histórias criam vida. Descubra agora